Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Globo assume culpa, mas não libera arquivos de telejornais

No último fim de semana fomos surpreendidos pela notícia de que as Organizações Globo finalmente assumiram sua participação no golpe que impôs ao Brasil 21 anos de ditadura. Foi uma atitude necessária e importante, mas deve ser criteriosamente analisada e investigada.

Por que demorou tanto? Por que a divulgação dessa notícia exatamente agora? Como podemos comprovar as boas intenções da Globo hoje?

Perdoar os erros do passado é um ato de generosidade e grandeza de toda a sociedade brasileira. Não restam dúvidas de que estamos aperfeiçoando a democracia no país. O reconhecimento de erros é o primeiro passo para reavaliações e mudanças estratégicas. Mas, perdoar, assim como entender, aceitar ou superar, não deve jamais significar esquecimento.

E para não esquecer passado precisamos exercitar a nossa memória pessoal e coletiva. Lembrar o passado requer desejo, tempo e arquivos. Esses repositórios podem ser mentais ou virtuais na forma de lembranças e recordações do passado, mas também podem ser materiais: bibliotecas, acervos, arquivos ou, no caso das televisões, centros de documentação.

Nesses espaços estão guardados imagens, sons e palavras “fantásticas”, preciosidades do nosso passado televisivo. Mas nesses mesmos espaços estão confinados “segredos” que podem mudar a nossa percepção do presente e do futuro.

Memória e democracia

Será bom aproveitar esse momento histórico de abertura na Globo, para
sugerir à Rede Globo de Televisão abrir seus preciosos arquivos de telejornais de forma livre e irrestrita pela internet.

Sugerimos um YouTube Globalcom acesso digital aos acervos de telejornais da Globo sem qualquer burocracia ou necessidade de apresentação de explicações e justificativas para pesquisas acadêmicas ou qualquer outro tipo de visualização de seus acervos. Seria um grande gesto da empresa em relação ao presente e o futuro do país.

Recomendo um artigo, em forma de diálogo com o professor Nilson Lage, sobre a importância dos arquivos de telejornais para conhecer o nosso passado e garantir o futuro. O texto tem o título de “O direito social sobre as imagens“e foi publicado neste Observatório da Imprensa, em 2003. Apesar do tempo, ainda é um diálogo pertinente considerando o momento histórico em que vivemos.

Abrir os arquivos de telejornais pode ser uma boa maneira da Globo convencer a sociedade brasileira de que as mudanças na empresa são reais e verdadeiras e não cosméticas e oportunistas. Afinal, o jornal O Globo, base de todo o império comunicacional, já se “desapegou” das ameaças do presente e do passado e abriu seus preciosos arquivos ao público. A TV Globo deveria seguir o mesmo exemplo.

Neste momento delicado da nossa história, é importante enfatizar que democracia sem memória não sobrevive às crises.

Leia também

Pelo livre acesso aos telejornais brasileiros– A.B.

******

Antonio Brasil é jornalista, professor da Universidade Federal de Santa Catarina, pesquisador do Grupo Interinstitucional de Pesquisas em Telejornalismo (GIPTELE) e autor do livro Telejornalismo Imaginário (Editora Insular)