No fim de agosto, um acontecimento conturbado no jornalismo esportivo americano gerou questões sobre a relação entre jornalistas e suas fontes. A rede de TV pública PBS anunciou que a emissora esportiva ESPN estava se desligando de uma parceria para a produção de um documentário sobre o acobertamento de lesões cerebrais em jogadores da NFL (Liga Nacional de Futebol Americano).
A suspeita inicial é de que a ESPN tenha recuado para evitar entrar em conflito com o seu mais lucrativo parceiro de transmissão: a emissora possui um acordo de 15,2 bilhões de dólares com a NFL. A suspeita aparenta ter sido confirmada pela notícia de que a liga de futebol americano pressionou a ESPN após ver o trailer do documentário.
A emissora de esportes negou que sua decisão tenha sido influenciada pela NFL e disse que decidiu retirar seu apoio por não possuir controle editorial sobre o documentário. O ombudsman da emissora, Robert Lipsyte, não pôde determinar exatamente o que aconteceu, mas disse ser caso de inépcia no melhor dos casos e, no pior, uma inclinação maior ao lucro do que ao jornalismo.
Repercussão
O caso repercutiu na imprensa americana. Richard Deitsch, da revista Sports Illustrated, destacou pontos de pressão que continuarão a testar as relações entre NFL e os lados empresariais e jornalísticos da ESPN. Dave Zirin, do jornal The Nation, citou anonimamente diversos jornalistas veteranos da ESPN, que lamentaram o desequilíbrio a favor dos negócios dentro da empresa. “Não é uma empresa jornalística, é uma empresa de entretenimento”, ressaltou um deles. “Quando você dorme com o diabo, começa a ganhar seus próprios chifres”.
A emissora também recebeu críticas externas. O sindicato dos jogadores da NFL classificou a decisão da ESPN como um “dia decepcionante para o jornalismo”. Kelly McBride, do Instituto Poynter, examinou como o episódio ensina uma lição ao jornalismo investigativo: “é incrivelmente difícil para uma organização jornalística responsabilizar seus parceiros”.
Barry Petchesky, do site Deadspin, examinou exemplos anteriores de submissão da ESPN à pressão das ligas, e o New York Times publicou uma reportagem em três partes tratando do domínio da emissora sobre o esporte universitário. Dean Starkman, do Columbia Journalism Review, usou a série para explicar por que os conflitos da ESPN entre negócios e jornalismo são ainda mais fundamentais do que os do resto da indústria.