Interferência entre o serviço de telecomunicações e a transmissão de televisão aberta é uma preocupação que envolve a realização do leilão de frequências para ampliar a abrangência dos serviços de quarta geração (4G) no país, previsto para maio ou junho de 2014. Tanto as emissoras de televisão, que vão liberar parte da frequência para a nova rede de 4G, quanto as operadoras de serviços de telecomunicações, que passarão a utilizá-la, encomendaram estudos para avaliar os riscos de interferência entre os serviços.
A Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) contratou a Universidade Mackenzie, de São Paulo, para avaliar as questões técnicas relativas à interferência. As teles, por sua vez, por meio do SindiTelebrasil, que reúne tanto operadoras quanto fabricantes de equipamentos de telecomunicações, optaram pelo CPqD, de Campinas (SP). Em paralelo, técnicos das duas áreas trabalhando juntos. A expectativa da Abert é de que até o fim de setembro a primeira parte dos estudos esteja finalizada e no início de outubro a associação possa encaminhar os resultados ao governo.
Na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o cronograma envolvendo o espectro de 700 MHz está no momento de finalização do regulamento para a destinação da faixa. Uma vez aprovado pelo conselho, o passo seguinte será a definição da minuta do edital para ir à consulta pública que poderá ficar aberta até dezembro. “Se os resultados dos testes apresentarem pouca interferência, o prazo de realizar o leilão em abril ou maio é razoável. Mas se mostrarem problemas muito mais complexos, que requerem mais análises, o prazo fica apertado. O divisor de águas está nos testes”, disse Daniel Pimentel Slaviero, presidente da Abert.
Licitação é de “insegurança”
Slaviero disse que há indícios de interferência. Seria o mesmo que aconteceu no Japão, onde o mercado é mais maduro. No país, os custos foram altos para mitigar. Mas Slaviero afirmou que a Abert reconhece o novo modelo de espectro utilizado pela TV como parte de uma política pública e a importância do papel da banda larga para o desenvolvimento do país, embora “esse crescimento não possa acontecer em detrimento da radiodifusão”, disse Slaviero.
Segundo o SindiTelebrasil, a proposta é a produção de um relatório tripartite, incluindo a Anatel nas análises, disse o diretor Eduardo Levy. Mas há também outras preocupações: “O setor [telefonia] gostaria de conhecer os critérios e cálculos que a Anatel vai estabelecer e espera um edital cauteloso”, disse. Como “cauteloso”, refere-se às obrigações de cobertura e outras do lado técnico que serão fixadas para a teles. Outro ponto que o SindiTelebrasil busca conhecer é o da metodologia de cálculo que a Anatel vai utilizar para estabelecer os valores da licitação das faixas de frequência.
A instalação da rede 4G vem no momento que as teles ainda estão ampliando a infraestrutura com as tecnologias anteriores. O momento ainda é de altos investimentos na faixa 2,5 MHz, do próprio 4G, já implementada e em instalação. Um executivo da área de telecomunicações, que pede para não ser identificado, classifica que, no momento, a licitação de 4G é de “insegurança”. Para ele, há insegurança com relação à interferência, à oferta e aos preços dos terminais, uma vez que a escala não virá no curto prazo, já que a implementação do serviço, com frequência de 700 MHz, será voltada para regiões com menor população. As grandes cidades já começam a ser atendidas pelo serviço na frequência de 2,5 GHz. Para esse executivo, a único ponto claro é o custo alto da infraestrutura, mesmo com as teles partindo para o compartilhamento.
Subsídio para famílias de baixa renda
Todo o processo de liberação da faixa de 700 MHz é paralelo ao da transferência dos serviços de televisão analógica aberta para digital. Decreto do então presidente Lula, em 2006, determinou que em 2016 terminaria o prazo de transição. Recentemente, a presidente Dilma diluiu o prazo entre janeiro de 2015 e dezembro de 2018. Agora, é esperada portaria do Ministério das Comunicações estabelecendo o cronograma com a data limite para o desligamento nas cidades brasileiras.
Uma questão que não está clara é a respeito da criação de condições para a população adequar seus aparelhos de TV para receber o sinal digital. Segundo informações da Abert, 98,7% dos brasileiros assistem mesmo é a TV aberta. Entre os 62 milhões de lares no país, apenas 17 milhões são assinantes da TV paga, que ficam fora dessa transição. Há expectativa de subsídio para a compra de equipamentos – os chamados set up boxes – para adaptar as TVs que recebem sinal analógico ao mundo digital, especialmente para as famílias de baixa renda. Uma questão em aberto é quem vai financiar o subsídio.
Patrícia Ávila, secretária de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, já informou que o governo trabalha com o Cadastro Único do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), para identificar quais famílias estão nesse patamar socioeconômico, com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa ou renda mensal total de até três salários mínimos.
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Heloisa Magalhães, do Valor Econômico