Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Pela regionalização da produção de rádio e TV

O Conselho de Comunicação Social (CCS) do Senado Federal aprovou, na segunda-feira (3/5), parecer favorável ao Projeto de Lei da Câmara 59/03, que regulamenta o artigo 221 da Constituição Federal, referente à regionalização da programação cultural, artística e jornalística das emissoras de TV e rádio.

O projeto original (PL 256/91), de autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), havia sido aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em agosto do ano passado. Há 13 anos tramitando no Congresso, o projeto de lei é polêmico porque altera normas do setor de comunicação. Por isso, enfrentou forte resistência sobretudo pela oposição dos representantes das emissoras de TV e rádio.

Para melhor debater o assunto, foi criada no âmbito do Conselho de Comunicação Social uma Comissão de Regionalização e Qualidade da Programação. Formada por representantes das empresas de comunicação, do setor cinematográfico, dos artistas, dos jornalistas e da sociedade civil, a comissão empenhou-se ao máximo para que fosse conseguido um consenso. Isso não foi possível. Ao longo de dois meses, seus componentes participaram de cinco reuniões e duas audiências públicas nas quais o tema foi debatido e, afinal, elaborados três pareceres – que foram à votação no plenário do CCS.

A favor da regionalização

O parecer aprovado na reunião de segunda-feira, por sete votos a cinco, foi o da conselheira Berenice Mendes Bezerra, representante da categoria profissional dos artistas, em favor do projeto de regionalização como o proposto pela deputada Jandira. O PLC 59, no entanto, tem falhas de redação e problemas técnicos, já que não considera as novas mídias e possui caráter mandatório, estipulando um porcentual de programação regional e independente nas emissoras de TV brasileiras que nem todas estão capacitadas a cumprir. A obrigatoriedade da exibição de produção independente e de filmes brasileiros, por sinal, foi um dos aspectos mais debatidos na comissão e no Conselho, visto que as empresas de radiodifusão alegam não haver previsão legal para isso.

De fato, muitas das determinações do projeto de regionalização desagradam às emissoras de rádio e TV. ‘As concessionárias não aceitam a imposição de regras e limites, e não admitem ser regulamentadas’, afirma a produtora Assunção Hernandez, presidente do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC) e uma das integrantes da Comissão de Regionalização e Qualidade da Programação. Por ser um país de dimensões continentais e grande diversidade cultural, ela defende que o Brasil necessita de uma programação de rádio e TV descentralizada.

Regionalizar para democratizar

O parecer aprovado no CCS tem o mérito de incentivar a diversidade cultural e a produção independente. Isto é importante porque a realidade do mercado televisivo brasileiro hoje não é nada diversificada. O que se vê são apenas produções concentradas no eixo Rio-São Paulo. ‘O brasileiro recebe da televisão cerca de 78% de toda a sua informação, mas se reconhece muito pouco nela’, afirmou o jornalista e diretor de TV Nelson Hoineff, em um pronunciamento durante uma das reuniões da comissão, em 2 de março último.

As grandes emissoras de TV aberta no Brasil apresentam um alto índice de produção nacional. Mesmo assim, a programação é criada basicamente dentro destas emissoras, que não abrem espaço à diversificação do mercado – seja pelo estímulo às produções independentes ou pela veiculação de conteúdo regional.

A regionalização da programação televisiva tende a diminuir a concentração cultural e a criar mais oportunidades de trabalho. Em vez do olhar único a que se está submetido na programação televisiva atual, a regionalização da programação possibilitaria ‘que outros olhares tivessem voz e imagem no nosso sistema de TV’, segundo Assunção Hernandez. Ela justifica sua afirmação com um argumento que considera definitivo: ‘Democratizar as comunicações significa democratizar o país’.

O presidente do Conselho de Comunicação Social, José Paulo Cavalcanti Filho, bate na mesma tecla. ‘A regionalização da programação, garantindo a afirmação das muitas culturas de um país tão desequilibrado economicamente e tão diferente socialmente; e a produção independente, vista como instrumento para a democratização da cultura, são temas importantes’, enfatiza.

Passos futuros

O parecer aprovado pelo Conselho será encaminhado ao plenário do Senado com subsídio para a votação dos senadores. A reunião que se decidiu pelo parecer da conselheira Berenice Mendes Bezerra teve quatro horas de debate antes da votação final. O jornalista Alberto Dines, um dos representantes da sociedade civil no Conselho, votou a favor do parecer mas sugeriu que os pareceres derrotados – defendidos por Roberto Wagner Monteiro e Paulo de Machado de Carvalho Neto, representantes, pela ordem, das emissoras de televisão e de rádio – também fossem encaminhados aos senadores, como será feito. ‘Não temos mandatos para votar. O que o Conselho pode fazer é oferecer elementos para os parlamentares tomarem a melhor decisão’, disse o jornalista, no que foi apoiado pelo ex-senador José Fogaça, empossado durante a reunião como representante de empresas da imprensa escrita.

Ao final da reunião, Dines apresentou uma moção sugerindo que seja feita uma reavaliação das funções e do papel do Conselho. ‘Ao Conselho não cabe votar, mas recomendar’, disse. A iniciativa inspirou a pauta da próxima sessão do CCS, que se reunirá para uma auto-avaliação de quase dois anos de trabalho.

Aprovada pela unanimidade dos conselheiros, é o seguinte o texto da moção:

‘Na qualidade de integrante de um órgão auxiliar do Congresso Nacional, sem poder decisório ou capacidade deliberativa, e por isso engessado a partir da sua regulamentação, faço um apelo para que o Senado reexamine as funções deste Conselho de Comunicação Social, permitindo que consiga escapar das limitações e injunções a que foi condenado desde a sua concepção; e que o Senado inicie as discussões para a criação de uma Agência Reguladora – ou uma Alta Autoridade de Comunicação Social –, cuja ausência é a responsável direta pelo estado e pela qualidade da nossa produção audiovisual.’