Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Jornais de sensação e jornais discretos


O texto a seguir está nas páginas 130 e 131 do livro Crônicas inéditas I, organizado por Júlio Castañon Guimarães, que traz outros 112 artigos inéditos do poeta Manuel Bandeira (1886-1968). É um dos poucos registros da atividade do poeta como observador da imprensa de sua época, escrito com elegância e sensibilidade.


A imprensa do Rio conta mais um órgão de valor no matutino Diário Carioca, lançado à circulação pelo senhor E. de Macedo Soares.


O Diário Carioca, sastisfez, desde o número inicial, à primeira exigência que se faz a um jornal: o bom aspecto gráfico. Nesse ponto ele é infinitamente superior à primeira folha editada pelo mesmo senhor Macedo Soares, O Imparcial, que materialmente não passava de uma espécie de edição Quaresma¹ do Excelsior de Paris.


O cabeçalho, os títulos, a distribuição da matéria, os tipos, tudo isso que entra para definir a fisionomia de um jornal, dá ao novo diário uma aparência de elegância que até agora, na imprensa carioca, só O Jornal possuía. Como a folha do senhor Assis Chateaubriand, o Diário Carioca é um jornal ‘bem forte’.


O Rio, todos sabemos, tem uma imprensa de primeira ordem, sobretudo no que respeita à reportagem, que é ágil e dotada daquele instinto de oportunidade que faz os bons forwards e os bons reporters. Em todo jornal carioca a ‘linha’, como se diz na gíria do football, é veloz. Sabe escapar e shootar a goal.


O defeito que estraga tão belas qualidades é o de certos teams que jogam para a galeria das gerais. Daí uma lamentável quebra de elegância, que é a falha mais sensível da imprensa do Rio.


Os jornais têm um ar desmanchado, fussy² às vezes repugnantemente sentimental, sempre exagerado, a começar pelas cabeças das notícias, nas quais se faz todos os dias a chantagem do sublime.


Depois de um crime menos banal ou de um vôo transatlâmtico para o Brasil, a imprensa do Rio me dá impressão de uma casa de cômodos da rua Senador Eusébio quando a d. Júlia Lavadeira acabou de meter a mão na cara da Chica do Alfredo.


O Jornal nesse ponto é mais controlado que os seus colegas. Por isso me agrada. Acho um prazer para os olhos correr a vista em gazetas desse feitio. Me dão, pela reserva e concentração da matéria editorial, uma sensação de boa educação, daqueles hábitos vigilantes que suprimem os reflexos inutéis e… a pouca-vergonha útil. [Publicado em A Província (PE), em 30 de agosto de 1928]