Na última semana, às vésperas do Dia das Crianças, o Facebook se encheu de fotos de infância. Apareceram milhares de carinhas incríveis, bonitinhas e sorridentes, substituindo as fotos habituais dos adultos. Talvez você, leitor, também tenha publicado a sua. Minha irmã publicou uma linda, nossa. Foi uma onda infantil que arrancou sorrisos, trouxe surpresas, lembranças e provocou saudade.
O Facebook tem desses fenômenos, como quando se encheu de pessoas que mudaram seus sobrenomes Guarani-Kayowá, em outubro do ano passado, depois que índios do Mato Grosso do Sul, defendendo seu direito à terra e à vida, divulgaram uma carta aberta dramática interpretada como prenúncio de suicídio coletivo.
No caso do sobrenome indígena, o Facebook reagiu notificando os usuários, sob argumento de que informar nomes reais são uma premissa dos termos de uso do serviço. Estragou a manifestação espontânea e relevante em nome dos seus interesses empresariais. Mas como o Facebook vai saber se um nome é real e uma fotografia verdadeira? Vão pedir documentos? Adiantaria? Claro que não.
O Facebook já está infestado de perfis falsos. Não só daqueles que os amigos fazem para “divulgar” uma pessoa conhecida que não está a fim de entrar na rede social. A rede está cheia de perfis falsos mesmo, daqueles mal-intencionados. Do tipo um Bradesco Saúde que vende seguro SulAmérica, que deve pagar o Facebook para ter livre acesso à minha caixa postal.
Nos últimos meses comecei a receber mensagens privadas de pessoas que desconheço, com um lenga-lenga estranho, impessoal. Várias dessas mensagens eram de remetentes mulheres, com caras sugestivas, oferecendo o envio de fotos. Desconfio que o negócio desses remetentes seja pornografia ou prostituição, mas não vou perder tempo em conferir. Problema do Facebook: #ficaadica. Já cansei de prestar serviços gratuitos para grandes corporações. Enquanto tenho um restinho de paciência, apago ou esqueço. Quando não tiver mais, abandono o serviço, como já abandonei tantos outros, que desapareceram com o tempo.
Tempo roubado
Enquanto penso nessas coisas recebo um estranho documento do meu colega jornalista Guilherme Kujawski. Uma pesquisa realizada por profissionais dos departamentos de psicologia das universidades de Michigan, nos Estados Unidos, e de Leuven, na Bélgica, relacionou o uso de Facebook e com bem-estar –ou com mal-estar.
Não, os resultados não mostram o mundo cor de rosa que tentam nos vender de uma vida tanto mais feliz quanto mais conectada. A vida dos facebookianos pode até parecer uma campanha publicitária de margarina, com seus rostos alegres, bonitos e ensolarados. As melhores fotos são escolhidas a dedo, os sofrimentos são em geral escondidos e as informações que podem servir à imagem, à fama ou à vaidade das pessoas são publicadas ininterruptamente, sem parar.
Eu não aguento mais ser informada diariamente que fulano fez “check-in” no mesmo tal lugar, que deve parecer chique para ele, penso eu. Poupe-me! Pense no tempo de leitura que você me rouba! Ou você está pedindo para que eu deixe de “te seguir”?
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Marion Strecker é colunista da Folha de S.Paulo