Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Violência contra jornalistas

Os jornais paulistas passam longe da questão, mas o Globo publica na edição de terça-feira (22/10) três registros sobre casos de violência praticados contra jornalistas. Um deles vem da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que em nota oficial contabiliza quase uma centena de episódios de agressão, hostilidade ou prisão de jornalistas nos quatro meses da onda de manifestações que ocorre desde junho. Interessante observar que, nas estatísticas da entidade, 25 ataques foram praticados por manifestantes e 71 por policiais.

A questão vem se somar às queixas da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), que mais uma vez distribui acusações generalizadas contra governos latino-americanos, aos quais acusa de restringir a liberdade de informação com medidas de controle da atividade da imprensa. Na 69ª Assembleia da entidade, que se realiza na cidade de Denver, nos Estados Unidos, relatada pelo Globo e o Estado de S. Paulo, também foram divulgados levantamentos apontando a ocorrência de 14 assassinatos de jornalistas no continente no primeiro semestre deste ano.

Ao largo das queixas recorrentes da entidade que representa as empresas de comunicação na América, que expõe uma disputa ideológica de mais de dez anos com governos de tendência esquerdista, convém observar certas contradições do caso brasileiro. Por aqui, as principais ameaças à integridade física de jornalistas e ao livre exercício da atividade da imprensa não partem de políticas restritivas, mas da ausência ou omissão do Estado em determinadas regiões, ou do engajamento de representantes de instituições públicas em práticas ilegais.

Não se pode falar em ataques à liberdade de informação no Brasil, por exemplo, sem citar a violência contra jornalistas que denunciam grilagem de terra e invasões de reservas naturais fora do eixo Rio-São Paulo. Também não se pode omitir os casos de arbitrariedade contra jornalistas independentes que denunciam relações entre governantes e grupos de mídia hegemônicos na imprensa regional.

Nos grandes centros, porém, o caso é bem outro: repórteres da mídia tradicional vêm sendo hostilizados por manifestantes e policiais durante os protestos que ocupam as ruas das grandes cidades desde o mês de junho.

Uma tática policial

Desde o início da onda de protestos, nada menos do que 85 jornalistas foram agredidos em dez estados. Em mais de 70% dos casos, o autor da violência era um agente policial. Os números, divulgados pela Abraji, foram ignorados pelos dois grandes jornais paulistas, o Estado e a Folha. Em compensação, foram publicados em duplicidade no Globo. Em um dos textos, são citados os casos de dois repórteres que foram agredidos por manifestantes e um cinegrafista que foi atingido por uma bala de borracha.

O relato é incompleto e mostra que os jornalistas investigativos fizeram uma investigação parcial: na verdade, as agressões de manifestantes são eventuais, enquanto a violência da polícia, segundo relatos das próprias vítimas, tem todos os aspectos de uma escolha da instituição policial por atacar jornalistas deliberadamente.

Alguns dos jornalistas agredidos se queixam nas redes sociais. Destaque para Tatiana Farah, experiente repórter do Globo, que levou dois tiros de bala de borracha, um na cabeça e outro nas costelas, durante os incidentes na Rodovia Raposo Tavares, nesta semana. Também deve ser observado o relato do fotógrafo Yan Boechat, que integra os comentários originados por uma mensagem de Tatiana aos seus amigos do Facebook.

Os dois jornalistas descrevem o que representa, claramente, uma tática oficial da Polícia Militar de São Paulo, de identificar jornalistas na multidão de manifestantes e atacá-los preferencialmente. Até onde se pode notar, não se trata de ações isoladas de policiais sem comando ou fora de seu controle emocional.

Ao levar suas queixas às redes sociais, os repórteres se submetem às críticas emocionais que têm sido motivadas por certas escolhas da imprensa brasileira. Mas é de se perguntar por que não questionam seus chefes sobre o imobilismo das empresas de comunicação, que não defendem seus profissionais. Por muito menos, diretores de Redação em outros tempos enquadraram governantes, exigindo respeito à autonomia do trabalho jornalístico.

O que impede os diretores de Redação dos grandes jornais de São Paulo de exigir das autoridades do Estado que contenham seus agentes e respeitem os jornalistas?