Um estudante da USP se passou por candidato atrasado para fazer a prova do Enem e deu entrevistas narrando o falso episódio, inclusive para a Folha de S.Paulo. Chiquinho Scarpa declarou que iria enterrar seu carro de R$ 1 milhão e surpreendeu a todos com uma campanha de doação de órgãos. A imprensa virou alvo de pegadinhas. Mas não é um vandalismo ao estilo anarquista do Black Bloc. É reflexo da mudança de paradigma de como a sociedade se relaciona com a mídia, aquele Grande Irmão (Big Brother), antes o único detentor do direito de emitir suas mensagens a receptores passivos.
Hoje, armado pela tecnologia, o novo cidadão conectado fala e – mesmo no barulho de um boteco onde todo mundo conversa ao mesmo tempo – consegue ser ouvido graças ao botão “Compartilhar”, capaz de reproduzir postagens aos quatro cantos mais rápido do que prole de coelho. E esta interação afetou o modo como buscamos informação. Não é mais “um para todos”, mas “todos para todos” e, com a imprensa sendo pautada pelas redes sociais, “todos para uns”.
É irônico assistir ao quarto poder sendo testado pelos seus antigos súditos. Personagens fictícios com vontade de serem filmados ou clicados por lentes de veículos oficiais se aproveitam da brecha da falta de apuração e de malícia do repórter e do deadline apertado das redações para alcançarem mídia espontânea e campanhas publicitárias virais, por pura diversão ou por interesses cândidos que se revelam politiqueiros pouco tempo depois. Até que ponto este fenômeno poderá alterar a rotina dos produtores de notícia e a formação de novos comunicadores? O gigante acordou. E o Grande Irmão adormeceu.
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Luís Alberto Caldeira é jornalista, pós-graduado em Comunicação Digital