Recebemos recentemente a visita oficial do ministro da Educação da Irlanda, Ruairí Quinn, para discutir parcerias no campo educacional com o Brasil. Ele fez um ciclo de visitas e, em meio a agenda concorrida, bateu um papo comigo sobre educação e comunicação, entre outros assuntos.
Perguntei sobre como os meios de comunicação lidam com as pautas de educação na Irlanda. Eu já havia conversado sobre esse tema, em 2007, com a professora e então vice-presidente do Conselho de Pesquisas para as Humanidades e Ciências Sociais da Irlanda, Áine Hyland. Na época, ela afirmou que quando foram começar a reforma educacional naquele país, a imprensa foi convocada. E foi colocado claramente que sem a ajuda deles, de nada adiantaria começar o processo de mudanças. Ela havia me dito da necessidade de atingir as casas dos pais dos alunos. Por isso, desde então, semanalmente, os principais jornais publicavam manchetes de duas a três vezes por semana sobre educação. A professora irlandesa defendia que sem uma imprensa participativa e cidadã toda e qualquer mobilização social esvazia-se.
Fui nessa direção com Quinn. E ele endossou as palavras de Hyland. Alegou que a Irlanda é um país de sociedade aberta e democrática assim como seus meios de comunicação. E afirmou que o compromisso de tudo começa com os pais.
O ministro disse que eles possuem uma estrutura educacional madura que criou um sistema de educação nacional em 1801, que estabelecia que as crianças tinham que ir à escola a partir dos 6 anos de idade. Como era um país com vocação agrária na época, houve uma verdadeira mobilização. Quinn deu um exemplo interessante: se um pai, fazendeiro, tivesse seis filhos, apenas um ficaria na fazenda, os outros cinco teriam que obrigatoriamente ir à escola. Foi criada e persiste até hoje, segundo ele, uma atitude cultural decisiva em relação à educação. Ruairí Quinn aponta que a imprensa irlandesa endossa esse comportamento divulgando as conquistas, as reformas. “Para tudo necessita-se de energia, interesse e comprometimento para que as reformas não pereçam”, declarou na conversa.
Justiça e imagem do país
Obviamente, que as notícias com tom alarmista, em qualquer área, sempre acham espaço mais rápido e ajudam a aumentar vendas e audiência. E segundo o ministro, na Irlanda não é diferente. As notícias com problemas sempre ganham destaque. Contudo, de acordo com Quinn, há também espaço de destaque para as boas conquistas. Para ele, a imprensa pode ajudar a destacar as discussões e ganhar a sustentação da opinião pública.
Expliquei que no Brasil, há cada vez menos setoristas cobrindo a área. Resistem bravamente alguns colegas como Demétrio Weber, Lisandra Paraguassu, entre poucos valentes. Sinto falta do texto apurado de Erica Klingl e Paloma Olivetto, quando brilhavam nessa editoria no Correio Braziliense. Parece até que a Olivetto voltará à essa área no CB. Oxalá!
Na conversa, Ruairí Quinn enfatizou a alegria em relação à recente aprovação da Trigésima Terceira Emenda da Constituição da Irlanda, aprovada pelos eleitores em um referendo no dia 4 de outubro de 2013 e depois transformado em lei pelo presidente em 1º de novembro. Com isso, foi criada uma Corte de Apelação que deve desafogar a Suprema Corte da Irlanda, que é a última instância para todos os casos judiciais e demora, em média, quatro anos para começar um julgamento. Segundo Quinn, essa medida, melhorará a imagem do país no exterior e para si mesmo. De acordo com ele, ninguém aguentava mais o excesso de medidas protelatórias que passava uma imagem de impunidade e morosidade do sistema. Agora, ele acredita que tudo poderá ser mais célere e os meios de comunicação poderão ajudar nisso também.
Irlanda e Brasil
Sobre o Brasil, Quinn revelou que há muitos irlandeses nos Estados Unidos, por isso há muita informação sobre aquele país na Irlanda. Contudo, lamentou que pouco se sabe sobre o Brasil, apesar de ter aumentado consideravelmente o fluxo de estudantes que vão estudar no país dele. Somente no ano passado, cerca de 1,2 mil estudantes brasileiros foram para o país participar doCiência Sem Fronteiras e a expectativa é que até o ano que vem esse número atinja os 2 mil. Em números exatos, as instituições irlandesas abrigam hoje 1.335 estudantes brasileiros. Desse total, 1.297 estão em cursos de graduação, 21 em doutorados, nove em doutorados plenos e oito em pós-doutorados, segundo Ruairí Quinn. Ele também endossou que um dos quesitos, além da qualidade, que chama a atenção de nossos estudantes é a segurança. “Lembro que uma estudante brasileira, recentemente, me perguntou por que não via os policiais irlandeses com armas. Respondi que nosso sistema de segurança não era baseado nisso”, comentou.
O fato é que a visita do ministro pode resultar numa parceria com nosso país. Ele se disse interessando em trocas de experiências entre nossas instituições de ensino superior e as deles. Contou-me que já há uma parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e que quer mais. Por exemplo, na área de pesquisa no setor de laticínios e carnes, o que foi encarado com entusiasmo por nosso ministro da Educação, Aloizio Mercadante. Seria ótimo se nossa Embrapa entrasse nesse circuito.
Nessa conversa percebi o quanto ainda temos para aprender e como a imprensa pode ligar assuntos e pessoas de maneira distinta. No exemplo da Irlanda, do envolvimento de todos nos processos que influenciam a educação e a mídia, uma luz para quem trabalha e estuda. Que possamos sempre mais lutar por uma pauta positiva em meio a tantos percalços e mediocridade. Ainda há muito para se caminhar. Então, caminhemos.
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Marcos Linhares é jornalista, professor e escritor, autor de 11 livros, e foi o idealizador e âncora do programa Educa, Brasil