Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Censura à internet aumenta crise na Turquia

À medida que se aproximam as eleições municipais de março, a crise institucional se agrava na Turquia, e o premier Recep Tayyip Erdogan amplia as medidas autoritárias para se manter à tona, mas põe em risco a democracia e a credibilidade que o país conquistou na última década. Erdogan, que levou o partido islâmico AKP à vitória nas eleições de 2002 e se mantém no poder desde 2003, apresentou um projeto de lei para limitar o acesso dos cidadãos à internet para “proteger a família, as crianças e a juventude de informações que incentivem o consumo de drogas, abusos sexuais e suicídio”. A iniciativa permite ao governo gravar o histórico de acesso dos internautas durante dois anos. Na prática, é censura e vigilância do uso que seus críticos fazem da rede – enorme retrocesso e obstáculo no processo de adesão à União Europeia. O premier mira também na polícia, no Ministério Público e no Judiciário. O governo propôs aumentar seu poder sobre o conselho que supervisiona juízes e promotores.

A crise começou com investigações da polícia e do Judiciário sobre denúncias de corrupção nos grandes projetos de construção do governo. A polícia prendeu filhos de três ministros, que pediram demissão, um diretor do banco estatal HalkBank e um magnata da construção integrante do círculo de Erdogan, sob acusações de suborno, lavagem de dinheiro, contrabando e tráfico de influência. Erdogan reagiu com fúria, substituindo dez ministros, demitindo 350 policiais e transferindo dezenas. O premier denunciou um golpe contra seu governo. Ontem, ele instruiu os embaixadores turcos a defender com firmeza junto aos aliados que as investigações da polícia e do Judiciário são parte de um complô externo para sabotar a posição internacional da Turquia.

A crise é, em grande parte, resultado da luta entre ele e um antigo aliado, o clérigo Fethullah Gulen, que se exilou nos EUA e comanda o movimento Hizmet, com grande influência no mundo acadêmico, no Judiciário, na polícia e no próprio partido de Erdogan. O problema é que o premier tem se mostrado cada vez mais autoritário, adotando expurgos para esvaziar crises militares e excesso de força, como em junho de 2013, para reprimir protestos contra seu plano de redesenhar o Parque Gezi, em Istambul. Ele se fia na popularidade obtida com as conquistas na economia — a produção triplicou em dez anos, a qualidade de vida melhorou e o país nada mais deve ao FMI. Mas põe em risco um modelo considerado exemplo de convivência entre um governo islâmico e a democracia.

O destino político de Erdogan depende, em grande parte, do desempenho de seu partido nas eleições de março. Um fracasso abalará seu plano de disputar as presidenciais, em agosto. O que não justifica tornar-se um ditador islâmico. Que o diga o ex-presidente islâmico Mohamed Mursi, do Egito, derrubado pelos militares.