Estavam querendo um cadáver e apostavam que seria de um manifestante morto pela polícia. Não deu certo para eles. A tragédia alcançou o cinegrafista Santiago Andrade. Vamos ver o que dizem os mentores do ódio à imprensa crítica e das hostilidades a jornalistas. Os mesmos que pastoreiam os black blocs, os excitam, glamourizam e protegem.
Essa cultura do ódio vem sendo fomentada há anos em crianças e jovens por professores militantes, vem sendo difundida na sociedade por ideólogos da violência como estratégia sagrada da revolução salvadora, vem sendo espalhada por governantes corruptos e por políticos oportunistas que instrumentalizam a democracia para chegar ao poder e depois a desmoralizam e a combatem para eternizarem suas posições.
Cabe tudo na grife Black Bloc, desde os desmiolados turbinados pelos intelectuais sem cérebro até os mercenários contratados por partidos e delinquentes pequenos e grandes que querem tirar vantagem da confusão. Conseguiram acabar com as manifestações pacíficas, expulsaram o povo da rua e agora têm um cinegrafista morto.
É preciso responsabilizar autores, patrocinadores e mentores desta ação. É preciso investigar de forma competente e republicana. Se a polícia e a justiça funcionarem como devem, vão acabar descobrindo e punindo os culpados. Estamos acompanhando o mensalão e sabemos que é possível. Tem de cobrar.
Também é preciso cobrar as instituições da sociedade que por omissão e mesmo apoio à violência são cúmplices de tudo isso. O Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, ao qual sou filiado desde 1971, tergiversou durante meses. Esperaram uma morte para se pronunciar com uma nota mais de contundente.
Outra nota do sindicato, de janeiro, apontava uma situação gravíssima, mas sequer questionava os agressores: “Mais um episódio em que um repórter foi impedido de exercer o seu trabalho na cobertura de uma manifestação. Dessa vez, segundo relatos de testemunhas, o profissional, a serviço da Globonews, trabalharia sem identificação e teria sido reconhecido e apontado por midiativistas, que teriam estimulado a sua expulsão de um ato em frente ao Shopping Leblon, neste domingo (19/1)”. A gente pode imaginar o constrangimento desse jornalista, certamente muito jovem.
Resposta à altura
Aquela nota do sindicato foi burocrática, protocolar. Que ação o sindicato tomou na ocasião para exigir das autoridades a identificação dos tais “midiativistas”? Essa palavrinha “midiativistas” no texto é eufemismo para esconder quem? Que tipo de gente caça jornalistas trabalhando, “reconhece”, “aponta” e “estimula” a sua expulsão?
Por que o sindicato não convocou uma reunião democrática da classe para discutir a situação? Uma reunião em horário e local que jornalistas possam comparecer em grande número? Participei de algumas, em momentos críticos, com centenas de colegas. Em uma delas, no antigo Teatro Casa Grande, acho que éramos mais de mil.
Por que o sindicato não promove uma manifestação pública, na rua? Imagino que o pessoal do sindicato sabe que liberdade de imprensa não é só direito de jornalista; é direito do cidadão.
Tim Lopes tinha de trabalhar sem identificação. Outros tantos colegas têm de trabalhar assim em áreas e situações de alto risco. Por que a nota do sindicato não perguntou o que obriga um jornalista a ter de ir sem identificação para cobrir um rolezinho no Leblon?
A estratégia de impor a violência para colonizar a rua e expulsar o povo é um sucesso. Quantas manifestações pacíficas estão sendo abortadas pelo medo da violência? Quem ganha com isso? Imagino que o repórter que vai cobrir as manifestações também está contagiado pelo medo. Isso é uma ferida na alma do cidadão e do jornalista. Um está sendo atingido no direito de se manifestar. O outro está sendo aterrorizado no dia a dia do trabalho.
Não tenho dúvidas de que a sociedade vai dar a resposta necessária a esta violência, aos abusos dos governos, aos impostos exorbitantes, à corrupção, aos serviços públicos péssimos, aos aumentos de preços e às ameaças às liberdades e à democracia. Vai chegar a hora que vamos voltar para a rua com ou sem black bloc. E vamos fazer valer o nosso voto.
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Altamir Tojal é jornalista