É difícil saber se essa polêmica do Mais Médicos está fazendo mais estragos na reputação dos médicos ou na dos jornalões brasileiros. Hoje (30/8) – não por coincidência – dois jornalões (Folha de S.Paulo e O Globo) dão destaque à triste história da dra. Junice Maria Moreira, médica do programa Saúde da Família que estaria sendo sumariamente demitida para “dar lugar a um cubano” em Murici, povoado da cidade de Sapeaçu, BA. A denúncia foi plantada na imprensa pelo CRM da Bahia. Para azar dos jornalões, uma repórter seguiu o princípio básico de dar voz ao outro lado.
Os links: Folha: “Disseram que eu tinha que dar lugar a um cubano“; O Globo: “Prefeituras substituem médicos por profissionais do programa do governo”.
Muito bem. Aí a gente acessa o serviço CNESNet da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde e pede uma busca pelo nome da doutora Junice Maria Moreira. Descobre-se que a essa médica tem quatro vínculos empregatícios ativos, dois deles de 40 horas no Programa de Saúde da Família e mais dois de 24 horas cada como médico clínico. Total de 128 horas semanais (improváveis 18 horas e meia por dia, de segunda a segunda). Com um detalhe: os vínculos públicos são com prefeituras de três cidades diferentes (Murici, Queimadas e Jiquiriçá, no interior baiano) distantes 357 km entre si, 4h40 de viagem, segundo o Google Maps.
Com essa carga de trabalho insana e atendendo em três municípios distantes é de se supor que a dra. Junice encontrasse dificuldades para cumprir seus horários contratados. Pois foi exatamente isso que constatou a repórter Louise Lobato, do jornal Correio ao seguir o princípio básico de dar voz ao outro lado (relegado ao mero registro de um desmentido formal nas matérias da Folha e d’O Globo).
Um excelente negócio
Da matéria de Louise:
“O secretário de Saúde da cidade, Raul Molina, desmentiu as alegações. ‘Ela disse que está sendo substituída por um médico estrangeiro, mas isso não é verdade. A demissão aconteceu não para economizar recursos da prefeitura, e sim porque esta médica não está cumprindo o contrato. Ela se recusa a cumprir a carga horária determinada, de 40 horas, e ao invés disto, trabalha somente durante um turno, duas vezes na semana. Ou seja, apenas 12 horas’, afirmou. ‘Há três meses, nós comunicamos para a cooperativa que ela não estava cumprindo a carga horária, pedindo a substituição. Contudo, a cooperativa disse que não tinha nenhum outro médico disponível para substituí-la. Por causa disso, demos entrada no pedido para participar do Mais Médicos’, relata o secretário Molina.”
Bem, se a dra. Junice é uma amostra do tipo de profissional da saúde pública que está sendo trocado pelos médicos cubanos, continuo achando que o Brasil está fazendo um excelente negócio em trazer los hermanos.
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André Borges Lopes é professor universitário e produtor gráfico