Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Espionagem digital

Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff expressou a Barack Obama sua indignação por ter sido alvo de espionagem de agências dos Estados Unidos. Ela também reclamou de ter ficado sabendo disso pelo noticiário. As informações vieram de documentos secretos revelados por Edward Snowden, ex-técnico da CIA, divulgados há uma semana [domingo, 1/9] pelo “Fantástico”, da Rede Globo.

Por mais que queira cobrar os EUA, o governo brasileiro também deve explicações. Porque o fato de a presidente da República ter sido espionada (com sucesso) e só saber disso pelos jornais mostra o grau extremo de vulnerabilidade do País em defesa cibernética. A proteção das informações hoje é um assunto tão sério quanto a proteção do território nacional.

O que o governo tem feito para blindar as suas comunicações e as dos cidadãos brasileiros? Não fossem as revelações de Snowden, nunca saberíamos que a presidente foi alvo de espionagem?

A verdade é que a defesa cibernética no Brasil está longe de receber a atenção e os investimentos necessários. O orçamento deste ano destinou R$ 90 milhões para essas atividades. Segundo o Centro de Comunicação Social do Exército, até agora, R$ 61 milhões foram autorizados a serem gastos, e R$ 54 milhões efetivamente aplicados.

Guerra virtual

Esses valores são praticamente nada comparados aos US$ 52,6 bilhões do orçamento secreto das agências de espionagem americanas para 2013, de acordo com os documentos divulgados por Snowden. O Brasil não teria condições de fazer frente a essa montanha de dinheiro, mas R$ 90 milhões são poucos recursos até mesmo para padrões brasileiros.

O Ministério da Defesa tinha um orçamento de R$ 18,7 bilhões neste ano. Com contingenciamentos, caiu para R$ 14,2 bilhões. A defesa cibernética ficou somente com 0,4% do total de recursos. Não dá para fazer milagre. O governo brasileiro acaba parecendo um pouco o cara que sai de férias, deixa a porta aberta e na volta reclama que a casa foi roubada.

Os documentos divulgados por Snowden mostraram que os EUA têm hoje 16 agências de espionagem, que empregam 107 mil pessoas. Elas competem com empresas do Vale do Silício pela atração dos melhores programadores e engenheiros do seu país. Enquanto isso, o Brasil não consegue formar engenheiros e programadores em quantidade suficiente para suprir a demanda das empresas que operam por aqui.

Em 2010, veio a público a existência do vírus Stuxnet, projetado para atacar usinas de processamento de urânio iranianas. Segundo especialistas, o software malicioso foi resultado de uma parceria entre agências de espionagem americanas e israelenses. Guerra virtual não é brincadeira. E, por sua reação, parece que o governo brasileiro imagina que pode simplesmente contar com o bom comportamento alheio.

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Renato Cruz é colunista do Estado de S.Paulo