Este livro é fruto de um levantamento minucioso do professor Venício de Lima sobre o contexto e o estágio de implantação dos Conselhos de Comunicação Social no Brasil. O esforço para realizá-lo é, antes de tudo, fruto de uma crença. Nas palavras do autor, a crença de que “a participação popular na formulação e acompanhamento de políticas públicas implementadas pelo Estado constitui um fator decisivo para o fortalecimento da democracia”.
Sua edição pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação explica-se, sobretudo, pelo compartilhamento desta crença. Na perspectiva do FNDC, para que exista democracia é necessária a participação da sociedade nas decisões sobre os rumos do Estado. Apesar de parecer óbvio, não é esse o tom que a maior parte dos governos, parlamentares e, principalmente, grandes meios de comunicação adotam quando tratam do debate sobre o acesso, produção e distribuição da informação.
Ferramenta fundamental para fiscalizar e abrir espaço à contribuição social, os conselhos já são instrumentos consolidados em setores como saúde e educação, mas ainda lutam para respirar quando o tema é a garantia do direito à liberdade de expressão, reiteradamente condicionada pelo poder econômico. A obra resgata o papel fundamental dos conselhos que jogam a favor da implementação de políticas públicas e da realização da democracia direta, ao permitir a participação dos atores sociais na elaboração de propostas.
No caso da comunicação, Venício Lima é, de alguma forma, um observador participante da criação dos conselhos, já que foi assessor, no processo constituinte, da deputada Cristina Tavares (PMDB-PE), responsável pela relatoria da Comissão de Ciência e Tecnologia e Comunicação. A ideia de espaços de participação da sociedade na formulação e implantação de políticas de comunicação nasceria daquele debate, mas encontraria muitos percalços antes de se transformar no artigo 224 da Constituição Federal e ganhar corpo em nove constituições estaduais.
Em defesa dos conselhos
Como fica claro no primeiro capítulo, a formulação do Conselho de Comunicação Social previsto na Constituição de 1988 nasce de um impasse entre uma proposta avançada do campo sindical e a vontade do setor empresarial de não ter conselho algum. A tramitação do processo constituinte encontrou barreiras para a proposta de um conselho de comunicação em todas as etapas de elaboração. O resultado foi a previsão constitucional de um conselho com papel apenas auxiliar, que mesmo assim só teve empossada sua primeira gestão quatorze anos depois da promulgação da carta magna.
A maior contribuição do livro, contudo, diz respeito a como a proposta de conselhos foi trabalhada no âmbito dos estados da federação. Venício destaca que esses espaços de participação foram aprovados em apenas quatro estados brasileiros – Alagoas, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia – e, ainda assim, funcionam, de fato, apenas no último.
A resistência à implantação dos conselhos vem principalmente do setor empresarial, que atribui aos conselhos o papel de censor, embora não esteja previsto em nenhuma das propostas qualquer medida que possa ser entendida dessa forma. Essa resistência não surpreende. No Brasil, os oligopólios e monopólios midiáticos, proibidos pela Constituição Federal, lutam para manter o poder. Hoje, poucos grupos controlam a maior parte da programação que vai ao ar na televisão, além de haver um aprofundado quadro de concentração cruzada, com jornais, revistas, rádios, TVs e sites controlados pelos mesmos grupos, o que impede a pluralidade e a diversidade de vozes e ideias.
A implantação dos Conselhos poderia ajudar a efetivar a obrigação constitucional de promoção da cultura regional e do estímulo à produção independente, que nunca viraram lei nem são cumpridas pela velha mídia. Poderia também ajudar no controle ao cumprimento do artigo 54 da carta magna, que impede deputados e senadores de serem concessionários de rádio ou televisão.
Como afirma o autor, “impedir a criação dos CECS significa interditar um fórum de ampliação da liberdade de expressão – muitas vezes e paradoxalmente, combatido em seu próprio nome – e contribuir para perpetuar a exclusão secular de vozes característica de nossa cultura política”.
O FNDC também acredita que os conselhos são parte de um sistema de regulação democrática da mídia, sem o qual não há garantia de liberdade de expressão para todos os cidadãos e cidadãs. Nesta direção, o FNDC propôs neste ano de 2013 um projeto de lei da mídia democrática, a fim de oxigenar e garantir a regulação este setor estratégico, de forma a consolidar o direito humano à comunicação e garantir o desenvolvimento e a soberania nacional. Acreditamos que a luta pela implantação dos conselhos pode se dar em conjunto com a luta por uma nova lei que possa finalmente colocar em prática os princípios previstos na Constituição de 1988.
Nesse sentido, a contribuição que o professor Venício Lima dá com esta obra é fundamental e estratégica para que os militantes da democratização da comunicação possam ampliar a defesa dos conselhos em seus estados. Que esta contribuição ecoe e energize o bom combate pela verdade e a justiça, com uma mídia mais democrática.
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Rosane Bertotti é coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)