Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A mídia deveria ser censurada pelos infringentes?

O que se esperava aconteceu. Na quarta-feira (18/9), o ministro do Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, desempatou a disputa que tratava da aceitação ou não dos embargos infringentes, votando pela aceitação dos mesmos com ampla justificativa jurídica e histórica. Como previsto, a decisão gerou vasto material para a exploração da imprensa como um todo, criando manchetes para um longo período e abrindo espaço para todo o tipo de articulação em cima da causa que é técnica, mas afeta o meio político e o senso comum do cidadão à medida que envolve um dos casos mais emblemáticos de corrupção dos últimos tempos. Diversos articulistas, políticos e juristas conceituados passaram a encher os jornais e sites com artigos, ora defendendo a aceitação de tais embargos, ora execrando a possibilidade de tal aceitação.

Mas acredito que o ponto principal a ser destacado foi a mídia criticando a ela mesma sobre as posições a favor e contra os réus do processo em questão, numa espécie de censura a posições assumidas por diversos meios. Exemplos dessa crítica estão em artigo publicado no site da revista Carta Capital, assinado por Maurício Dias (ver aqui), o qual aponta a pressão da mídia para tentar pautar a decisão do Supremo com relação aos infringentes, intenção essa derrotada pela afirmação da democracia. Outro exemplo é o artigo publicado neste Observatório por Alberto Dines (ver aqui),que se mostra estarrecido com o tratamento da mídia com a pressão em relação ao julgamento da AP 470 e reitera que a mídia não pode agir dessa forma, tentando direcionar a decisão de uma suprema corte.

Mas não vi esses mesmos jornalistas e articulistas criticando, por exemplo, a mídia, que em sua grande parte deu destaque em entrevistas e coberturas especiais às reações dos réus no decorrer de seu julgamento, dando espaço para vários deles, principalmente do ramo político, criticarem a Suprema Corte de seu país acusando-a de realizar julgamento de exceção, claramente desrespeitando a ordem institucional constituída. Pergunto-me se um cidadão comum iniciar acusações contra o juiz que o julgou condenado terá o mesmo tratamento – ou seja, amparo e visibilidade na mídia – e não será preso por desacato ao questionar publicamente uma ordem dada por um juiz ou tribunal democraticamente constituído.

Que tal uma Venezuela?

Parece-me até agora que uma das vozes mais sensatas que tem discutido este tema com serenidade e sem deixar-se censurar por pressão midiática ou política é o articulista Reinaldo Azevedo (ver aqui), que mesmo criticando duramente a posição do STF, e com opinião clara sobre o tema, mostrou diversos argumentos que poderiam levar o tribunal à decisão de aceitar ou não os embargos; e mesmo após a decisão tomada pelo ministro Celso de Mello apontou, sim, sua discordância, mas também os méritos do magistrado que não poderia ser “prejulgado” por essa decisão.

É evidente que existem posições diversas na mídia, a favor e contra diversos posicionamentos, e assim que deve ser, pois senão não teremos o debate. Entendo que deve haver, sim, pressão dos veículos, pois se é para concordar com tudo, então não há necessidade de existirem veículos de comunicação. Bastava apenas a NBR, TV Brasil e a Voz do Brasil e fecharíamos os outros veículos. Que tal uma Venezuela com o Maduro na programação durante 10 horas por dia?

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Marcos dos Santos Farias é analista de logística, Campinas, SP