Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Confusões sobre números e créditos

Em sua coluna de domingo [5/3/06], a ombudsman do Washington Post, Deborah Howell, analisou uma característica peculiar da cobertura jornalística de Washington e, em especial, um caso relacionado ao Post. Deborah alega que, na capital federal, os créditos por uma reportagem não são muito importantes para a maioria dos leitores, mas as organizações de mídia geralmente costumam fazer questão de serem creditadas em matérias de veículos concorrentes quando consideram que foram responsáveis por um furo jornalístico. Por isso, um memorando da sucursal de Washington da Knight-Ridder criticando o Post, que vazou para o sítio de Jim Romenesko na sexta-feira (3/3), não foi visto com tranqüilidade na redação do jornal.

Muitos jornalistas e editores consideraram injustificadas as críticas de Clark Hoyt, editor da sucursal da Knight-Ridder em Washington, e de John Walcott, chefe do escritório, sobre matérias publicadas no Post na semana passada. Romenesko escreve diariamente para o sítio da organização de crítica de mídia Poynter Institute e membros da equipe do Post acreditam que a divulgação do memorando foi proposital. Hoyt justifica que não divulgou o documento e expressou suas reclamações sobre o assunto para Deborah.

O ponto mais polêmico do documento foi o questionamento de Hoyt sobre a veracidade e a fonte dos números de mortos na mais recente onda de violência no Iraque – 1.300 – citados na matéria de primeira página do Post na terça-feira (28/2). No memorando, Hoyt alega que ‘nossa cobertura em Bagdá – assim como a das outras organizações de mídia – não foi capaz até agora de autenticar a matéria do Post. O Post citou um funcionário do necrotério de Bagdá afirmando que foram registrados 1.300 cadáveres como resultado de uma luta sectária. Mas quando nosso correspondente examinou os registros do necrotério, encontrou apenas 250 corpos registrados como mortos na onda de violência. Nossa matéria, citando o governo iraquiano, dizia que o número de mortos era 379 – estando aí provavelmente incluídos aqueles 250′.

O documento continua criticando um artigo do Post de quarta-feira (1/3), que citou o general Ali Shamarri, do departamento de estatísticas do Ministério do Interior, afirmando que o número de mortos chegava a 1.077. ‘Em Bagdá, nossos correspondentes tentaram entrevistar o general para confirmar os números e foram informados de que não havia ninguém com este nome trabalhando no departamento de estatísticas ou em nenhum outro lugar do Ministério’, disse Hoyt.

David Hoffman, editor-assistente da seção de notícias internacionais, afirmou ter certeza de que os artigos eram precisos, justificando que todas as matérias da chefe da sucursal de Bagdá, Ellen Knickmeyer, usaram fontes confiáveis. ‘Eu sei a identidade de todas as fontes no processo da reportagem. [Ellen] Knickmeyer estava no necrotério e divulgou o que viu pessoalmente’, afirmou. Sobre o general, Hoffman alega que não sabe por que outros repórteres não conseguiram localizá-lo. Ellen escreveu três matérias sobre o número de mortes, afirmando como as agências estão fazendo diferentes contagens.

Créditos

Sobre esta primeira questão, Deborah prefere não tomar nenhum dos lados, por não ter informações suficientes para isso. A outra questão referente ao memorando envolve os créditos dados às matérias. Por muitos anos, as organizações de mídia raramente colocavam créditos uma das outras. Se um furo fosse usado por outro veículo, o nome do primeiro que o divulgou não era mencionado. Isto mudou à medida que as empresas de mídia tornaram-se mais transparentes.

Hoyt e Walcott afirmaram que a Knight-Ridder deveria ter sido citada em matéria escrita por Glenn Kessler e publicada no dia 21/2 no Post, pois o repórter da Knight-Ridder Warren P. Strobel teria assinado uma reportagem similar no dia 7/2. O artigo tratava da reorganização do Departamento de Estado, que removeu especialistas em controle de armas que não compartilham da suspeita da administração Bush sobre as negociações e acordos internacionais de armas. ‘Não havia um único dado na matéria de Kessler diferente da de Strobel, que foi resultado de semanas de pesquisa e entrevistas com 11 atuais e ex-funcionários do governo’, dizia o memorando. Kessler justificou que estava cobrindo o tema antes da publicação da matéria de Strobel, e que ‘ já tinha obtido muitos dos detalhes citados no artigo da Knight-Ridder. Mas, em retrospecto, teria citado com prazer a Knight-Ridder’.

Deborah levou o caso aos editores do Post, que afirmaram ter conhecimento da matéria de Strobel, mas ressaltaram que o artigo não merecia uma correção. A ombudsman acredita que um esclarecimento aos leitores seria apropriado, informando que uma matéria similar havia sido publicada anteriormente pela Knight-Ridder.