Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

‘El Nacional’ corre risco de parar de circular

O jornal “El Nacional”, um dos principais diários de oposição ao governo da Venezuela, corre o risco de ficar sem papel para circular. Segundo a direção do periódico, a Comissão de Administração de Divisas (Cadivi) não tem liberado os dólares para que a empresa possa pagar os fornecedores internacionais de papéis. Instituída em 2003, a Cadivi é responsável por administrar as trocas cambiais no país, para evitar a saída de divisas. Ou seja, qualquer empresa que precise de dólares para negociar no exterior, precisa da aprovação do órgão governamental.

O “El Nacional” afirma que cumpriu todos os trâmites legais para comprar o insumo, que não é fabricado no país, mas que desde maio a Cadivi não tem liberado mais o dinheiro.

O governo da Venezuela garante que as divisas para que os meios de comunicação privados comprem o papel-jornal têm sido liberadas. Mas nas últimas listas com a distribuição de divisas não aparece o “El Nacional”. O jornal já foi obrigado a cortar a circulação de alguns suplementos, como “Papel literário”, mas segundo a direção do diário, isso só garante uma curta sobrevida.

SIP: Cinco jornais regionais fechados

A perseguição à imprensa na Venezuela vem se tornando algo institucional no país. A procuradora-geral do país, Cilia Flores, mulher do presidente Nicolás Maduro, solicitou em agosto o congelamento das contas bancárias de Miguel Henrique Otero, diretor do “El Nacional”. A razão seria uma disputa judicial de Otero com o ex-prefeito de Caracas e ex-diretor do jornal Alfredo Peña. O Ministério Público também ordenou o encerramento das contas bancárias do presidente do grupo Sexto Poder, Leocenis Garcia, outro crítico do governo.

Relatório de 2012 da associação civil Espaço Público contabilizou 248 denúncias de agressão contra a liberdade de expressão – desde agressões diretas (61 denúncias) até ciberataques (51 denúncias), passando por intimidação (51 denúncias) e censura (53 denúncias). A divisão venezuelana do Instituto Imprensa e Sociedade reportou, por sua vez, 193 casos em 2013. Para se ter uma ideia da gravidade da situação, no Peru o instituto contabiliza apenas 43 alertas.

Na Argentina, a pressão do governo sobre a imprensa também tem aumentado. Esta semana, a Corte Suprema considerou constitucional a polêmica Lei dos Meios, que vai obrigar o grupo Clarín a abrir mão de várias concessões.

A dramática situação do “El Nacional” aprofundou uma crise que, segundo Claudio Paolillo, presidente da Comissão de Liberdade de Expressão da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), já provocou o fechamento de cinco jornais regionais venezuelanos. Outros, como “El Impulso”, um dos mais importantes do Estado de Lara, correm sério risco de ficarem sem papel para circular nos próximos meses.

– Esta é a forma que a semiditadura venezuelana encontrou de fechar jornais. Em vez de enviar os militares, como as antigas ditaduras, se fazem de idiotas e não respondem aos pedidos de liberação de divisas para comprar papel- afirmou Paolillo.

Para o representante da SIP, o governo de Nicolás Maduro está aplicando um mecanismo de “censura indireta” aos jornais venezuelanos.

– Nas ditaduras, brigávamos contra um inimigo claro. Agora são governos eleitos pelo povo que fazem este tipo de manobra com o mesmo objetivo das ditaduras – reforçou Paolillo.

Os problemas enfrentados por jornais regionais venezuelanos foram denunciados pela delegação do país que participou da última assembleia anual da SIP, em Denver, nos Estados Unidos. Como no caso do “El Nacional”, esses diários não conseguiram autorização do Cadivi para comprar os dólares necessários para financiar a compra de papel importado, já que a Venezuela não produz o insumo básico para os jornais.

– O Cadivi não diz que não, ele simplesmente não responde e coloca os jornais numa situação extremamente delicada – enfatizou o representante da SIP.

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Janaína Figueiredo é correspondente do Globo em Buenos Aires