Quase cinco anos depois que a questão foi levada às barras da justiça, o juiz Marco Antônio Castelo Branco, da 2ª vara da fazenda pública de Belém decidiu, no mês passado, ainda em 1º grau. a ação civil pública proposta em 2008. Determinou que os jornais de Belém não publiquem mais fotografias de pessoas mortas violentamente. A proibição, entretanto, se restringe às capas das edições desses jornais. Elas poderão continuar a sair nas páginas internas.
A razão do duplo tratamento, segundo o juiz, está no fato de que, não saindo mais na capa, as fotos ficam restritas ao interior do jornal, em caderno específico, de publicação de fotos de morte violenta, na seção policial. Se alguém se considerar lesado pela publicação, poderá pedir reparação à justiça, a quem caberá ponderar a respeito da violação dos direitos fundamentais dos atingidos.
A medida pretende “evitar a banalização da exposição da violência de pessoas, expostas à curiosidade pública, bem como a repulsa dos não leitores, evitando-se que se utilize de tais imagens como chamariz para o auferimento de lucro. Há necessidade de se evitar tal publicação, diante da possibilidade de que crianças e adolescentes tenham acesso precocemente às imagens da violência estampadas nos jornais locais, bem como, a repulsa natural dos que são sensíveis à cultura da violência, e compulsórios espectadores de tais fatos”, ponderou o juiz.
Mas qual o efeito real dessa iniciativa para alcançar tais objetivos? Talvez, na prática, nenhum. Mesmo expurgadas da capa, que serve de vitrine para o conteúdo dos jornais, essa função pode ser suprida pelos vendedores de rua, que apregoam as matérias mais escandalosas distribuídas pelos cadernos de polícia da grande imprensa paraense.
Elas são o produto de maior vendagem dos jornais, principalmente entre os leitores menos instruídos. E os tradicionais frequentadores desses espaços sangrentos (e, evidentemente, sensacionalistas), continuarão a dedicar sua primeira leitura a esse noticiário, mesmo sem as fotos escandalosas na primeira página.
Fórmula semelhante
É uma questão de hábito e cultura, que não pode ser abordada da forma pretendida pelos autores da ação civil pública, sem violar a proteção constitucional à liberdade de informação. Páginas de polícia são atrativos de quase todos os jornais do mundo. Mas onde o nível educacional, cultural e civilizatório se desenvolveu, a imprensa não tem os procedimentos vigentes no Pará.
Provavelmente não há mais um órgão da grande imprensa que dê seis páginas em formato standard, como O Liberal, que supera o Diário, com suas oito páginas tamanho tabloide (equivalentes a quatro standard). Ou que publicam tantas fotos de cadáveres, os famosos “presuntos” da linguagem policial, que se tornou a própria linguagem jornalística. Isso vende mais jornal quanto maior é o sensacionalismo, item no qual o jornal da família Barbalho é campeão. Como aí se encontra a razão de ter superado o rival, a fórmula é a mesma nas duas empresas. O povo gosta, é verdade, evidência dos baixos níveis de escolaridade, cultura e civilidade. Mas os jornais exageram. E vão continuar a agir assim.
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Lúcio Flávio Pinto é jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)