Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Ouça a primeira emissora de rádio do mundo

Estava ouvindo esta manhã a primeira emissora comercial de rádio do mundo – a KDKA, de Pittsburgh, Pensilvânia, Estados Unidos – inaugurada no dia 2 de novembro de 1920. Não é surpreendente que ela ainda exista e esteja no ar? E mais: pode ser ouvida por você, na internet. Entre no site www.kdka.com, agora com o endereço mais moderno: http://pittsburgh.cbslocal.com/

O primeiro noticiário da KDKA no dia de sua estreia em 1920 foi a cobertura das eleições presidenciais americanas daquele ano, com a vitória do senador republicano Warren Harding e a derrota do democrata James Cox.

Em seu estúdio, apenas quatro homens operavam todos os equipamentos e preparam os textos das notícias. Um jornal protestou contra o nascimento da emissora: “Essa rádio, radiotelefonia ou seja lá o que for, não vale qualquer discussão”. Outro diário previu que a publicidade no rádio não apenas seria ineficaz, mas ofensiva aos ouvintes. Para contrariar sua opinião, a Rádio WEAF, de Nova York, transmitia o primeiro anúncio comercial pago do mundo, em 1922, que custava ao anunciante a fortuna de US$ 50 pelo total de 10 minutos.

O fato significativo que focalizo aqui é a proximidade do primeiro centenário do rádio, em 2020. No Brasil, será em 1922, considerando a primeira transmissão, que ocorreu em 1922, no dia do Primeiro Centenário da Independência do Brasil. O discurso do presidente Epitácio Pessoa, feito no Rio de Janeiro foi ouvido em grandes alto-falantes na Praça da Sé, em São Paulo, bem como em Niterói e Petrópolis, dentro do programa de comemorações do Centenário da Independência. O jornal A Noite do dia seguinte aplaude: “Um sucesso da radio-telephonia e do telephone auto-falante”.

“Injustiça devastadora”

Ao inaugurar a primeira emissora de rádio do Brasil, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, em 20 de abril de 1923, Roquette-Pinto revela seu extraordinário otimismo e seu sonho quanto ao papel da radiodifusão nascente:

“Todos os lares espalhados pelo imenso território do Brasil receberão livremente o conforto moral da ciência e da arte. A paz será realidade entre as nações. Tudo isso há de ser o milagre das ondas misteriosas que transportarão, no espaço, silenciosamente, as harmonias. Que incrível meio será o rádio para transformar um homem em poucos minutos, se o empregarem com alma e coração!”

Médico, antropólogo e professor, Edgard Roquette-Pinto é, acima de tudo, um apaixonado pelo rádio. Nascido na cidade do Rio de Janeiro em 25 de setembro de 1884 e criado numa fazenda em Minas Gerais, aos 10 anos retorna ao Rio de Janeiro com os pais. Aos 21, forma-se em Medicina. Faz diversas viagens aos sertões de Mato Grosso ao lado do então coronel Rondon (Cândido Mariano da Silva).

Quem inventou o rádio?

O italiano Guilherme Marconi havia demonstrado em 1901 a possibilidade da comunicação sem fio de longa distância ao transmitir pela primeira vez um sinal de rádio através do Atlântico Norte. Da Cornualha, ao sul da Inglaterra, um sinal de rádio (a letra S, em código Morse) é transmitida para o Canadá, e captada na Terra Nova.

Não há dúvida de que Marconi é o inventor do rádio, embora o mundo conheça pioneiros de talento como o padre brasileiro Roberto Landell de Moura, que em 1899, demonstrou publicamente a viabilidade do uso das ondas hertzianas, ao transmitir de sinais de áudio, em uma distância de 8 quilômetros, da Avenida Paulista à colina de Santana. O fato foi registrado pela imprensa da época, inclusive pelo jornal O Estado de S. Paulo. Incompreendido e acusado de ter parte com o demônio, o padre Landell não obteve apoio do governo brasileiro e quase foi excomungado pela Igreja Católica. Desencantado, foi para os Estados Unidos e lá registrou diversas patentes no US Patent Office.

Se você quiser saber mais sobre esse padre gaúcho e seus inventos, leia o livro do jornalista Hamilton de Almeida, Padre Landell de Moura, Um Herói sem Glória (Editora RCB). Hamilton mostra que o Padre Landell foi precursor da primeira transmissão de rádio, anterior à experiência realizada pelo italiano Guglielmo Marconi.

Como um Júlio Verne brasileiro, ele previu o nascimento e o futuro da televisão e vislumbrou até a possibilidade de comunicações interplanetárias –, ele continua a ser lembrado na memória da civilização. Para Hamilton de Almeida, cometeu-se “uma injustiça devastadora contra um grande talento nacional, cujo reconhecimento só tem ocorrido entre pequenos grupos acadêmicos e científicos”.

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Ethevaldo Siqueira é jornalista especializado em tecnologias digitais, editor do portalwww.telequest.com.br e comentarista da Rádio CBN (seção Mundo Digital). Escreveu durante 45 anos para Estado de S. Paulo, passando sucessivamente pelas posições de repórter, editor, repórter especial e colunista. Fundou em 1979 a RNT – Revista Nacional de Telecomunicações, publicação que dirigiu até 2001