Recentemente, a agência de notícias Bloomberg News foi acusada de autocensura na China, ao bloquear um artigo para não irritar o governo. Agora, um artigo do site Business Insider revela uma prática atípica também polêmica, que contribui para os bônus anuais de seus profissionais: pagar alguns de seus repórteres explicitamente para publicar matérias que movimentem o mercado.
Não se trata de uma prática comum no meio jornalístico. Muitos jornalistas não sabem sequer que ela é usada e muitos profissionais do mercado financeiro procurados pela repórter Julia La Roche, do Business Insider, ficaram preocupados que isso incentive repórteres da Bloomberg a alterar matérias com o objetivo específico de influenciar a movimentação dos mercados. Traders do mercado de ações reagem instantaneamente a manchetes e notícias, e suas decisões refletem na perda ou no ganho de quantias significativas de dinheiro.
Um porta-voz da Bloomberg justificou a prática e explicou como ela funciona: “Não é notícia a não ser que seja verdade. Nós nos esforçamos para ser os primeiros a reportar surpresas em mercados que mudam de comportamento e valorizamos a reportagem que revele as maiores mudanças em valor relativo em todos os ativos”.
Esse sistema de compensação foi mencionado em um artigo de Stephanie Clifford no New York Times em 2010, e em um outro de Jodi Enda, na American Journalism Review, em 2011. Este ano, foi novamente citado em um artigo no New York Times de Amy Chozick.
Um ex-funcionário da Bloomberg, que falou em condição de anonimato, confirmou que a Bloomberg News monitora esse tipo de matéria e que a prática acaba estimulando os repórteres a se importar com a movimentação do mercado. “Todo mundo que promove uma movimentação no mercado recebe um bônus. Sua equipe recebe prêmios”, afirmou a fonte.
Critérios de avaliação
Os bônus costumavam ser quase que totalmente ligados diretamente às vendas nos terminais financeiros da Bloomberg. Agora, metade deles também está ligado a sete ou oito métricas diferentes, como precisão e movimentação do mercado. Uma pessoa familiar com a prática de compensação diz que as preocupações são injustificadas, pois a precisão é a métrica mais importante nos bônus dos repórteres.
Houve alguns exemplos memoráveis nos quais matérias da Bloomberg influenciaram no mercado quando não deveriam. No dia 25/9, por exemplo, a Bloomberg News divulgou uma matéria na qual citava uma troca de emails entre um gerente de compras de um escritório do Wal-Mart e um fornecedor, revelando que pedidos estavam sendo cortados na medida em que mercadoria não vendida encalhava. As ações do Wal-Mart caíram 3% depois disso. Logo depois de a matéria ter sido publicada, um porta-voz do Wal-Mart afirmou à CNBC que a matéria inteira era enganosa e as ações voltaram ao normal.
No dia 13/11, foi publicada uma manchete ainda sob embargo nos terminais da Bloomberg sobre o testemunho da presidente do FED (o Banco Central dos EUA), Janet Yellen, no qual ela dizia que a performance econômica americana está muito aquém do seu potencial. Com a notícia divulgada ainda com mercados em funcionamento, os ativos de risco, como ações, o mercado do Tesouro e moedas sofreram impacto e houve uma liquidação acentuada do dólar. Quando os mercados de futuro foram fechados, a manchete dos terminais mudou para algo mais discreto, devido à reação do mercado. Quando traders leram a matéria por completo e perceberam que a fala de Janet era bem mais suave, o mercado voltou ao estado de antes.
Não há nada de errado com uma matéria que movimenta o mercado, pois significa que ela é importante. No entanto, compensar repórteres especificamente por impactar o mercado cria no mínimo a aparência de um conflito de interesses.