Não foi fácil chegar à Feira do Livro de Frankfurt, o principal evento do mercado editorial brasileiro em 2013. Três ministros passaram pela pasta da Cultura entre o Brasil aceitar, em 2010, o convite para ser o convidado de honra da feira – que custou R$ 18 milhões ao País – e sua realização em outubro: Juca Ferreira, Ana de Hollanda e Marta Suplicy. Mudanças também, este ano, no comando da Fundação Biblioteca Nacional, responsável pelos preparativos – saiu Galeno Amorim e entrou Renato Lessa. A lista dos 70 escritores da comitiva oficial gerou polêmica e foi acusada de racista. Ela incluiu apenas um escritor negro e um indígena e deixou de fora autores considerados menos literários, mas best-sellers, o que teria motivado a desistência de Paulo Coelho, um dos 70, de participar da festa. Sua ausência e a publicidade que ele fez dela também geraram burburinho.
Mas isso tudo foi antes. Em outubro, profissionais do mercado editorial e escritores foram em peso a Frankfurt. E a festa foi bonita. E engajada – a começar pelo discurso de abertura do escritor Luiz Ruffato, que deu o tom de todos os debates que ocorreram dentro e fora da feira. Ao contar sobre sua história e sobre sua relação com a literatura, ele acabou chamando a atenção para as mazelas brasileiras. Uns disseram que ali não era o Fórum Social Mundial. Muitos outros aplaudiram e apoiaram o escritor. Este foi o melhor momento da feira.
Enquanto o Brasil se apresentava na Alemanha, se assustava com o infarto que o cartunista Ziraldo sofreu lá e via sua literatura sendo exportada – por causa da homenagem, foram, pelas contas dos organizadores da feira, mais de 200 traduções de obras brasileiras –, uma questão cara ao mercado editorial vinha à tona: a das biografias. Foi durante a feira que o grupo Procure Saber apareceu.
Editoras e associações ligadas ao livro já acompanhavam, há tempos, a discussão e se mobilizavam para derrubar a obrigatoriedade de autorização prévia dos retratados e envolvidos nos livros. O firme posicionamento do mercado diante dessa questão e a ameaça de autores, que disseram não escrever mais, e editores que ameaçaram deixar de publicar o gênero caso nada mude, foram outra marca do ano. E em novembro, às vésperas da audiência pública no Supremo, por uma feliz coincidência, biógrafos e leitores se reuniam em Fortaleza para a primeira edição do Festival Internacional de Biografias. O evento virou, claro, palco de articulação política.
Dois mitos
Este foi um ano de protestos, e a Flip, realizada pouco depois do auge das manifestações que levaram o brasileiro às ruas, não foi poupada. A população de Paraty, com demandas diversas, fez passeata pela cidade até chegar à frente da tenda do evento. No palco, a questão também foi debatida – mas quando um manifestante tentou mostrar um cartaz, logo foi retirado.
E por falar em Flip, São Paulo ganhou um festival nos mesmos moldes da festa fluminense. Realizada pela Associação dos Advogados de São Paulo, a Pauliceia Literária, com forte inclinação para debater a literatura policial, trouxe importantes autores do gênero, como o americano Scott Turow, e prestou homenagem à Lygia Fagundes Telles que, numa manhã inspirada, encantou a plateia.
Ao contrário do que aconteceu em outros anos, não houve unanimidade dos júris na escolha dos melhores livros e vários autores foram reconhecidos. Entre os melhores romances de 2012 premiados em 2013, destaque para Barba Ensopada de Sangue, de Daniel Galera (Prêmio São Paulo), O Sonâmbulo Amador, de José Luiz Passos (Portugal Telecom), Deserto, de Luiz S. Krausz (Benvirá), e O Mendigo Que Sabia de Cor os Adágios de Erasmo de Rotterdam, de Evandro Affonso Ferreira (Jabuti). Dois autores estrangeiros queridos dos brasileiros também receberam importantes prêmios: a canadense Alice Munro ficou com o Nobel e o moçambicano Mia Couto, com o Camões.
O livro digital deixou de ser uma novidade e passou a fazer parte da rotina das editoras. Na USP, foi inaugurada a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, com a coleção de obras raras do casal.
Foi, também, um ano agitado na Academia Brasileira de Letras, com três eleições para imortais. Rosiska Darcy de Oliveira ficou com a cadeira de Lêdo Ivo; Fernando Henrique Cardoso com a de João de Scantimburgo e Antônio Torres com a de Luiz Paulo Horta. Ana Maria Machado deixou a presidência da entidade, e Geraldo Holanda Cavalcanti é o novo presidente.
Dos imortais aos mortais. O Brasil perdeu, este ano, uma de suas principais escritoras de livros infantis. Tatiana Belinky morreu em junho, aos 94 anos. A britânica Doris Lessing também se foi aos 94. Morreram, ainda, o crítico literário alemão Marcel Reich-Ranicki, o editor francês André Schiffrin e os escritores Alvaro Mutis, Elmore Leonard, Richard Matheson, Seamus Heaney, entre outros.
E o reaparecimento de dois mitos. O recluso escritor japonês Haruki Murakami saiu de casa para falar com estudantes em Kioto. E, diagnosticado com demência senil, o colombiano Gabriel García Márquez reapareceu na inauguração de um boliche no México e mostrou o dedo médio a fotógrafos.
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Os bons livros nacionais e os mais vendidos de 2013
O número de títulos lançados em primeira edição por editoras brasileiras em 2013 só será divulgado no ano que vem, mas se for parecido com o de 2012 ficará em torno 21 mil. Entre os melhores lançamentos em ficção brasileira, que podem figurar nas listas dos prêmios de 2014, destaque para Amanhã Não Tem Ninguém (Rocco), de Flávio Izhaki; Deserto (Benvirá), de Luiz S. Krausz; Esquilos de Pavlov (Alfaguara), de Laura Erber; e A Cidade, o Inquisidor e os Ordinários (Companhia das Letras), de Carlos de Brito e Mello. Destaque, também, para a edição de Toda Poesia (Companhia das Letras), de Paulo Leminski, que chegou às listas de mais vendidos, e Invenção de Orfeu (Cosac Naify e Jatobá), de Jorge de Lima. No ranking anual do Publishnews, site especializado em mercado editorial, porém, a realidade é outra. Há brasileiros no topo, mas suas obras são religiosas. São eles: o bispo Edir Macedo, com Nada a Perder Vol. 2 (Planeta, 849 mil exemplares), e padre Marcelo Rossi, com Kairós (Principium, 410 mil). Inferno (Arqueiro), de Dan Brown, é o terceiro, com 282 mil exemplares comercializados.
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Maria Fernanda Rodrigues, do Estado de S. Paulo