Vivemos em uma época contraditória. Tecnologias conectam o mundo, distribuindo dados científicos, estimulando a colaboração e acelerando as descobertas, ao mesmo tempo em que muitas empresas insistem em trancar suas descobertas em caixas pretas, como um iPhone.
O movimento pelos dados abertos é uma das principais ferramentas para combater esse enclausuramento da informação. Governos do mundo todo estão abrindo o acesso a suas bases de dados em busca de maior eficiência nos processos, combate à corrupção e mensuração do impacto de políticas públicas. O nosso, por meio da Lei de Acesso à Informação Pública, liberou o acesso aos dados do governo em um portal que, nos próximos três anos, deve abrir a consulta aos dados publicados por todos os órgãos do governo federal, além de dados de saúde pública, transporte, segurança, educação, gastos governamentais e processo eleitoral das administrações estaduais e municipais.
Algumas empresas inovadoras seguem o mesmo caminho. Informações corporativas estão se tornando mais fluidas, circulando pela economia à medida que empresas compartilham seus dados com seus parceiros comerciais e, até certo ponto, com seus consumidores. Essas informações, enriquecidas por agregadores de dados, que compilam grandes volumes de informações anônimas vindas de interações com websites e serviços de mídia social, podem gerar um progresso sem precedentes. Um bom exemplo está no GPS. Se ele não tivesse deixado os segredos militares, não estaria nos carros e telefones hoje, movimentando uma grande quantidade de negócios e empresas.
Dados abertos vão além do que é proporcionado pela internet hoje. Muito conteúdo, registrado em formas não textuais, pode ser compilado e administrado por máquinas, gerando uma inteligência inédita. Mapas, genomas, fórmulas químicas, matemáticas e científicas, práticas e resultados médicos, localizações geográficas e topográficas, pesquisa científica, dados financeiros e estatísticos são alguns exemplos.
Para quem tem medo que os dados compartilhados revelem segredos ou comprometam vantagens competitivas, a internet mostra que a abertura leva a exatamente o oposto: administrações mais saudáveis, transparentes, enxutas e acessíveis. Essas estruturas criam seus próprios sistemas regulatórios, que, como boa parte dos sistemas operacionais da rede, são mais resistentes e evoluem mais rápido que seus concorrentes fechados.
Benefícios vários
Abrir os dados não é um processo complexo nem caro, e pode gerar grande valor e economias. A consultoria McKinsey estimou que dados abertos podem gerar de US$ 3 trilhões a US$ 5 trilhões anuais em valor econômico em apenas seis setores: educação, transporte, bens de consumo, energia, saúde e finanças.
É uma transformação muito mais ampla do que pode supor nossa vã tecnologia. Ela pode levar a uma transformação completa do que se entende hoje por governança pública e privada, transformando-as em plataformas de transparência, acesso, compartilhamento e reutilização.
Para o cidadão e consumidor os benefícios são muitos: transparência, participação direta, serviços mais eficientes e novos conhecimentos gerados a partir de combinações de grandes volumes de dados. A mudança é tão grande que até parece fictícia. No entanto, nunca esteve tão próxima.
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Luli Radfahrer é colunista da Folha de S.Paulo