Na segunda-feira (27/1), ao retornar das férias, Juca Kfouri começou o seu comentário na rádio CBN com uma assustadora proclamação: “A Copa já começou!”.
Nossa! Faltam quatro meses e meio para o início oficial do certame quadrienal, muitos estádios sequer estão terminados, as obras complementares arrastam-se em ritmo de DNOCS, o que teria levado o mais veemente, acreditado e charmoso comentarista esportivo brasileiro a fazer tão arriscada constatação?
Juca Kfouri entende do riscado, entende de placares, gramados, rachas e ruas: os protestos contra a Copa no último fim de semana em diversas capitais são uma clara evidência da surpreendente antecipação. A convocação de uma reunião de emergência da Presidência da República com o núcleo barra-pesada do Executivo (ministérios da Justiça, Defesa, Esportes e a Secretaria Extraordinária para Grandes Eventos) revela que o governo acionou a luz vermelha. Não há como apagá-la. Até meados de julho.
É ainda mais preocupante a entrevista-bomba de Carlos Alberto Parreira, coordenador técnico da seleção brasileira no mesmo dia e à mesma CBN. Sossegado, quase reflexivo, sem apelar para qualquer recurso retórico – como é do seu feitio – o veterano técnico foi contundente. Sobretudo com as autoridades. A crítica ao atraso nas obras de infraestrutura é claramente endereçada às autoridades federais e de apoio explícito aos protestos populares.
O raro episódio nos remete aos tempos do estranhamento do treinador João Saldanha com o general-ditador Emílio Garrastazu Médici. Parreira não se restringe aos preparativos para a Copa, vai mais fundo e além ao mencionar o péssimo desempenho da economia. O ministro dos Esportes, Aldo Rebelo, treinado na escola do centralismo democrático, aceitará este desempenho autônomo e ousado de um preposto do governo?
Canção chata
Quem teve a maravilhosa ideia de trazer a 20ª edição da Copa do Mundo para o Brasil?
Foi um formidável triunfo pessoal do então presidente Lula da Silva, do ex-cartola Ricardo Teixeira, da CBF e do seu parceiro da Fifa, Joseph Blatter, para a alegria da mídia brasileira que enxergou no evento a oportunidade para faturar alto e tirar o pé da miséria.
Depois do parecer dos fiscais da Fifa condenando todos os estádios brasileiros, Orlando Silva, o então ministro dos Esportes, garantiu que o Brasil faria tudo o que fosse exigido para justificar a escolha do país-sede. Ricardo Teixeira foi taxativo: todos os estádios serão construídos ou reformados com os recursos da iniciativa privada.
E agora, Josés?
Quem segura o país e desativa o vulcão que começa a bufar? Só Lula é capaz de fazê-lo, só ele tem a habilidade, a criatividade e a credibilidade para acalmar os manifestantes e protestantes. Só Lula tem condições para dizer aos generais: “Segurem os seus radicais que eu seguro os meus”.
À mídia brasileira cabe um papel não menos importante – reverter a indignação, redirecionar o agito. Que seja com o Big Brother, com a Globeleza, com as quatro ou cinco eletrizantes telenovelas diárias, com as popuzadas dos programas de auditório ou com os garotos-propaganda da Friboi e da Tim.
Um caloroso abraço e uma epifania a duas vozes entoada por estes magos da comunicação – o bispo Edir Macedo e o cardeal-arcebispo D. Orani Tempesta – talvez diluísse os rancores e fúrias de um país inesperadamente exorbitante.
A mídia não inventou esta Copa, nem pariu Mateus, mas ao longo de sete anos embalou o país numa chatíssima canção de ninar, sem pés nem cabeça.
Chamem o Caetano!
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