Sob pressão internacional para abrir mão da gestão da internet em razão do escândalo de espionagem da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês), os EUA anunciaram ontem a decisão de transferir para um organismo multilateral a responsabilidade pela concessão de domínios e de endereços na rede mundial de computadores.
O anúncio é uma vitória dos países que pedem mudanças na governança mundial da internet para reduzir o poder americano sobre um mecanismo que ganhou caráter global.
A pressão aumentou depois que o ex-técnico da NSA Edward Snowden revelou a amplitude das ações de espionagem dos EUA, que atingiram milhões de pessoas ao redor do mundo.
Além de nações da Europa, o Brasil foi um dos países que defenderam de maneira contundente a necessidade de um sistema multilateral de administração da internet. “É o momento certo para começar o processo de transição”, disse o secretário assistente de Comércio para Comunicações e Informação, Lawrence Strickling.
O governo americano pediu que a Corporação para a Designação de Nomes e Números da Internet (Icann, na sigla em inglês) coordene a elaboração de uma proposta para a transferência para outro organismo da responsabilidade pelo sistema de nomes de domínio (DNS, na sigla em inglês).
Segundo o anúncio, a saída da Administração Nacional de Telecomunicações e Informações desse processo é o estágio final da privatização da gestão de domínios, iniciada em 1997.
Transição
A definição do modelo de transição, que será coordenada pela Icann, envolverá organizações como o Internet Architecture Board (IAB), Internet Society (Isoc), e a VeriSign, empresa que é contratada para desempenhar parte das atividades de concessão de endereços e domínios na rede, além de outros “atores globais”.
A intenção dos EUA é que o processo de transição esteja concluído até setembro de 2015, quando expira o contrato que a Administração Nacional de Telecomunicações e Informações tem com a Icann para realização dessas tarefas. Nesse período, a responsabilidade pela designação de DNS continuará com o governo americano.
Documentos divulgados por Snowden mostraram que empresas globais de internet com sede nos EUA foram obrigadas a entregar à NSA dados sobre as comunicações de seus clientes online.
Snowden também mostrou que a agência americana espionou alguns líderes mundiais, entre os quais a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel.
A questão da gestão dos domínios na internet será discutida em uma conferência sobre a rede mundial, prevista para ocorrer no Brasil, em abril. Há um mês, a União Europeia anunciou que defenderia durante o encontro a transferência da atribuição para a ONU ou para outro organismo internacional. Os EUA deram ontem o primeiro passo nessa direção.
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Cláudia Trevisan é correspondente do Estado de S.Paulo em Washington