O rádio, este senhor que completa 87 anos, teve sua primeira transmissão oficial nas comemorações do centenário da Independência do Brasil, em 1922, no Rio de Janeiro. Em 20 de abril de 1923, Edgard Roquette-Pinto, considerado o ‘pai do rádio brasileiro’, inaugurou a primeira emissora oficial de rádio no país, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, atual Rádio MEC, com o objetivo de difundir a cultura e a educação no Brasil. Ele foi o primeiro a perceber a importância do rádio como a forma de comunicação popular e democracia cultural em nosso país. Roquette-Pinto imaginou uma programação de rádio educativa, dedicada a finalidades científicas e sociais. E, com o lema ‘Pela cultura dos que vivem em nossa terra, pelo progresso do Brasil’, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro iniciou suas transmissões no dia 1° de maio do mesmo ano.
Muitos dos que assistiram aquela transmissão de 7 de setembro se tornaram entusiastas do veículo e fundaram outras emissoras pelo país. E assim, as emissoras de rádio foram proliferando pelo Brasil afora, chegando aos lugares mais remotos, onde as pessoas nunca tinham ouvido falar daquela ‘caixinha mágica’.
Na década de 20, as emissoras eram mantidas por sócios, através de mensalidades. Por isso, muitas receberam os nomes de Rádio Sociedade ou Rádio Clube. O ano de 1925 marca o início do caminho da educação ligada ao rádio. ‘Começaram as transmissões de aulas de geografia, história do Brasil, higiene, aulas de português, francês, história natural, física e química. Estava implantado o embrião do que, no futuro, viria a se transformar no Projeto Minerva’ (Rádio MEC).
A chegada da televisão
Somente na década de 30, as rádios passam a ter caráter comercial, através de um decreto assinado pelo então presidente Getúlio Vargas. E foi a partir daí que a arrecadação financeira dos associados foi substituída pela contribuição financeira dos anunciantes. Vieram então os programas de auditório e o rádio iniciava sua fase espetacular, com programas de auditório e, mais tarde, de radionovelas e esportes.
As décadas de 40 e 50 são consideradas a ‘época de ouro do rádio’, com grandes apresentações de orquestras, radioteatro, concursos de calouros e de cantores, além dos programas de auditório. Em 1941, é veiculada a primeira radionovela, Em Busca da Felicidade, pela Rádio Nacional. No mesmo ano, também na Rádio Nacional, surge o Repórter Esso, principal veículo de informação sobre os fatos internacionais, sobretudo a Segunda Guerra Mundial.
Na década de 60, o rádio perde seu elenco para a televisão. Apesar de inaugurada em 1950, a TV só passa a fazer frente ao rádio a partir dos anos 60. Desde então, o rádio se reinventa para sobreviver. O rádio AM assume as características atuais. No lugar dos programas de auditório, aparecem programas de variedades comandados por locutores de boa voz e excelente estilo comunicativo. Também nos anos 60, o rádio FM (cuja primeira transmissão experimental foi em 1955) ganha força em regiões mais desenvolvidas (Sul e Sudeste), seguindo o formato musical. No repertório se encontravam a chamada música ambiente (orquestrada, mas sem compromissos eruditos), música romântica e música clássica.
Primeira emissora all news
Já nos anos 70, com o avanço das emissoras musicais FMs, o rádio AM passa a ser considerado ‘brega’. Durante esta década, o rádio FM começa a adotar diferentes perfis através da segmentação musical.
Na década de 80 esta segmentação se torna mais contundente, através de estilos musicais diferentes: rock, light, MPB, pop e jazz. O rádio AM seguia com programas de utilidade pública e prestação de serviços à comunidade, mas as primeiras comparações entre o som estéreo do FM e o áudio mono do AM começam a pipocar.
Na década de 90, as emissoras de rádio AM começam a ser compradas por grupos religiosos dos mais diversos, desde a Igreja Católica e diversas Igrejas Evangélicas, até algumas que investem numa programação do tipo ‘sai capeta’. Em 1° de outubro de 1991, surge a primeira emissora all news, a CBN. Também nesta década, o movimento das rádios comunitárias se mostra uma alternativa à tendência de formação de grandes redes nacionais, que concentram a produção radiofônica nos grandes centros e a reproduz para as afiliadas da rede por todo o país, perdendo o caráter local do rádio e dando lugar ao global, sem levar em conta diversidades, regionalismos e a multicultura.
Uma ‘mina abandonada’
Nos primeiros anos do século 20, surgem as primeiras emissoras de rádio transmitidas pela internet. E uma nova tecnologia é discutida a favor do rádio: a transmissão digital, que ainda não saiu do papel. Com esta tecnologia, o som do rádio AM será tão bom quanto o do FM e poderá dar um novo fôlego ao veículo.
Apesar de sua morte ter sido anunciada várias vezes durante esses anos, o rádio continua provocando encantamento para quem o escuta. Ainda hoje, o rádio continua sendo um dos principais veículos de informação e credibilidade da população, além de ser, para muitos, o companheiro fiel de todas as horas. Porém, é um instrumento de cidadania subutilizado.
Atualmente, pouco ou nada se faz pela educação através das ondas do rádio, propósito pelo qual foi idealizado. Nem mesmo todas as rádios educativas se prestam a este papel. Muitas estão mascaradas pelo rótulo de educativas, mas operam como emissoras comerciais. Falta fiscalização. Falta comprometimento.
Falar das emissões contemporâneas é assunto não desejado entre aqueles que acompanharam as gloriosas histórias do rádio no Brasil. Há uma unanimidade em proclamar a decadência das programações, muitas vezes, atribuídas aos donos das emissoras que não querem investir e que, na maioria das vezes, são leigos em rádio.
Quando o cineasta Peter Bogdanovich, numa entrevista que fez com o também cineasta Orson Welles (aquele da famosa irradiação de Guerra dos Mundos), lhe pergunta: ‘E o rádio de hoje?’, Welles responde: ‘O rádio de hoje é uma mina abandonada.’ Orson Welles tem razão (BARBOSA, 2004, p. 137).
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Professora universitária, jornalista e radiomaker, Juiz de Fora, MG