Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Critérios de noticiabilidade em xeque

Há décadas, o esporte é muito mais do que uma simples forma de interação social. Seu caráter lúdico e sua capacidade de suscitar paixões foram muitíssimo bem cooptados em benefício dos interesses mercadológicos. Que o digam as emissoras de televisão. Atualmente, os direitos de transmissão de determinadas competições esportivas são negociados a preço de ouro – as Olimpíadas de Londres, por exemplo, foram adquiridas pela Record por R$ 60 milhões. Até aí, nenhuma novidade: coisa normal do capitalismo. O assunto ganha outros contornos quando as grades de programação passam a pautar a própria lógica de funcionamento do esporte. Foi o que aconteceu com a maior competição de voleibol nacional: a Superliga.

A temporada 2013/2014 começou com uma novidade: a diminuição dos sets das partidas de 25 para 21 pontos. A mudança foi implantada pela Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), com o aval de Federação Internacional de Voleibol (FIVB) – leia­se Ary Graça e seu staff. Apesar de não estar explicitado entre os motivos oficiais da mudança, a diminuição do tempo de jogo foi uma reivindicação da Rede Globo, detentora dos direitos de transmissão. É o tempo do esporte que se adequa à sua grade de programação – não o contrário. Isso pode ser confirmado no Manual de Normatização de Ginásios e Transmissões, da CBV. O ponto 7, que trata do Protocolo do Evento, diz: “Flexibilidade nos horários: em função de o SporTV ser um canal com muitos eventos ao vivo, em certas ocasiões é possível que ocorra um atraso no início do jogo”.

Outro aspecto curioso relacionado à detenção dos direitos de transmissão diz respeito aos próprios critérios de noticiabilidade jornalísticas: tais critérios são reconfigurados em função do direito ou não de transmissão. Recentemente, o jornalista Lúcio de Castro, da ESPN, produziu o “Dossiê Vôlei”, que revelou a existência de transações volumosas entre a CBV e empresas recém­abertas. Entre os donos, um ponto em comum: todos eram ex­funcionários da Confederação. A revelação levou à renúncia de Ary Graça, que estava licenciado do cargo desde setembro de 2012. A partir da denúncia de Lúcio, outros jornalistas da emissora se dedicaram à investigação de outras irregularidades. No canal esportivo privado da Globo – e nos próprios programas jornalísticos da TV aberta –, apenas alguns poucos minutos dedicados ao tema.

Em sua coluna no O Globo de domingo (30/3), Renato Maurício Prado sugere um possível envolvimento dos ex­funcionários da CBV na própria negociação dos direitos de transmissão. “Uma pergunta que não quer calar: como são negociados os milionários direitos de transmissão de TV da FIVB? Por uma empresa? De quem? Pertencerá a alguém próximo de Graça, como Azevedo e Pina?”

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João Pedro Soares e Rafael Bolsoni Bastos são estudantes