CRISE POLÍTICA
E, agora, o que dirá Época? 29/3/2006
‘A revista ÉPOCA e dois de seus repórteres enfrentam o mesmo dilema do New
York Times e sua repórter Judith Miller há alguns meses: será correto colocar
acima da lei a proteção a uma fonte e, em nosso caso, mesmo se tratando de uma
lei protetora dos direitos da cidadania?
A descoberta de toda a cadeia ilegal, que se formou para violar o sigilo
bancário do caseiro Francenildo, não exime a responsabilidade de quem divulgou
(ou ‘vazou’, na linguagem metida a elegante que o Governo prefere usar) um
documento protegido pela Constituição brasileira.
Marcelo Neto, ainda desaparecido no momento em que escrevo esta coluna, pode
encerrar o assunto reconhecendo que foi o motoboy do pequeno papel que derrubou
o ministro da Fazenda e o presidente da Caixa. Mas insisto que o debate sobre o
dilema não se encerra, mesmo com uma confissão.
A maioria dos comentários à minha coluna anterior revela ser bem provável que
a maioria dos profissionais de comunicação acredite caráter absoluto do direito
de proteger a fonte. Mas não existe direito nem poder absoluto na democracia,
cuja segurança exige equilíbrios e contrapesos. Judith Miller foi condenada nos
Estados Unidos não por se recusar a revelar sua fonte, mas porque sua fonte
havia cometido um crime e estava consumando esse crime com a divulgação do nome
da agente pelo jornal; o estafeta de Palocci também estava consumando, através
do ‘vazamento’, o crime de violar o sigilo bancário do caseiro. O editor e os
repórteres de ÉPOCA tinham o dever de não aceitar a cumplicidade nesse crime
(quando publicaram o extrato sem ouvir Francenildo) e revelar o nome do
informante.
Mas isso é apenas minha opinião que transformei em proposta de debate à ABI,
com a participação de jornalistas, da Associação Brasileira de Magistrados, da
Associação do Ministério Público e da Ordem dos Advogados. A lei é a única base
aceitável para a organização da sociedade. E, numa república democrática, a lei
só pode ser aceita por todos se for justa, sem acobertar privilégios.
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Cada vez mais animada a briga no Rio
Um novo tablóide – O Expresso da Informação, ou simplesmente O EXPRESSO – foi
lançado pela mesma empresa de O GLOBO e EXTRA nesta segunda-feira, 27/3, com a
missão clara de enfrentar o MEIA HORA (lançado por O DIA). A circulação de MEIA
HORA, segundo informações de seus editores, atingiu 120 mil exemplares (100 mil
no Rio e 20 mil no interior). Visitei 15 bancas na área do bairro da Tijuca
(classe média). A média do reparte do EXPRESSO tinha sido aproximadamente um
terço de MEIA HORA e em seis delas o jornal estava esgotado.
Uma fonte de O GLOBO disse que o sucesso de MEIA HORA demonstrara a
existência de um grande número de leitores incorporados ou reincorporados ao
mercado pelo preço de 50 centavos. E que esse foi o principal motivo da decisão
em favor do lançamento do EXPRESSO. Diferentemente de seu adversário, O EXPRESSO
não circulará sábados e domingos.
O DIA apresentou nesta terça, 28/3, em um café-da-manhã para políticos,
publicitários e jornalistas, o projeto do novo design do jornal que será lançado
no dia 2 de abril. Todos os novos colunistas (Boechat, Noblat, Milton Cunha,
Dácio Malta e outros) estavam presentes, bem como parentes de Nelson Rodrigues,
cujas colunas ‘A vida como ela é’ serão republicadas aos domingos e segundas.
Gigi de Carvalho, a diretora-presidente do jornal, na apresentação do
projeto, disse que O DIA está numa luta contra o monopólio da informação. Não
mencionou explicitamente o grupo GLOBO, mas deixou claro a quem se referia em
sua crítica.
E Hélio Tuchler, diretor-executivo do JORNAL DO BRASIL confirma que o jornal
passará a ter formato tablóide e muitas novidades a partir de 9 de abril. Mas
não revelou nomes nem idéias incluídas nessas ‘muitas novidades’.
Portanto, a partir do dia 10, o Rio terá três títulos disputando o mercado
dos chamados ‘jornais de qualidade’. Algo de bom numa cidade que produz tanta
notícia ruim.
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Frase para Palocci pensar
‘Sem perdão não há futuro, mas sem confissão não pode haver perdão’. Bispo
sul-africano Desmond Tutu.’
Carlos Chaparro
Jornalismo acima da lei, 31/03/06
‘O XIS DA QUESTÃO – Os responsáveis pela revista Época morderam
apetitosamente a isca que lhes foi oferecida, em jeito de furo, pelos
‘estrategistas’ de comunicação do Ministério da Fazenda. Sem as prudências que o
caso aconselharia, os jornalistas de Época vilipendiaram um dos direitos
constitucionais da cidadania. E depois do estrago feito, faltou à revista
coragem para pedir desculpas públicas ao caseiro que teve sua vida privada
devassada.
1. Ação desastrada
Pesquisas que tenho realizado nos últimos anos me permitem dizer que, em pelo
menos 90% do noticiário que os jornais (impressos e eletrônicos) espalham ao
mundo, o que se socializa pela notícia, e com a notícia, são ações táticas de
sujeitos sociais organizados, que sabem muito bem o que querem, o que fazem, o
que dizem, e por que razões. Atrás dessas ações táticas, a controlá-las, há
estratégias mais ou menos competentes. E que, por nem sempre serem competentes,
também nem sempre conseguem realizar ações táticas bem sucedidas.
Temos aí, como exemplo de desastre tático, a escandalosa história que
envolveu o caseiro Francenildo dos Santos Costa, o hoje famoso Nildo. Afinal, o
que pretendiam os ‘estrategistas’ do Ministério da Fazenda, ao entregarem à
apressadinha Época o extrato obtido ilegalmente? Atingir em cheio, com um só
petardo (e que petardo!), a imagem e a credibilidade do caseiro que,
corajosamente, resolvera dizer ao País que o ministro Palocci mentia, quando
negava ter freqüentado a tal mansão da ‘República de Ribeirão Preto’. Para
desqualificar o depoimento, sugeria-se à Nação que o caseiro poderia estar sendo
financiado pela oposição.
Para conseguir isso, os ‘estrategistas’ trapalhões do Ministério da Fazenda
usaram a Época como canhão de disparo, aproveitando-se de certos enlaces
pessoais que, circunstancialmente, favoreciam a circulação criminosa do extrato
entre os gabinetes ministeriais e a redação de Época. E ofereceram à revista o
bombástico ‘furo’, servido na bandeja da exclusividade.
Os responsáveis pela revista Época morderam apetitosamente a isca. Pouco se
preocuparam com a avaliação ética e deontológica do seu envolvimento na
criminosa operação. E sem prudências que um caso desse porte aconselharia,
cuspiram em um dos preceitos constitucionais de proteção aos sigilos da vida
privada – direitos que tantas lutas exigiram para conquistar e consolidar, e
sobre os quais assenta, em boa parte, a noção de democracia que ilumina a
consciência cívica dos ideários brasileiros.
2. Bisbilhotice castigada
Época não foi propriamente usada. Deixou-se usar, sabendo do jogo sujo em que
estava entrando.
A decisão editorial de tornar pública a conta bancária de Francenildo, com as
imprudências que apressaram tal decisão, teve claras motivações comerciais.
Vislumbrava-se, apenas, a ‘surra’ a ser dada na concorrência. Mas quem assim
agiu não levou o barco a bom porto. À semelhança do acontecido com os
‘estrategistas’ ministeriais, duramente atingidos pelos efeitos contrários da
‘ação tática’ de bisbilhotar e espalhar ao mundo o extrato obtido (todos caíram
em poucos dias), também a revista ficou exposta em suas precariedades éticas.
Pode, até, ter conseguido aumentar a tiragem daquela semana e vender todos os
exemplares. Mas o prejuízo moral foi certamente maior que o eventual lucro
material.
Incendiado pela criminosa divulgação do extrato, o escândalo político
tornaria inevitável a queda do ministro da Fazenda, e disso se ocupava, por
inteiro, a discussão pública nacional, naquela semana. Mas, na edição seguinte
da revista, com data de capa de 27 de março, o assunto nem uma reles chamadinha
de primeira página mereceu. E a matéria publicada no miolo da edição tinha tom e
sabor de fuga à pauta do escândalo.
Ou seja: Época meteu o rabo entre as pernas, como se nada tivesse a ver com o
assunto. Faltou à revista, e aos seus responsáveis, coragem para fazer o que, no
mínimo, se esperaria de uma publicação comprometida com os deveres éticos do
jornalismo: pedir desculpas públicas ao caseiro que teve seus direitos
vilipendiados.
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A propósito, é sempre bom lembrar que os jornalistas não são cidadãos
diferentes nem estão acima da lei.’
ÉTICA PROFISSIONAL
Câmeras ocultas no Seminário de Ética, 27/03/06
‘Estou a caminho de Londrina no Paraná. Fui convidado a participar do
Primeiro Seminário Nacional de Ética no Jornalismo promovido pela FENAJ (ver
aqui). O objetivo do evento é discutir a ética na produção jornalística e o
impacto das novas tecnologias. Diversos painéis e grupos de trabalho também irão
analisar os novos conceitos de jornalismo, propor uma revisão do Código de Ética
do Jornalista e debater a formação ética nas escolas de Jornalismo do Brasil.
Devo participar do painel ‘Análise Crítica dos métodos e técnicas da imprensa
– dilemas éticos’ na sexta-feira, dia 31, às 14 horas, com o professor Francisco
Karam, da Universidade Federal de Santa Catarina.
Em relação às novas tecnologias, logo na introdução, pretendo propor ao
público algumas questões éticas sobre a utilização de câmeras ocultas no
jornalismo investigativo da televisão brasileira:
Quantos de vocês acreditam que um jornalista deve dizer a verdade?
Quantos utilizariam uma câmera oculta?
É admissível que um jornalista possa mentir para obter uma verdade?
‘Até que ponto é válido e com quais critérios se deve utilizar uma câmera
oculta para obter uma informação’?
Crime
Minha tese é simples: câmeras ocultas obrigam o jornalista a mentir. E para
quem não sabe, falsa identidade é crime previsto em lei. Repórter que se passa
por outra pessoa, além de enganar a fonte, trair princípios éticos, também
comete crime previsto no artigo 307 do Código Penal.
Além disso, no atual Código de Ética da profissão sobre a Conduta
Profissional do Jornalista, o Art. 9° diz que: É dever do jornalista, VII –
respeitar o direito à privacidade do cidadão. Acrescento: qualquer cidadão!
Jornalista não é polícia, não é juiz, não está acima da lei, nem é dono da
verdade:
‘A verdade não pertence ao jornalista que apenas recebe um mandato da
sociedade para procurar os fatos e até certos privilégios éticos para executar
esse mandato’.
Mas, apesar de tantas controvérsias, alguns críticos insistem na necessidade
absoluta das câmeras ocultas:
‘Exceto para os radicais de carteirinha, ficou suficientemente clara a
sustentação desse recurso quando o meio está amparado pela necessidade de
defender a sociedade, combatendo em nome dela forças poderosas que a
subjugam’.
‘A câmera oculta, portanto, é hoje tão indispensável para o jornalista quanto
o telescópio foi para Galileu Galilei e o microscópio para Antonie van
Leeuwenhoek.’
‘A discussão sobre a câmera oculta é uma unanimidade no mundo: deve ser
empregada’.
Discordo.
Primeiro, câmeras ocultas não são indispensáveis. Temos ótimos exemplos de
jornalismo de qualidade na televisão, como o documentário independente ‘Falcão,
Meninos do Tráfico’, que não se utiliza desse recurso duvidoso.
E quanto à unanimidade no mundo, nos EUA as câmeras ocultas foram moda nos
anos 90. Mas, após inúmeros casos judiciais e o pagamento de enormes
indenizações por parte das emissoras de TV, a situação mudou. Hoje, há uma
legislação rigorosa e pelo menos 12 estados americanos simplesmente impedem a
utilização de câmeras ocultas em lugares privados.
Segundo relatório publicado pela Radio and TV News Diretors Association,
Hidden Cameras, Hidden Microphones, câmeras ocultas deveriam ser somente
utilizadas após terem sido esgotadas todas as opções tradicionais, como último
recurso em uma investigação jornalística e limitadas a situações consideradas de
vital interesse público.
E sobre a falsa identidade ou quaisquer outros métodos para obter uma boa
matéria, A. M. Rosental, ex-editor do NYT, é categórico:
‘Exigimos os direitos e os privilégios da Primeira Emenda [dispositivo que
garante a inviolabilidade da liberdade de imprensa nos EUA] e depois assumimos
papéis dúbios, fazendo-nos passar por pessoas diferentes daquilo que somos.
Dizer que assim se consegue uma história melhor ou que se serve melhor o
público, não muda nada. Ainda está errado’.
Ou seja, boas reportagens não podem justificar a utilização de métodos
duvidosos e antiéticos. Antes de tudo, não podemos esquecer que:
‘Mentiras traem a confiança depositada pela sociedade no trabalho do
jornalista’.
Disfarçar-se para obter informações é um método inaceitável de fazer
jornalismo e um repórter não pode tornar-se criminoso para denunciar um
criminoso. A imprensa não pode e não deve cometer crimes a pretexto de denunciar
outros.
Recordar é viver
Há alguns anos, numa discussão acalorada sobre câmeras ocultas com um ex
editor-chefe do JN da Globo durante seminário semelhante, afirmei: ‘Sou contra.
Eu não usaria’. Sem hesitar, ele rebateu: ‘Então, eu te demitiria’.
Jamais esqueci. Fiquei pensando nos colegas cinegrafistas e nos jornalistas
mais jovens diante do mesmo dilema. O que fazer? A quem recorrer?
Também me lembrei de algumas situações emblemáticas. Logo nos primeiros anos
da utilização de ‘câmeras ocultas’ pela TV brasileira, uma das minhas ex-alunas
de jornalismo foi convencida a portar a novidade, a câmera oculta em uma série
de reportagens investigativas.
A pauta era fantástica: gravar cenas inéditas de uma clínica de abortos na
Zona Sul do Rio de Janeiro. Fiquei chocado e constrangido. Assim como as drogas,
na falta de leis apropriadas, convivemos tranqüilamente com mais uma dessas
ilegalidades tão convenientes.
Como era de se esperar, a matéria fez o maior sucesso. Foi o documentário
‘Falcão, Meninos do Tráfico’, da época. A seqüência também era previsível. No
dia seguinte, a polícia resolveu mostrar serviço. Invadiu a clínica, prendeu em
flagrante médicos, enfermeiras, funcionários e as mulheres constrangidas que se
encontravam no local do ‘crime’. Fiquei ainda mais horrorizado. Tive vergonha da
minha profissão e muita pena de todos os envolvidos. Principalmente das mulheres
em situação tão constrangedora e delicada. Afinal, quem entre nós não recorreu
aos serviços dessas clinicas ou não conhece gente próxima que tenha feito um
aborto ilegal? Então era para isso que estávamos utilizando as tais câmeras
ocultas? E no futuro, quem seriam as próximas vitimas?
Além das questões éticas, também me preocupava com a decisão de enviar
jornalista jovem, inexperiente, querendo mostrar serviço a qualquer custo para
reportagens tão perigosas. Na época, a justificativa para mandar a garotada era
uma necessidade estratégica. Os jornalistas mais velhos e experientes seriam
facilmente reconhecidos pelo público. Os jovens repórteres ou os velhos
produtores seriam mais apropriados para essa tarefa. A tragédia era previsível.
Em artigo com o título premonitório de ‘Câmeras ocultas, a próxima vítima
pode ser você’, publicado meses antes da morte do produtor de TV Tim Lopes,
advertia sobre os riscos dessa nova tecnologia e da necessidade de discutirmos
melhor sua utilização e seus limites.
Também temia o poder dessa arma tão poderosa na mão de jornalistas e
empresários inescrupulosos. Recordava o período de lua-de-mel entre a ditadura e
o telejornalismo brasileiros. Naquela época, reuniões subversivas também eram
consideradas atividades criminosas. Essa tecnologia tão poderosa demanda
regulamentação e respaldo legal. Afinal, nem mesmo a polícia tem direito de
ouvir ou gravar conversas telefônicas, quebrar o sigilo de contas bancária ou
invadir residências e escritório sem mandato judicial. O jornalismo, nem mesmo o
jornalismo de emissora hegemônica, está acima da lei.
Infelizmente, após tantos anos, a questão principal ainda persiste. Para mim,
câmeras ocultas, matam jornalistas, obriga-os a mentir e ameaçam a ética da
profissão. Sem controle independente e legal, esse método é um atalho
sensacionalista, preguiçoso e arriscado que não deveria substituir jamais a
verdadeira investigação jornalística. Jornalismo de verdade custa caro e dá
muito trabalho.
O difícil é parar de mentir
O debate promete esquentar em Londrina. As propostas levantadas durante o
Primeiro Seminário de Ética no Jornalismo serão apresentadas para debate e
aprovação no Congresso Nacional dos Jornalistas, em julho, em Ouro Preto.
Nesse seminário, deveríamos exigir critérios claros e socialmente
justificáveis para utilizar novas e poderosas tecnologias como a câmera oculta.
Aproveito a oportunidade para fazer algumas propostas recomendações:
* Estabeleça e divulgue regras claras sobre a utilização das câmeras ocultas
para toda a redação.
* Não mande um jornalista inexperiente utilizar uma câmera oculta.
* Todos os jornalistas têm o direito de não utilizar câmeras ocultas sem
serem demitidos.
* Tenha sempre um jornalista mais experiente monitorando as investigações com
câmeras ocultas.
* Avalie diariamente as fitas gravadas e consulte as comissões de ética na
redação.
* Um advogado também deveria avaliar regularmente essas investigações.
* Jamais corra para dar um furo e colocar no ar as imagens obtidas com
câmeras ocultas. Procure ter certeza das conseqüências legais, éticas e
pessoais.
* Câmera oculta é o último recurso. Dê preferência às técnicas tradicionais e
faça jornalismo de verdade.
* O público tende a duvidar dos verdadeiros objetivos dos jornalistas e das
câmeras ocultas.
* Em caso de dúvidas, não arrisque. Nenhuma reportagem vale a vida de um
profissional ou transgressões éticas.
O seminário de Londrina propõe uma nova ética para uma nova modernidade. Pode
ser. Prefiro pensar que a ética verdadeira transcende os tempos, as profissões e
as inovações. Hoje, na era das novas tecnologias, o instinto da verdade não é
necessariamente menor ou menos fundamental para a sobrevivência da nossa
profissão.
Não devemos cair na tentação de permitir ou justificar ‘mentiras para
mentirosos, mentiras em nome da verdade ou mentiras moralmente necessárias’.
Mentira é sempre mentira. Em tempos de câmeras ocultas, denúncias recorrentes e
ministro no inferno, também sabemos que é muito fácil mentir. O difícil é parar
de mentir.’
JORNALISMO ECONÔMICO
O brasileiro já vai para o espaço há muito tempo, 3/4/06
‘O que você faria se tivesse disponíveis US$ 10 milhões? É muito dinheiro,
mas a pergunta, antes que você responda, tem complementação: O que você faria se
tivesse US$ 10 milhões e fosse presidente do Brasil? Bem, certamente a resposta
levaria em conta várias carências que tem o País. Certamente haveria uma lista
de prioridades ligadas, por exemplo, à área social. Com toda certeza, você não
colocaria entre essas prioridades patrocinar uma viagem ao espaço sem propósito.
Tudo isso é para dizer que o Brasil, definitivamente, não precisava gastar essa
dinheirama para mandar alguém para esse passeio à estação orbital.
É preciso deixar claro que não sou especialista em assuntos espaciais e que o
coronel Marcos Pontes está na dele. Ele está sim fazendo história e está
definitivamente na história do Brasil. Mas a pergunta é: o que o Brasil e os
brasileiros levam com isso? A não ser pelo fomento extraordinário que os estudos
em torno do assunto terão a partir desse feito, com estudantes e escolas
discutindo as coisas do espaço e a ciência em si, não há mais nada a se
comemorar. O coronel levou oito experimentos que poderiam, criadas as condições,
serem feitos aqui mesmo. Os experimentos são simplórios, não levarão a ganho
científico algum.
A intenção, me parece, é tentar dar ao Brasil visibilidade internacional,
quem sabe atrás do famigerado assento no Conselho de Segurança da ONU (um
esforço desmedido que também não levaria o Brasil a nada, a não ser acompanhar
os votos americanos). A visibilidade que o Brasil precisa é o de País livre de
crianças nas ruas, de País com todas as crianças na escola, de País livre da
fome e da miséria, para usar um tema tão importante e tão citado pelo presidente
Lula.
É muito caro mandar um homem ao espaço com um punhado de experiências que se
assemelham ao que estudantes fazem em feiras de ciências. Se há países que se
dão a esse luxo, ótimo, eles que patrocinem as coisas espaciais. A própria
postura do nosso astronauta na viagem de ida dava a exata dimensão da sua
importância na missão. Enquanto os outros estavam compenetrados, estudando
relatórios, ele ficava dando tchauzinho para a câmara e mostrando a bandeira do
Brasil.
Fico pensando o número de casas populares, ambulâncias e crianças que
poderiam se beneficiar de uma grana dessas. Pior, fico imaginando o quanto o
Brasil não desperdiça. Enfim, embora essa não seja uma questão propriamente
econômica, me incomoda a forma ufanista como a maioria da imprensa tratou o
assunto. Se o Brasil tem um programa espacial, se tem pesquisas nesse campo, por
que não carrear o dinheiro para esses canais então? Acredito que os avanços
poderiam ser maiores e os benefícios, em termos de aplicação dos ganhos,
maiores.
Outro propósito, talvez, seja capitalizar votos e tentar mostrar que o
governo foi o primeiro a mandar um brasileiro para o espaço, como se não
fizessem isso todos os dias, quando agem de forma desleixada nas questões
verdadeiramente prioritárias. Afinal de contas, o brasileiro já vai para o
espaço há muito tempo, há muitos governos. O que se espera é os governantes
saiam de órbita e de pés no chão tomem medidas muito mais próximas de nossa
realidade.’
CRÔNICA ESPORTIVA
O preço da macaquice, 28/03/06
‘Olá, amigos. Neste fim de semana o que dominou a crônica esportiva foi a
utilização de meios eletrônicos pela arbitragem do clássico Palmeiras 1 x 1
Corinthians no último domingo. A melhor definição, a meu ver, foi dada por
Alberto Helena Jr. Para ele, a falha sempre será humana, já que a máquina está
ali para ser usada e, se o for corretamente, dará sempre os resultados
esperados.
A confusão se deu, unicamente, porque o bandeirinha que teria visto uma falta
de Tevez em Leonardo Silva decidiu comunicar pelo brinquedinho novo ao invés de,
como sempre fez em sua carreira, levantar a bandeira. Tivesse ele feito isso,
não haveria confusão nenhuma, já que Tevez sequer teria tempo de fazer o golaço
que fez.
Não acho que se deva bombardear a tecnologia, que a meu ver é o caminho
inevitável de um esporte que movimenta bilhões de dólares por ano. Deve-se, sim,
bombardear a macaquice de se imitar uma novidade vinda da Europa sem os devidos
testes e treinamentos aos que a utilizariam. Por que se colocar uma novidade
tecnológica justamente em um clássico?
Autopromoção da Federação Paulista de Futebol? Excesso de confiança ou
vontade de se mostrar moderno? Não sei a resposta, mas o resultado da
precipitação (para se dizer o mínimo) foi catastrófico.
******
A diferença entre os campeonatos paulista e carioca se torna cada vez mais
humilhante para os times e a Federação de Futebol do Rio de Janeiro e seus
afiliados. Como podem dirigentes virem a público dizer que a culpa de toda a
vergonha que se vê nos campos cariocas é da imprensa, que joga os dirigentes
contra a torcida? Nem vou entrar no mérito de quem contrata jogadores e quem os
vende. Prefiro analisar sob outro prisma: O que temos para noticiar? Golaços?
Triunfos? Títulos de expressão e grandes craques em campo? Se for isso, a culpa
realmente é nossa. Não sendo, me desculpem incompetentes, mas a culpa é de
vocês, que dirigem o futebol diferentemente do que dirigem suas casas e suas
empresas.’
WEBJORNALISMO
Os quatro canais de conteúdo do celular, 28/03/06
‘Na última semana, a newsletter BehavioralInsider, do site MediaPost, trouxe
uma entrevista com Tom Burgess, CEO da Third Screen Media, empresa de
publicidade voltada para o meio online. A entrevista, feita pelo jornalista Phil
Leggiere, focou nas possibilidades de anúncios nos telefones celulares e
mostrou, indiretamente, o quanto as telinhas estão cada vez mais preparadas para
o conteúdo noticioso.
Segundo o artigo, hoje em dia, em um universo de cerca 160 milhões de
telefones celulares com acesso a Internet nos Estados Unidos, mais de 20 milhões
de norte-americanos surfam regularmente na Web usando esses dispositivos e,
desses, cerca de 5 milhões possuem aparelhos capazes de receber vídeos. De
acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), aqui no Brasil estão
em circulação cerca de 87 milhões de aparelhos (dados de fevereiro desse ano).
Um número relativamente baixo se comparado aos dos Estados Unidos. No entanto,
segundo a agência, o número de usuários de telefones celulares no país cresceu
31% nos últimos 12 meses.
Com base nos números promissores, a tendência é que o campo de conteúdo móvel
se desenvolva. A cada dia, novos telefones celulares voltados para uma navegação
mais confortável e com suporte a alguns padrões do meio online convencional são
lançados no mercado. Os principais sites de notícia no mundo inteiro já se
preocuparam em criar uma versão móvel, mesmo que simples, de seus veículos. E já
tem gente, assim como Burgess, enxergando o meio móvel mais além e procurando
compreender melhor seus membros. O especialista aponta áreas férteis da internet
móvel e uma das suas principais observações é que, diferente da mídia online
convencional, composta em princípio por um canal (onde vários objetos se
encontram), o meio móvel possui quatro grandes canais de apresentação de
conteúdo. Abaixo listo esses canais, abordo suas possíveis relações com conteúdo
noticioso e relaciono exemplos de serviços/produtos sólidos existentes hoje em
dia:
Web
Nessa categoria enquadram-se os websites, páginas montadas como de costume
(em HTML, XHTML, ASP, PHP etc) e pensadas para o ambiente móvel. São acessadas a
partir do navegador do celular, por um processo bem semelhante ao do acesso a um
site, digamos, não-móvel. Um bom exemplo de exploração inicial desse canal é o
BBC Mobile. O site móvel da BBC de Londres é aparentemente leve e objetivo,
dando ênfase às notícias. Não vamos achar que tudo são flores. Se o usuário não
tiver uma conexão rápida como uma Wi-Fi (banda larga sem fio), o acesso a esse
tipo de conteúdo pode ficar um pouco lento. Mas é um canal que promete.
SMS (Short Message Service)
Já faz um bom tempo que o bom e velho torpedo deixou de ser um simples menino
de recado e passou para um patamar muito mais atraente. Hoje em dia, a partir
desse serviço é possível, por exemplo, participar de promoções (a televisão vem
usando muito essa tática), receber notícias, efetuar pagamentos e solicitar
informações como saldo bancário. Em termos de notícia, temos aqui no Brasil
alguns exemplos de veículos que exploram esse canal, como o JB Online, o Terra
Notícias e o IDG Now!.
VOD (Video On Demand) e transmissão ao vivo de vídeo
Telefones celulares com captura de sinais de TV ou com recursos suficientes
para receber e reproduzir vídeos digitais vão ficar populares em breve aqui no
Brasil. Tendo em mãos um telefone celular com um player de vídeo e acesso rápido
à Internet, é teoricamente possível assistir canais televisivos online como a
allTV. Ainda é uma cultura quase inexistente aqui no Brasil, mas é um canal que
também promete.
Java Applets
São programas que você baixa e instala da mesma forma que faz em seu
computador. Talvez os principais exemplos desse canal sejam a versão móvel do
navegador Opera e os jogos que precisam ser baixados para serem jogados. O Opera
Mobile foi desenvolvido para diferentes tipos de tela e para os principais
sistemas operacionais móveis, o que faz ele ficar com uma aparência sempre
bonita e robusta em vários celulares. Esse tipo de conteúdo, construído para o
tamanho exato da tela de um celular, pode ser uma boa opção para um canal de
notícias. Além de ter como ponto forte a estética, é possível controlar, por
exemplo, o número de downloads da interface que exibirá o noticiário.
Tendo os quatro canais acima em mente, fica mais fácil fazer algum tipo de
planejamento voltado para o campo de conteúdo móvel. Em um cenário onde já temos
smartphones e PDAs com suporte a Wi-Fi, se a publicidade já tem encontro marcado
com o meio móvel como mostra Burgess, o que dizer do conteúdo noticioso. Até a
próxima!
Você já acessou algum site móvel a partir de PDAs ou telefones celulares?
Utilize o formulário abaixo para registrar a sua opinião ou nos contar a sua
experiência.
Em tempo:
– A Opera desenvolveu uma tecnologia chamada ‘Small Screen Rendering’
(Renderização para Tela Pequena), que promete criar uma versão móvel amigável de
qualquer página Web. O site oficial do browser exibe exemplos desse recurso;
– A Intel começa a realizar a partir desta terça-feira, 28, a Semana Móvel,
um evento estratégico da empresa para apresentar soluções sem fio desenvolvidas
por ela.’
GRANDES REPORTAGENS
NY, 11 de setembro: estudante deu um furo, 31/03/06
‘A porta foi fechada e, desapontado, o estudante de Jornalismo só conseguiu
pensar nas chances desperdiçadas em Nova York, no dia 12 de setembro de 2001.
Ele se dirigiu à gerente administrativa do jornal The Brazilians.
– Obrigado, dona Cândida, mas ele [Edilberto Mendes, editor do jornal] falou
que eu não tenho muita chance. Os veículos brasileiros estão cheios de
correspondentes. Ele me aconselhou a aproveitar os últimos dias de viagem porque
tudo nos Estados Unidos está mais barato depois do ataque terrorista.
– Por que você não vai até o Consulado-Geral do Brasil?
– Poderia até ir. Mas o que um estudante de Jornalismo que passa férias nos
Estados Unidos vai conseguir por lá?
– Acho que posso te ajudar.
Ela ajudou. Resultado: dias depois, a Folha de S.Paulo publicava a reportagem
sobre a família de Sandra Fajardo Smith, uma das quase 3 mil vítimas do ataque
terrorista ao World Trade Center. A matéria era de autoria de Flávio Ferreira, o
estudante. Só ele tinha contato com a família da brasileira.
Direito x Jornalismo
Fazia seis anos que o doutor Flávio trabalhava como advogado da área cível no
escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados Associados. Na metade de 2001,
quando cursava o terceiro ano de Comunicação Social na PUC de São Paulo, decidiu
passar um tempo nos Estados Unidos pelo programa YMCA (Associação Cristã de
Moços), econômico para estudantes. A cidade escolhida: Nova York.
Ele já havia comprado o New York Pass, um pacote de entradas para várias
atrações turísticas da cidade. Cogitou usar o ingresso ‘Top of The World Trade
Center’, que dava acesso ao arranha-céu, mas no final resolveu ir ao
Metropolitan Museum of New York. Era seu quinto dia de viagem. Ao voltar do café
da manhã, ligou a televisão e bateu o olho na legenda da CNN: ‘air crash’
(desastre aéreo). Um avião se chocara com a Torre Norte do WTC. Minutos depois,
o segundo avião explodiu no impacto com a Torre Sul. Flavio, que olhava
fixamente para a tela, soltou palavrões de susto e acompanhou a mudança da
legenda para ‘America under attack’: Estados Unidos (ou América, como preferem
os americanos) sob ataque.
Ninguém na cidade tinha certeza de quantos aviões seriam jogados contra
prédios, tampouco quais seriam os edifícios escolhidos pelos terroristas. ‘E
agora? Fico aqui ou vou lá? Fiquei com medo, mas pensei que, se eu quisesse
mesmo ser jornalista, teria de enfrentar aquela situação’. Instantes depois, ele
caminhava na contramão das pessoas que buscavam se afastar dos dois prédios.
Tinha uma câmera filmadora. Fez imagens das redondezas, mas nada que pudesse ser
aproveitado por uma grande emissora.
Intuição de foca
No dia 12 de setembro, todos os correspondentes estavam voltados para a
cobertura dos pronunciamentos de George W. Bush, outros governantes e
autoridades. Sua idéia foi fazer plantão na porta do Bellevue Hospital Center,
leste de Manhattan. Havia centenas de pessoas com cartazes de parentes. ‘Não
havia repórteres brasileiros ali. Eu tinha de correr atrás do não-oficial. Por
intuição, achei que, caso surgisse uma boa pauta, eu seria o único repórter
brasileiro por perto’.
Flávio reparou em uma moça que estava ao celular, falando em português.
Chorava muito. O desespero anunciava que sua intuição estava certa. ‘Abordei a
moça, me apresentei e disse a ela que sabia que estava passando por um momento
difícil, de muita dor. Mas uma entrevista poderia ajudar. Ela aceitou dar a
entrevista e que eu fizesse uma imagem dela’. O nome dela era Wanda Tavares
Fajardo. Era prima de Sandra, a contadora de 37 anos que trabalhava no 98º andar
da Torre Norte do World Trade Center, na empresa Marsh Inc..
Imediatamente, Flávio telefonou para Daniel Jelin, da Agência Estado. A
matéria interessou tanto que foi ditada por telefone. No dia 13, Flávio voltou a
ligar para Daniel. Foi orientado a procurar mais veículos que se interessassem
por suas reportagens. A Agência Estado não poderia se comprometer a comprar todo
o material. Afinal, tinha correspondentes por lá. Flávio começou a procurar
ajuda. Foi parar no The Brazilians, onde conversou com Cândida Costello por mais
de uma hora. A reunião resultaria em um balde de água fria vindo de Mendes.
Ao ver um estudante tão interessado sair cabisbaixo da conversa com o editor,
dona Cândida decidiu ajudá-lo. Ela tinha trabalhado por 20 anos no
Consulado-Geral do Brasil. Passou a mão no telefone e ligou para o assessor de
imprensa do Consulado. Pediu a ele que credenciasse Flávio para as coletivas que
aconteceriam dali em diante. Foi ela quem, no passado, dera uma ajuda ao
assessor. Como retribuição, ele recebeu o aspirante a jornalista como se
recebesse um amigo. Sorte de principiante.
Penetra na coletiva
Credenciado no Consulado-Geral, Flávio participou, entre outras, da
entrevista coletiva de 15 de setembro. Empenhado em levantar nomes de possíveis
vítimas brasileiras, o embaixador Flávio Perri respondeu as perguntas e fez um
apelo aos jornalistas.
– Vocês, da imprensa, muitas vezes têm informação que nós, do Consulado, não
temos. Então, peço a gentileza de vocês nos abastecerem de informações sobre
brasileiros desaparecidos. Inclusive, tem uma brasileira, cujo nome saiu no
Estadão. Estou vendo aqui… a reportagem é assinada por… por Flávio Ferreira.
Quem é o Flávio?
Lá atrás, um desconhecido levantou a mão.
– Sou eu.
– Você é novo por aqui, não?
– Sim, sou estudante e estou fazendo reportagens.
– Você não poderia passar os contatos dos familiares dessa moça?
Todos os olhares se voltaram para ele. Todos os olhares, aliás, tinham um
ponto de interrogação. Quem é esse cara? Todos os olhares estavam acompanhados
de blocos de anotações prontos para marcar aquele telefone precioso.
– Olha… eu não tenho autorização da família para passar esse contato.
Fazemos o seguinte: vou conversar com os familiares. Se eles me autorizarem, eu
passo o telefone a vocês.
‘Você acha que eu ia dar de mãos beijadas o telefone da família para o
consulado? No dia seguinte, eu já não teria o furo’. Engraçada foi a reação
amistosa e bem humorada de Tonica Chagas, correspondente do Estadão.
– Mas você é rabudo, hein!
Alguém uma vez falou que sorte é oportunidade mais capacidade. Após a
coletiva, o repórter novato e rabudo conheceu Teté Ribeiro. Ela telefonou para o
marido, Sérgio Dávila, que estava em seu ‘apartamento-redação’, em Village.
Contou que estava com um estudante e que ele tinha uma boa matéria.
– Teté, veja se ele pode vir até aqui.
Sérgio Dávila
Empolgado com a chance de ter o material publicado também na Folha de
S.Paulo, Flávio entrou no apartamento de Sérgio Dávila, correspondente
internacional do jornal, que em 2003 seria o único jornalista brasileiro a
cobrir a guerra em território iraquiano, em dupla com o fotógrafo Juca Varella.
‘Cheguei ao apartamento do Sérgio e ele me recebeu muito bem. Veja a distância
que havia entre nós: ele era correspondente da Folha e eu, um estudante. E ele
me tratou como um colega. Ainda por cima, me incentivou muito’.
– Fique à vontade… sente aí e escreva a matéria.
Flávio terminou de redigir e fez uma observação pertinente.
– Sérgio, fiz imagens de parentes da Sandra. O problema é que estão em
vídeo.
– Você está com a câmera aí?
– Estou.
– Pode me emprestar?
Sérgio conectou a filmadora ao laptop, abriu um programa de edição de vídeo e
capturou um quadro da imagem. Pronto: a foto estava garantida. A reportagem saiu
no dia seguinte. Era a segunda de uma seqüência de nove, somando os dois maiores
jornais paulistas. A Folha pagava 100 reais por reportagem publicada e o
Estadão, 100 dólares. ‘O dinheiro era o que menos importava’.
No Brasil
A viagem, que inicialmente não passaria de 11 dias, durou mais de um mês.
Flávio só desembarcou em São Paulo dia 14 de outubro. A 9ª reportagem foi feita
depois disso. Ele sabia que a certidão de óbito de Sandra sairia na segunda
quinzena de novembro. Voltou a manter contato por telefone com Wanda, a prima de
Sandra. No dia 29 de novembro de 2002, o documento foi emitido. Flávio estava no
escritório de advocacia, de onde ligou para Maria Fernanda Andrade, editora do
caderno Internacional do Estadão. No dia seguinte, o abre de página trazia um
novo furo: ‘Prefeitura de NY emite certificado de óbito de brasileira’. Era a
primeira morte de brasileiros oficializada.
Em julho de 2002, o advogado trocou os fóruns pelas redações. Juntou dinheiro
e pediu demissão do escritório. Foi ser free-lancer do Jornal da Tarde. De lá
para cá, passou também pela TV Cultura, TV Bandeirantes, Agência Folha e Folha
de S.Paulo, para onde escreve até hoje. Atualmente, divide seu tempo entre
textos para a Folha e projetos, como um videodocumentário e a produção de um
programa de TV com boletins jornalísticos sobre inclusão social.
Paradoxo
Enumerar as lições vividas em sua estréia como foca ocuparia milhares de
linhas. Qual foi a principal lição? ‘Um cara como o Sérgio Dávila me ajudou e me
incentivou. O editor do The Brazilians não foi arrogante, mas me jogou um balde
de água fria. Isso é uma lição. O Sérgio foi mesmo muito gente boa. Em fevereiro
deste ano, eu o encontrei na Folha. Ele estava em fechamento, mas, mesmo assim,
me deu a maior atenção. Lembrava de mim. Perguntou se eu tinha entrado mesmo no
Jornalismo. Isso tudo foi muito marcante’.’
JB
EM TABLÓIDEComunique-se
Diretores fazem mistério sobre mudanças no JB, 31/03/06
‘Segredo absoluto no Jornal do Brasil. Depois que o nosso colunista Milton
Coelho Graça divulgou em primeira mão em sua coluna que o jornal está passando
por reformulações, ninguém na redação está autorizado a falar no assunto.
Segundo a coluna de Milton, o jornal vai adotar o formato tablóide a partir do
dia 9/04.
O Meio & Mensagem Online divulgou uma matéria esta semana informando que
o responsável pela reformulação gráfica será Amaury Melo. Ele não foi encontrado
para comentar o assunto.
Um funcionário da empresa, que não quis ser identificado, revelou ao
Comunique-se que as mudanças estão sendo guardadas a sete chaves para impactar o
mercado, mas adiantou que o projeto vai ser moderno e bastante ousado.
Uma das possibilidades é de o Jornal do Brasil manter o formato standard
apenas para seus assinantes e passar a imprimir em formato tablóide a versão que
vai às bancas.’
IMPRENSA / EUA
Notícias que devem ser publicadas, 30/3/2006
‘Fonte:Direto da Redação (www.diretodaredacao.com.br) – É realmente incrivel
como a mídia corporativa americana, especialmente o New York Times, demora a
registrar as notícias reais. Quando um pastor de uma pequena cidade no Tennessee
é assassinado por sua própria esposa, o evento ganha imediata cobertura
nacional. CNN, USA Today, The Los Angeles Times, The Miami Herald, CBS News,
estão todos lá com uma porção de repórteres para revelar os mínimos detalhes na
certeza de que seus leitores entenderão totalmente a tragédia que aconteceu a
Matthew Winkler. ‘Eles formavam uma boa família cristã e pareciam muito
felizes’, são frases de membros da igreja do pastor morto num artigo da AP. Mary
Winkler foi descrita como uma ‘sossegada e despretenciosa mulher’ e o diretor da
escola local, onde ela era professora, disse que ela e o reverendo pareciam ter
um ‘forte e sólido casamento cristão’.
De fato, embora devam ao pastor assassinado e sua esposa o respeito que
qualquer cidadão merece, os jornalistas estão exagerando na cobertura nacional
do acontecimento, sem se importar com os princípios básicos de sua profissão. A
verdade tem que ser descoberta, o que significa ir até o fundo do mistério. Qual
o verdadeiro motivo do terrível assassinato? O Serviço de Investigação do
Tennessee disse que as autoridades sabem porque Mary decidiu livrar-se de seu
marido, mas não revela as razões. Quando repórteres, investigando como qualquer
bom jornalista deve fazer, perguntam se ‘infidelidade’ poderia ser o motivo, o
porta-voz do Bureau ignora, ao mesmo tempo em que não comenta se Mary acusou seu
marido de abuso.
Não há dúvida, todos sentimos pelo reverendo, sua esposa e as três filhas. No
mínimo nós sabemos o que aconteceu e podemos estar tranquilos sabendo que a
imprensa do nosso país estava lá fazendo perguntas ‘difíceis’ tão logo a
história explodiu. Esse mesmo grupo de repórteres poderia ter demorado um ano
para escrever sobre ‘Downing Street Memo’, depois que virou notícia para o resto
do planeta, mas como seria possível alguém comparar uma guerra premeditada que
causa cem mil mortes com o assassinato a sangue frio de um pastor?
Quando a imprensa britânica estava reportando mais de um ano atrás que desde
2002 a administração Bush estava ‘colhendo’ informações da Inteligência para
construir artificialmente uma justificativa contra Saddam Hussein, a imprensa
americana bocejava. Se a notícia fosse coberta de alguma maneira, normalmente
ela só estaria num pequeno artigo na página 32, escondida num local onde poucos
leitores iriam perceber. O NY Times, símbolo da integridade jornalística
americana, ignorou essa incrível prova de que Bush mentiu para o país e em
frente às Nações Unidas sobre o Iraque e suas armas de destruição em massa. Ele
não considerou essa uma ‘notícia que deve ser publicada’, ou seja, que a América
estava cometendo um crime de guerra em nome do petróleo e do império. Isso não
era alguma coisa que o público deveria tomar conhecimento. Foi uma notícia que
explodiu antes da última eleição (como o escândalo da espionagem doméstica da
NSA), mas o Times não publicaria. Eles tentam ser objetivos como o jornal da
América, e esta espécie de objetividade poderia custar o emprego do príncipe
idiota.
Agora eles estão falando sobre isso. Levemente. Em 27 de março, eles
finalmente escreveram sobre a conversa que Bush teve com Tony Blair em Janeiro
de 2003, quando Bush disse que o plano de inspeção no Iraque poderia ser pintado
com as cores da ONU na esperança de que isso atrairia os tiros iraquianos. Ele
também disse ao Primeiro-Ministro britânico que o bombardeio começaria em 10 de
março e que ele faria o máximo para ‘ameaçar’ outros países em apoiar uma
resolução da ONU autorizando a invasão.
Esse não era o memorando de Downing Street (mais prova dos planos dos Neocons
para invadir o Iraque tomada no encontro em 2002), mas era, no mínimo, alguma
cobertura atrasada de uma notícia séria de interesse nacional. Não exatamente o
assassinato de um pregador, é verdade, mas talvez tão interessante em sua
própria maneira.
Sobre o autor: Escritor e tradutor, historiador formado pela Universidade da
Califórnia (UCLA). Neto do célebre escritor John Hemingway, John está escrevendo
um livro sobre o relacionamento do pai dele, Gregory, e o
avô.’
JORNALISMO & HUMOR
Imprensa: entre o humor e a paixão, 31/3/2006
‘Fonte:O Povo – Cláudio Pereira publicava antigamente em um dos jornais de
Fortaleza uma coluna completamente irresponsável assinada sob o pseudônimo de
‘Patrulheiros Toddy’. Nela se dedicava a promover concursos como o Garota
Cultural, Casanova, Namorado do ano, incluindo entre os candidatos as pessoas
mais variadas sempre à revelia. Pois bem, na apresentação dos candidatos dizia
os maiores absurdos sobre o que faziam ou deixavam de fazer. Depois, quando
alguém lhe perguntava se era verdade aquilo que saíra no jornal ele respondia:
‘Saiu no jornal? Então é verdade’. Sendo amiga do Cláudio Pereira há tanto tempo
passei, desde então, a manter uma relação de desconfiança permanente a respeito
das coisas que ‘saem no jornal’.
Os que estudam o papel da narrativa na história sabem o quanto há de seleção
na forma de contar um fato histórico, enfocando-se preferencialmente ora um ora
outro aspecto que, ao narrador, parece mais atraente. Quero crer que a imprensa
não funciona de outra maneira e uma série de filmes nos tem alertando sobre os
rumos que o quarto poder pode tomar, dependendo dos interesses em pauta. Desde
os seus primeiros tempos a imprensa vem sendo usada para construir ou destruir
imagens e o poder dos que detém os meios de produção, no caso, os jornais,
continua valendo para garantir a perpetuação de seus interesses e de seus
ideais.
É interessante notar como ainda no começo de nossa história de nação
independente, um personagem como José Bonifácio fez uso intensivo da propaganda
impressa para fixar uma imagem positiva junto ao público. O Regulador, um dos
jornais subsidiados pelo governo, referia-se a José Bonifácio como: ‘um Ministro
que nos reinos estrangeiros deu tanta glória ao nome português, como os heróis
da nossa Idade do Ouro’. No Diário do Governo, ele era chamado de ‘sábio e
prudente Ministro’ que, apesar de ‘encanecido, conservava na pureza de seus
olhos todo o fogo expressivo dos grandes gênios e na modéstia de sua pessoa a
divisa de seus talentos extraordinários’.
E tudo isso em uma imprensa que tinha muito pouco tempo de atividade. Pois,
até 1808, a imprensa era proibida no Brasil. Com a corte veio a primeira gráfica
que, a partir de 10 de setembro, começaria a imprimir o jornal Gazeta do Rio de
Janeiro versão adaptada da Gazeta de Lisboa. Mas a censura aos impressos na
corte de D. João VI permaneceria total até 1821. A única voz dissonante no
período, foi a do Correio Brasiliense publicado em Londres por Hipólito da
Costa. Entre 1808 e 1822 o Correio foi o nosso único jornal realmente
informativo, crítico e analítico e teve grande influência na educação política
da geração que, no Brasil, preparou e realizou a Independência. Hipólito era um
homem do Iluminismo, tinha uma visão do papel da imprensa como forma de educação
dos povos e via-a como substituto natural da escola e do livro em um meio onde
ambos era tão escassos. Seus sucessores, através dos jornais surgidos entre 1821
e 1823 declaravam quase sempre o propósito de preparar o povo para o regime
liberal e prometiam não publicar ‘libelos difamatórios’. Apesar das boas
intenções iniciais, no entanto, em virtude da diversidade de idéias e interesses
em disputa, aos poucos, o clima tenso e apaixonado que caracterizava a vida
política se transferia para os textos.
Mas, a meu ver, os textos que impulsionaram a campanha da Independência,
recheados de insultos e difamações, da mesma maneira que os artigos dos
Patrulheiros Toddy da Fortaleza dos anos 1970, sendo tão transparentes nas suas
intenções, talvez mereçam mais crédito do que muito do que a gente hoje lê sob a
pretensa forma de moderno e neutro jornalismo.
(*) Doutora em Ciência Política pelo Iuperj (Instituto universitário de
pesquisa do Rio de Janeiro), pesquisadora da Fundação Casa de Rui Barbosa e
autora de Insultos Impressos – A Guerra dos Jornalistas na Independência (Cia.
Das Letras, 2000) – publicado na edição de 28/03/06.
JORNAL DA IMPRENÇA
Boa cacetada, 30/03/06
‘à imagem e semelhança
da contínua queda,
cada sabor
abre uma nudez.
(Astier Basílio in Eu sou mais veneno que paisagem, no prelo.)
Boa cacetada
O considerado Fausto Osoegawa, de São Paulo, leu no Globo Online, acochadinho
sob o título Policiais Civis prendem 70 pessoas em prostíbulo do Centro:
RIO – Policiais Civis de várias delegacias estouraram na noite desta
terça-feira um prostíbulo na Rua Joaquim Silva, no Centro. Cerca de 70 pessoas
entre prostitutas e clientes foram detidas e levadas para a 5ª DP (Gomes Freire)
onde serão autuadas por lenocídio.
Fausto lamentou o equivocado boletim de ocorrência que se transformou em
notícia:
Fiquei chocado com o fato de as pessoas terem sido autuadas por ‘lenocídio’,
o que me levou a concluir que, além das práticas sexuais de praxe nesses
estabelecimentos, houve mortes . . .
Janistraquis tem certeza, ó Fausto, de que se não morreu ninguém, pelo menos
o idioma levou uma boa cacetada.
******
Intervindo…
Nossa considerada Miriam Abreu repassou à coluna pertinente observação que
Jorge Clapp enviou aos amigos, entre os quais o presidente deste portal, Rodrigo
Azevedo:
Caros amigos, não gosto de criticar ‘coleguinhas’, mas, hoje, li em duas
matérias, curiosamente publicadas nas editorias de esportes (Lance e O Globo), o
termo (?) ‘interviu’. Será que o problema está apenas em um ou outro
profissional mais desatento, ou a crise é mesmo séria?
Pois Janistraquis, que sempre gostou e acha utilíssima para nossa profissão a
crítica aos chamados coleguinhas, garante que a crise é severa e lembra que há
alguns anos o então diretor da Central Globo de Jornalismo, Armando Nogueira,
demitiu um repórter esportivo porque este trocou interveio pelo imortal e
insistente interviu.
Omitimos o nome para evitar mais e tardias humilhações ao demitido, o qual,
segundos os amigos, é ignorante mas tem bom caráter.
(E, por falar no assunto, esperamos que passem a demitir todos os que trocam
fluido por fluído.)
******
De orelhadas
Nosso considerado Mestre Deonísio da Silva, homem de mil afazeres que ainda
encontra tempo para ler jornal, envia este espetacular Erramos publicado na
Folha de S. Paulo de 23/3:
A espécie de tartaruga tigre-d’água-americano possui manchas vermelhas na
cabeça, e não uma orelha vermelha, como informou erroneamente o texto
‘Tartarugas são retiradas da República’ (Cotidiano, pág. C8, 9/3). Tartarugas
não têm orelhas.
Janistraquis acha que o redator exagera no excesso de zelo:
‘Ora, considerado, bola de futebol também não tem orelha e todos os locutores
e comentaristas se referem à ‘orelha da bola’, né não?’
******
Coisa de circo
Deu na coluna de Cláudio Humberto:
A vida como ela é — Qualquer associação é mera coincidência, diverte-se um
leitor. A deputada-dançarina Ângela Guadagnin (PT-SP) é autora do projeto de Lei
6.445/05, que ‘proíbe a utilização de animais em espetáculos circenses ou de
qualquer natureza’.
******
Assumiu!!!
Deu em tudo quanto é jornal:
Fernandinho Beira-Mar é transferido para a PF de Brasília.
Janistraquis foi o primeiro a ler e comentou, com desalento no sotaque
nordestino:
‘Eu bem desconfiava que, em meio à esculhambação de Brasília, iriam mais cedo
ou mais tarde trazer o cara pra assumir a chefia da Polícia Federal. Pelo menos
Fernandinho é mesmo do ramo.
******
Luar sobre Copacabana
Leia aqui o novíssimo poema da lavra pra lá de generosa de Celso Japiassu.
******
Pessoal afiado
O colunista mais Janistraquis ficaram deverasmente felizes com o acalorado
debate entre os leitores no democrático espaço dos comentários, na semana que
passou. Significa que a coluna, embora não agrade a todos, abriga a inteligência
de muitos e se destaca como um, digamos, refúgio mais confiável que qualquer
mansão do Lago Sul…
******
Dança macabra
O considerado Camilo Viana, diretor de nossa sucursal mineira, envia texto do
cônego José Geraldo Vidigal de Carvalho, professor no Seminário de Mariana (MG),
por meio do qual infere-se que o rebolado de Angela Guadagnin pode ser
considerado até mesmo um pecado mortal. Como a cretiníssima gorducha é muito
religiosa, dizem, manda a prudência que bote logo o galho dentro, se deseja
escapar às chamas do averno imundo.
Leia pequeno excerto e confira o texto completo no Blogstraquis:
Dança macabra é um poema sinfônico de Saint-Saens inspirado numa composição
de Henrique Cazalis. Esta composição musical tem dois temas: um representando a
dança da morte, o outro simbolizando a Noite e a Solidão do cemitério. Esses
temas desenvolvem-se até o cantar do galo, dado em imitação do oboé, marcando o
sinal para terminar a dança macabra. O poema termina ao raiar do dia. A
lembrança desta peça musical vem à baila diante do fato ocorrido em plena Câmara
dos Deputados.
******
Cabra macho
Jorge Bastos Moreno, excelente colunista de O Globo, divulgou no seu
Nhenhenhém:
(…) Fiel colaborador ouviu esta pérola do presidente Lula sobre a paciência
de Palocci diante da avalanche de denúncias – ‘Vendo tudo isso, me dá uma
vontade louca de botar o Ciro Gomes no lugar do Palocci só para ver se alguém
tem coragem de fazer com ele o que estão fazendo com o pobre do Palocci’.
Janistraquis, que tem amigos comunistas, ateus, fascistas e o escambau, todos
machos que pra cagar vão amarrados, garantiu que Lula está equivocado acerca da
valentia de Ciro Gomes:
‘Considerado, conheço um sujeito que foi colega de Ciro Gomes no primeiro ano
ginasial e sempre passava a mão na bunda dele…’
******
Vitória de Léa Maria
A jornalista e escritora Léa Maria Aarão Reis, excelente colunista do Jornal
do Brasil dos anos 60, que décadas mais tarde voltou a trabalhar na empresa e
foi demitida, ganhou a ação que movia contra Nélson Tanure e conta detalhes no
Blogstraquis. Trata-se de breve desabafo que merece leitura.
******
Refresco
De um gozador amigo do colunista, repassamos ao considerado leitor este
infame trocadilho:
Na falta de vasélina, vai mântega…
******
A mesma coisa
O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal no DF, de cujo
varandão debruçado sobre a torpeza geral é possível enxergar Palocci (que ainda
está solto!) a chorar mágoas à margem do Paranoá, pois Roldão lia o caderno
intitulado Trabalho, do Correio Braziliense, quando deparou com esta chamada:
MULTINACIONAIS ANUNCIAM SELEÇÕES DE ESTAGIÁRIOS E TRAINEES. AO TODO, SERÃO
OFERECIDAS 693 VAGAS (…)
Roldão, que chefiou muitos jovens profissionais pela vida afora, desaprovou:
‘Há um evidente pleonasmo: estagiários e trainees são a mesma coisa.’
******
Nota dez
Eleito por nove entre dez colaboradores desta coluna, leva o prêmio da semana
o editorial da Folha de S. Paulo de 26/3, intitulado Abuso de Poder. Dê uma
olhada no primeiro parágrafo e continue a leitura no Blogstraquis:
A desfaçatez, o uso sistemático da mentira, o empenho em desqualificar
qualquer denúncia, nada disso constitui novidade no comportamento do governo
Lula. Chegou-se nos últimos dias, entretanto, a níveis inéditos de degradação
ética, de violência institucional e de afronta às normas da convivência
democrática.
******
Errei, sim!
‘PINTOR VIVÍSSIMO – Embora mais chegado ao forró que ao rock, Janistraquis
festejou este milagre divulgado em primeiríssima mão pelo sempre bem-informado
Caderno B do Jornal do Brasil: Elvis Presley vive em São Paulo.
Meu secretário quis logo saber endereço e telefone do ex-defunto, mas o
‘olho’ da matéria funcionou como água fria no assanhamento de Janistraquis –
‘Exposição ressuscita’, dizia. ‘Considerado, se exposição ressuscitasse alguém,
eu ia promover uma retrospectiva do Roberto Camasmie’, disse-me o ludibriado.
‘Mas o Roberto Camasmie está vivíssimo!’, protestei. Janistraquis não acreditou.
(outubro de 1990)’’
JORNALISMO REGIONAL
Cobertura de morte de jornalista causa polêmica, 3/4/06
‘Morreu na madrugada da última sexta-feira (31/03), em Curitiba, o jornalista
paranaense Giordani Rodrigues, criador e editor do site InfoGuerra, no ar há
cinco anos. Rodrigues, com 40 anos e formado pela Universidade Federal do
Paraná, era considerado, no jornalismo, um dos maiores especialistas do Brasil
em segurança da Internet e cybercrimes. Colaborava regularmente com o site
especializado Consultor Jurídico e ajudou na criação da Associação Brasileira de
Jornalismo Investigativo (Abraji), entre outras atividades relevantes.
O jornalista foi assassinado dentro do seu apartamento, no bairro Jardim
Botânico, onde morava sozinho. A polícia procura o autor da morte –
aparentemente, um latrocínio, pois foram levadas a carteira e o celular de
Rodrigues. De acordo com as primeiras informações apuradas pelos policiais e
divulgadas pelos jornais Tribuna do Paraná e O Estado do Paraná, o jornalista
havia saído acompanhado de uma festa, onde passou toda a noite de quinta-feira
(30/03), e chegou ao seu apartamento na madrugada de sexta-feira. O homem que
estava com ele é o principal suspeito. Somente no sábado pela manhã o corpo foi
encontrado, pela diarista que chegou para trabalhar.
Repercussão
A repercussão da morte de Giordani Rodrigues foi imediata. E-mails em listas
de Internet entre associados da Abraji e de outros grupos de jornalistas já
circulavam no sábado (01/04) relatando o fato. Cláudio Tognolli, que conhecia
Rodrigues, foi um dos primeiros a saber da morte e divulgar a notícia nas
listas. Ele lembra que Rodrigues ‘foi uma peça fundamental na fundação da
Abraji, com seus conhecimentos precisos de ferramentas da Internet, os quais não
hesitava em compartilhar com quem precisasse dele’.
Tognolli, que é da diretoria da Abraji e também escreve para o Consultor
Jurídico, entre outras atividades, protesta contra a forma com que o portal
Paraná Online – que reproduziu a matéria do jornal Tribuna do Paraná, também do
Grupo GPP – deu a notícia. O jornal e o site publicaram a foto do corpo do
jornalista, caído de bruços em cima da cama.
A matéria diz, no lide, que Rodrigues era homossexual: ‘A noite de diversão
com os amigos numa boate acabou de forma trágica para o jornalista Giordani
Rodrigues, 40 anos. Ele foi assassinado, na manhã da última sexta-feira, dentro
do próprio apartamento, na Rua Maurício Nunes Garcia, Jardim Botânico, em
Curitiba. Segundo conhecidos da vítima, o jornalista era homossexual e conheceu
o assassino na noite de quinta-feira’.
Outros jornalistas também protestam, nas listas de e-mails, pelo fato de que
a reportagem da Tribuna, assinada pela repórter Patrícia Cavallari, não teria
dado destaque à carreira de Rodrigues. Um dos e-mails chama o jornal de
‘jornaleco provinciano’. A lista convoca os jornalistas a escrever para a
editoria de Policial da Tribuna protestando.
Nesta segunda-feira (03/04), a Tribuna publica a suíte da notícia com uma
matéria curta, assinada pela editora de Policial, Mara Cornelsen. Ao lado de uma
imagem de Rodrigues usando chapéu e camisa florida – aparentemente, uma foto
feita à beira-mar – o texto informa que a Delegacia de Homicídios ‘continua
investigando’ o assassinato, e acrescenta apenas que Rodrigues já havia sido
assaltado anteriormente em situação parecida, ao ‘levar um desconhecido para
casa’.
A Gazeta do Povo também deu a notícia do assassinato, reproduzida no portal
OndaRPC, do mesmo grupo noticioso. Na reportagem da Gazeta, além dos fatos
relativos ao latrocínio, repassados pela polícia, colegas do jornalista também
foram ouvidos, destacando seu temperamento colaborativo. A carreira de Rodrigues
como especialista em Tecnologia da Informação também ganhou destaque.
Outro lado
Procurado pela reportagem do Comunique-se, o diretor de redação da Tribuna,
Rafael Tavares de Mello, foi informado dos protestos nas listas de discussão
pela maneira com que o jornal noticiou o assassinato de Rodrigues e explicou a
posição do jornal.
De acordo com Tavares, no momento em que a repórter Patrícia Cavallari fez a
matéria, a partir de notícias colhidas no local do crime, não se sabia nada a
respeito de Giordani Rodrigues além do fato de que ele era jornalista, e das
demais informações repassadas pela polícia. ‘A Tribuna paga o preço de ir ao
local dos crimes e ser vista com preconceito, como sensacionalista. Estamos
cumprindo nossa função: há 50 anos a Tribuna tem a melhor e mais completa
cobertura policial da cidade. Nós tratamos esta notícia – e a vítima – como
todas as outras. Não houve falta de respeito. É bom lembrar que, nesse mesmo
final de semana, aconteceram 20 homicídios em Curitiba e Região Metropolitana.
Nós cobrimos todos sem distinção. Não tínhamos, no momento em que foi feita a
reportagem, nenhuma informação sobre a carreira do jornalista e a importância
dele no País, em sua especialidade de segurança na Internet’, afirma.
Tavares vê ‘corporativismo’ na cobrança dos jornalistas sobre a posição da
Tribuna na cobertura do caso. ‘Teríamos que ter dado mais importância a essa
vítima em especial, buscar informações sobre ele, porque era jornalista como
nós? E se fosse engenheiro? Arquiteto? Traficante? Desempregado? Qual é o
critério? O fato é que vivemos em uma capital com altos índices de violência,
vista como um paraíso para se viver, mas onde a segurança pública falha e os
cidadãos estão indefesos. Temos homicídios e latrocínios todos os dias aqui. O
papel da Tribuna é mostrar essa realidade’, finalizou.
De acordo com a matéria publicada no Consultor Jurídico, Giordani Rodrigues
havia acabado de receber, em São Paulo, o prêmio SecMaster2005, oferecido pela
publicação Security Week, na categoria Melhor Contribuição Jornalística, pelo
trabalho que vinha desenvolvendo há cinco anos como editor do site InfoGuerra.
Ele era também diretor de Imprensa e Relações Públicas da ABDTI – Associação
Brasileira de Direito e Tecnologia da Informação, colunista de tecnologia da
revista Homem Vogue e colaborador do Terra Informática.’
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