Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A PM do Rio espiona jornalistas

Se espionar jornalistas e manifestantes é ato antidemocrático, o espião apresentando-se publicamente, é, além de tudo, digno de um capítulo do Agente 86, aquele seriado de tevê dos anos 70. Mas, apesar de parecido com a série cômica, foi muito sério o ocorrido em 17 de março no Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro.

Naquele dia, à tarde, esteve na sede da entidade o subtenente Joaquim Ferreira, lotado na Coordenadoria de Inteligência da Polícia Militar do Rio de Janeiro (depois, confirmou-se que o homem trabalha mesmo neste serviço secreto da PM, o que envolve de muito perto a instituição) para solicitar registro de repórter fotográfico.

Ferreira alegou que já trabalhava em um jornal na Baixada Fluminense e fotografava manifestações infiltrado, sob ordem do seu comando, porém sentia vontade de “se integrar” aos demais fotógrafos – e para isso precisava da identidade profissional. Mas, avisou: embora desejasse ser jornalista, se presenciasse um crime voltaria a ser policial e prenderia o criminoso!

Como o registro foi-lhe negado, o subtenente Ferreira ameaçou a presidente, Paula Máiran, e uma funcionária do sindicato: “jamais vou esquecer os rostos de vocês”. No mesmo dia, o caso foi informado à assessoria de imprensa do Comando-Geral da PM, que negou ter dado ordem de espionagem sobre jornalistas.

Boa pergunta

A ameaça foi registrada no relatório sobre violências cometidas contra jornalistas no Brasil e enviado à Organização dos Estados Americanos (OEA). Em 27 de março, a Comissão Internacional de Direitos Humanos (CIDH) da OEA a incluiu no debate sobre ameaças à liberdade de imprensa na América Latina – o Brasil é um dos campeões mundiais desse tipo de barbaridade.

Em janeiro, Paula Máiran havia sido alertada por jornalistas que trabalham próximos à área de segurança que ela mesma já estava sendo monitorada. Com efeito, dois meses depois, Paula flagrou dois homens em um carro cinza escuro, estacionado na rua Senador Dantas, que a filmavam quando ela saía do sindicato tarde da noite.

O sentimento de angústia que essa situação causa é ainda maior no ano em que se completam cinco décadas do golpe empresarial-militar de 64. Mais de 400 sindicalistas foram presos no Brasil inteiro já no segundo dia do golpe, provando que vinham sendo acompanhados há tempos. Jornalistas foram perseguidos por defenderem a ordem constitucional (vários também aderiram ao golpe, mas isso é uma outra estória).

Agora, é o caso de perguntar ao governador Pezão, ao secretário de Segurança Beltrame e ao comandante-geral da PM Menezes: ainda se espiona jornalistas no Rio? O subtenente Ferreira estava a serviço de seu comando? Se estava, porquê? Se não estava, servia a quem? Por que continua solto?

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Carlos Tautz, jornalista, coordenador do Instituto Mais Democracia – Transparência e controle cidadão de governos e empresas