Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A internet reforça ou contesta o sistema?

Quando o Facebook comprou a Oculus, fabricante de “capacetes” para realidade virtual, no mês passado, Mark Zuckerberg, fundador e executivo-chefe da rede social, sugeriu que sua aquisição pode ser “uma das plataformas do futuro”, servindo de hospedagem para tudo: de médicos via Facebook a shoppings via Facebook. É pouco provável que Astra Taylor simpatize com essa visão. Em The People’s Platform, adverte contra o crescente poder do Facebook, Google, Apple e Amazon, argumentando que uma internet dominada por gigantes não pode ser a força emancipadora que novos pensadores sobre o papel da mídia, como Jeff Jarvis e Clay Shirky, nos querem fazer crer.

Escritora e realizadora de documentários mais conhecida por seus filmes sobre filosofia, Astra não é a primeira a dar o alarme. Evgeny Morozov apontou que as tecnologias digitais, além de tornar disponíveis novos canais de comunicação para os empenhados em derrubar regimes autoritários, também proporcionam a esses regimes poderosas ferramentas de vigilância. Jaron Lanier, por sua vez, argumentou que o esforço coletivo celebrado nos projetos da web 2.0, como a Wikipedia, podem, a um só tempo, inibir o progresso e sufocar a individualidade.

Astra baseia-se no trabalho de Lanier: uma internet com “uma estranha tendência para o surgimento de monopólios” reforça, em vez de contestar, estruturas de poder existentes. Mostra-se preocupada com a forma pela qual temos despreocupadamente entregue a empresas privadas recursos comunitários antes prezados, desatentos ao fato de que a comercialização está, pouco a pouco, penetrando cada vez mais nossas vidas. Em vez de uma praça na cidade, temos o Twitter; em vez da biblioteca, o Google; e em vez do álbum de fotos de família, o Facebook. “Tudo é acessível e individualizado”, escreve, “mas apenas por meio de empresas que controlam de alto a baixo a rede inteira.”

Poderosos “planejadores urbanos”

Este livro foi lançado no momento em que os valores de mercado das empresas de tecnologia disparam e em que rachaduras começaram a aparecer na admiração pública por empresas como o Google e o Facebook, seja por meio de protestos nas ruas de San Francisco, organizadas por comunidades locais que se sentem excluídas do boom da economia no setor de tecnologia, ou da indignação europeia em face das acusações de que as empresas de tecnologia americanas colaboraram com o programa de monitoração em massa conduzido pela Agência Nacional de Segurança americana.

Astra vê os programadores que constroem o mundo online não como “programadores de garagem”, mas como poderosos “planejadores urbanos”. Tendem a valorizar padronização, simplificação e velocidade, em detrimento de diversidade, complexidade e interdependência. Por um lado, o Google é destino de cerca de 25% de todo o tráfego de internet americano e comprou mais de cem startups que poderiam ter crescido e se convertido em concorrentes; uma em cada sete pessoas no planeta está cadastrada no Facebook; e 40% da largura de banda noturna nos EUA é consumida por espectadores do Netflix.

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Hannah Kuchler, do Financial Times