Um levantamento publicado no dia 3 de abril deste ano pela entidade PEC (Press Emblem Campaing) apontou o Brasil como segundo país com maior número de jornalistas mortos só em 2014, um número somente inferior aos cinco registrados no Iraque.
Os dados revelam que quatro jornalistas foram assassinados só nos primeiros três meses deste ano, aqui no país. Nem na Síria, país em plena guerra civil, com dois mortos, o registro foi superior. A entidade ainda aponta que, em apenas três meses, 27 jornalistas foram assassinados enquanto trabalhavam pelo mundo. O destaque é justamente o fato de que o número de vítimas em protestos também aumentou. Neste ano, quatro profissionais perderam suas vidas cobrindo manifestações pelo mundo, na Ucrânia, Egito, Paquistão e no Brasil.
Já em 2013, um relatório divulgado no mês de fevereiro também deste ano, pela organização não governamental internacional Repórteres Sem Fronteira (RSF), criada para defender a liberdade de imprensa, mostra que o Brasil superou o México no ranking sobre a liberdade de imprensa no mundo. Em uma escala que vai de uma situação considerada boa para uma considerada muito crítica, o Brasil ocupa agora a posição de número 111, perdendo 53 posições de 2011 a 2014, enquanto o México ocupa a posição 152. O ranking foi baseado no número de jornalistas assassinados no exercício da profissão.
A RSF atribui a piora às condições de trabalho para os jornalistas, ao nível de insegurança altíssima no país e ao poder do crime organizado, tanto no tráfico de drogas quanto de matérias-primas em certas regiões. Desde o fim da ditadura militar, em 1985, o Brasil é tido como um país onde reina a livre expressão. Embora este direito tenha sido garantido pela Constituição de 1988, permanece uma preocupante distância entre o que está escrito e sua implementação na prática. Mesmo em plena democracia, contexto em que as liberdades de expressão e de opinião e o direito à informação são considerados pilares de sustentação desse regime.
“Minha arma é o verbo”
Embora a ocorrência de violações graves à liberdade de expressão entre mulheres seja numericamente menor em relação aos homens, elas enfrentam outras intimidações específicas como assédio moral e sexual – dificilmente noticiadas, divulgadas ou de alguma forma registradas. Outra explicação de tamanha diferença está na menor participação das mulheres nos debates públicos e da vida política, seja como jornalista ou defendendo uma causa específica.
O jornalista mossoroense Carlos Santos, que atua há 26 anos em diferentes veículos de comunicação afirma que poucos jornalistas têm plena autonomia para o exercício jornalístico. Ele relaciona tal argumento ao fato da maioria dos veículos convencionais de comunicação estar em mãos do capital e sob controle de grandes grupos e submetido a um intrincado jogo de poder.
Questionado sobre o posicionamento e trabalho das autoridades do país na busca de solucionar os casos de jornalistas mortos, torturados e ameaçados, o jornalista tem o seguinte desabafo “Se você tem algum nome e representatividade, ganha nota de solidariedade, manifestações de apoio etc. Se é do interior, de alguma rádio pequenina etc., recebe o esquecimento eterno ou o endosso de faz-de-conta.” Carlos Santos ainda confessa que já deixou de escrever algo por medo de sofrer algum tipo de ameaça. “Eu não ando armado, não tenho segurança privada, não possuo casa com fortificação ou carro blindado. Minha arma é o verbo. Como argumentar – por exemplo – com o crime organizado? O Estado vai lhe garantir segurança até onde e quando? O Estado não consegue lhe garantir o direito constitucional de ir e vir numa cidade como Mossoró, imagine a segurança pessoal para preservação do direito de se expressar.”
O direito à informação
Por fim, ele conta que já sofreu incontáveis ameaças. Diretas, indiretas, ostensivas e veladas. “Determinada autoridade judiciária, há alguns anos, me encontrou num local público e exclamou: ‘Você ainda está vivo!’ Entendi. Ele tivera contrariedade comigo devido certas matérias e mandou seu recado. Processo Judiciais de um mesmo grupo político, insatisfeito com matérias investigativas e denúncias, passam de 30 (trinta). E-mail ameaçador, não falta. Página apócrifa na internet montada e bancada por um grupo político para me atacar e a outras pessoas, também faz parte do ‘cardápio’. Até ameaça de violência física a meus filhos foi postada nesta página”, disse o colunista do blog Herzog.
Não é tarefa das mais fáceis atuar em prol da liberdade de expressão e preservar o direito à informação da sociedade. E ela fica ainda mais árdua quando o seu agente é um jornalista. Tais fatos nos levam a questionar o estado da liberdade de expressão no país anfitrião da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016.
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Amanda Kelly Santos de Santana é jornalista, Natal, RN