A festa de abertura da Copa do Mundo nem tinha começado na quinta-feira (12/6) em São Paulo e dois dos principais veículos de comunicação da França já publicavam editoriais sobre o evento no Brasil. Na verdade, pouco se falou sobre Copa; muito, sobre violência e crise social às vésperas das eleições.
No site da TV francesa TV5Monde, um artigo de autoria do jornalista Pascal Priestley (ver aqui) apresenta os números da violência no país, ancorado em dados como da ONG Mapa da Violência. Intitulado “Brasil, a guerra esquecida”, o texto considera o Brasil um dos lugares mais violentos do planeta. Para tanto, lembra que, desde 2000, o número de mortos aproxima-se ao da batalha de Verdun – a cidade francesa massacrada durante a Primeira Guerra Mundial, em 1916 – mais de 600 mil mortes. “Um assassinato a cada dez no mundo é cometido no Brasil e seis das cidades mais violentas do mundo… são as da Copa do Mundo (Manaus, Fortaleza, Natal, Salvador, Recife, Belo Horizonte)”.
O editorial afirma que a violência aqui é cotidiana e é desencadeada, na maioria das vezes, a partir de um conflito em família, ou mesmo entre vizinhos: “Uma rivalidade de honra ou sexual, frequentemente provocada pelo álcool.” O recuo do analfabetismo e o fato de o Brasil ser a primeira economia da América Latina são trazidos como exemplo para demonstrar que as altas taxas de assassinatos não estão necessariamente relacionadas às da miséria: “+15% de crimes, mesmo no próspero estado do Rio Grande do Sul”.
Verdade que ninguém esquece
Ainda nem tinham entrado em campo os jogadores e o site do Le Monde disparava, sobre o Brasil: “Esta quinta-feira já se anunciava rica em manifestações e greves, atrasos nas infraestruturas ou surtos de violência” (ver aqui). O texto começa assim:
“Estranho Brasil. O país dito do ‘futebol’ perdeu a Copa de 1950 em casa (…) e ganhou o troféu cinco vezes no exterior, mais tarde, em uma atmosfera de regozijo. Agora que o Mundial bate à sua porta, os brasileiros parecem procurar em outro lugar.”
Para Le Monde, a Copa acontece em um país “desencantado, desiludido, inquieto, mal-humorado e ansioso por um futuro melhor”. O Itaquerão é, para os franceses, “o estádio símbolo dos atrasos do Brasil para a preparação do Mundial”. E finaliza: “‘Uma Copa para quem?’ é uma das frases mais encontradas nos muros das doze cidades-sede.”
São duas análises que partiram da mídia francesa sobre uma verdade que ninguém esquece, ao contrário do que se afirma nos textos. Não esquecemos. O medo nos acompanha. A violência estampa todo dia nossas manchetes locais. Agora a partida começou. Há uma nova contagem regressiva: um mês de Copa do Mundo no Brasil. Em Porto Alegre, nunca se viu tanto estrangeiro. Estão chegando os franceses: que impressões vão levar para casa?
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Andressa Pesce é jornalista, doutoranda na PUC-RS