Vou colocar o dedo na ferida. O Jornal Nacional de sábado (5/7), um dia após a classificação do Brasil para as semifinais da Copa, tentou, durante toda sua edição, reforçar a frase de Galvão Bueno de que a falta por trás de Zúñiga foi ”…uma das entradas mais covardes da história do futebol”. Pois bem, não houve quem ecoasse tão retumbante declaração. Na matéria feita em Berlim, a chamada era de que os alemães condenavam a violência do colombiano, mas a única pessoa a dizer isso foi a repórter Ilze Scamparini em seu encerramento.
Houve também uma reportagem sobre os antecedentes do jogador, mas como chegaram à conclusão de que seu passado não o condenava (9 anos de carreira, 1 cartão vermelho e 15 amarelos), saíram-se com a frase: “Nesta Copa fez quatro faltas, duas ontem… Parecia que outro Zúñiga estava em campo. A versão violenta do jogador”.
Já ouvi que nas redes sociais há gente ameaçando a família de Zúñiga. E declarações como a de Galvão não ajudam em nada, muito pelo contrário, julgam e condenam de forma sumária.
A falta foi violenta? Foi.
O jogador colombiano não deveria ter levantado o joelho? Claro que não.
Mas, quantas vezes vejo o lance, tantas não vejo a intenção de machucar Neymar. Vejo como um jogador querendo parar o lance. Evitar um contra-ataque.
Zúñiga foi, na minha humilde opinião, imprudente.
O próprio Felipão, na entrevista após o jogo disse não acreditar na má intenção do colombiano. Só que esta frase o Jornal Nacional de sexta-feira não usou. Preferiu o trecho em que o treinador dizia que já tinha alertado para o fato de que Neymar seria caçado durante a Copa. Na própria sexta, Galvão havia adjetivado a falta como uma entrada criminosa.
Na edição do JN, o colombiano aparece se defendendo, através de um trecho de sua entrevista após o jogo e de uma postagem pelo Instagram, mas no final da matéria o que predomina é a frase do repórter Guilherme Pereira: ”Palavras de quem se despede, mas que dificilmente será esquecido por ter tirado com uma falta covarde o craque Neymar da Copa”.
Vi faltas bem mais violentas nesta Copa que só não tiveram maior repercussão porque não houve consequências mais graves. E até mesmo a fratura sofrida pelo nigeriano Onazi, numa dura entrada do francês Matuidi, não foi classificada tão duramente.
Nosso time também bateu muito no último jogo (31 faltas cometidas). Se faltaram cartões amarelos para os colombianos, também faltaram para os nossos jogadores outros, que além do Tiago Silva poderiam ficar de fora da partida contra a Alemanha. Mas isso não é dito.
Só mais uma pergunta. Se por acaso tivesse ocorrido o inverso… Se a entrada fosse de Fernandinho em James (e olha que foram várias) e o estrago fosse o mesmo… A reação seria idêntica? Os adjetivos também? Ou ouviríamos dizer que foi um lamentável incidente? Que futebol é um esporte de contato. Que Fernandinho é um bom moço e que jamais teria aquela intenção? Tanto que nem levou cartão no lance. Eu não tenho a menor dúvida de que seria assim…
No sábado (6), de 18 reportagens do Jornal Nacional, 13 tiveram Neymar como personagem central. Sem contar a entrevista exclusiva com Luiz Felipe Scolari. O que veremos serão mais e mais notícias sobre superação, sobre a garra brasileira, sobre a união da torcida com o grupo. Logo na abertura do jornal, o mesmo Galvão Bueno disse em tom quase cívico: ”Na terça-feira, cada jogador será um Neymar em campo e cada torcedor será um Neymar na arquibancada”.
Além disso teremos um cerco ostensivo ao menino Neymar e uma cobertura massiva sobre tudo e todos que o cercam. E será assim até o dia 13/7, na final da Copa, se lá chegarmos.
O JN de sábado foi só uma amostra…
(Todos os vídeos citados estão disponíveis no link http://g1.globo.com/jn)
PS: Um exemplo de como de imparcial a mídia não tem nada. Vejam a capa de um jornal colombiano sobre o mesmo jogo. Cada um com seu ponto de vista.
Como questionaram a veracidade da capa acima, reproduzo o trecho do editorial do mesmo jornal na edição de domingo (6/7), no qual justifica os termos chulos utilizados:
“Finalmente queremos referirnos al titular de HOY DIARIO DEL MAGDALENA de ayer en primera página y el cual – por cuenta de nuestros seguidores – le dio la vuelta al mundo entero. Lo hicimos para reflejar el sentimiento profundo de la gente. Porque apadrinamos el concepto de que la libertad de expresión jamás puede ser coartada, ni siquiera por la irreverencia o por lo que algunos moralistas llaman vulgaridad. No. Y la expresión del título, muy española por cierto, manifiesta lo que es común entre ellos para demostrar injusticia, insatisfacción, desagrado, reproche, censura. De tal manera que quienes han aparecido a señalarnos de indecentes en el manejo del idioma y del respeto que debemos tener por nuestros lectores, solo podemos atinar a decirles, gracias por leernos y respetamos su opinión. Y a la inmensa mayoría que nos sigue, nuestros agradecimientos por esa deferencia y generosidad que nos dispensan y nos ánima a continuar marcando la diferencia.”
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Rafael Casé é jornalista