Após ignorar a imensa marcha pró-democracia em Hong Kong na terça-feira [1/7], a imprensa chinesa finalmente se pronunciou – mas apenas para informar sobre as prisões de manifestantes ocorridas no evento. A polícia prendeu 511 pessoas na quarta-feira [2/7] por “obstrução de local público e reunião ilegal”. Segundo a polícia, 25 dos detidos foram liberados sob fiança (mas ainda podem ser processados) e o restante recebeu apenas advertências.
Muitos veículos de comunicação na China reproduziram apenas uma breve nota divulgada pela agência de notícias estatal Xinhua, que dizia que cerca de 500 manifestantes tinham sido detidos, porém sem especificar as razões do protesto.
Na quinta-feira [3/7], o Global Times – jornal do Partido Comunista – estampou a manchete “Polícia de Hong Kong fez a coisa certa ao prender 511 manifestantes” e alertou que Hong Kong poderia vir a experimentar distúrbios semelhantes aos observados na Tailândia ou na Ucrânia.
O editorial sugeria que os protestos eram apoiados pelo Ocidente e pela oposição radical, num esforço para desestabilizar o governo central da China, mas não detalhava as exigências dos manifestantes, como maior participação dos residentes de Hong Kong na escolha do chefe de Estado em 2017.
O Global Times também publicou uma pesquisa de opinião, dizendo ter entrevistado 1.434 pessoas nas principais cidades da China, incluindo Pequim e Xangai. Segundo o jornal, 77% dos entrevistados eram favoráveis a uma participação democrática da população para decidir o futuro de Hong Kong, mas 82% apoiavam o governo e eram a favor de medidas enérgicas para conter os tumultos.
Outro jornal estatal, o China Daily (de língua inglesa), acusou as forças políticas que pedem autonomia plena em Hong Kong de ignorar a realidade econômica local. “Sem o continente, Hong Kong ficaria com apenas metade de seu comércio, com um quarto de seus investimentos estrangeiros e visitantes, isso sem mencionar apenas um décimo de sua água e comida”, dizia o artigo.
Em geral, os veículos de comunicação estatais optaram por focar nas comemorações do 17º aniversário da transferência da administração de Hong Kong do governo britânico para o governo chinês.
Censura nas redes sociais
Na mídia social chinesa, como no site Sina Weibo (rede similar ao Twitter), as opiniões dos internautas se dividiam entre apoio e críticas ao governo. Aqueles que criticavam, no entanto, corriam o risco de sofrer censura.
O ativista online Wu Bin, por exemplo, teve sua conta no Weibo deletada. Wu disse que esta época do ano é duplamente sensível, uma vez que marca tanto o 93º aniversário da fundação do Partido Comunista chinês como a troca de administração de Hong Kong (esta última data acabou se tornando um dia tradicional de protestos na cidade-Estado desde 1997).
Wu não foi o único a sentir tal impacto. O Weiboscope – projeto do Centro de Jornalismo e Estudos de Mídia da Universidade de Hong Kong que monitora a censura às mensagens no Weibo – documentou um aumento acentuado na quantidade de mensagens bloqueadas no dia das manifestações. Dentre as principais palavras censuradas estavam “Hong Kong” e “remoção” (está última em referência à prisão dos manifestantes).
Outros aplicativos populares de trocas de mensagens, como o Line, o KakaoTalk e o Viber, também pararam de funcionar na semana passada (embora ainda pudessem ser acessados via VPN). O Gmail, serviço de e-mail do Google, já havia sido bloqueado na China há algumas semanas.
Os censores também instruíram os sites chineses a remover vídeos que contivessem músicas relacionadas aos protestos, como “Do you hear the people sing?” (Consegue ouvir as pessoas cantando?), do musical Les Misérables, que se tornou um hino nos protestos em Hong Kong ao ganhar uma versão em cantonês.
O nível de censura tem se mostrado tão intenso que rivaliza com o que foi visto em junho, perto do 25º aniversário da repressão sobre o movimento democrático na Praça da Paz Celestial.