Começando pelo autor, Peter T. Knight é um economista americano bastante ligado ao Brasil. Por volta dos anos 1970 conviveu com vários brasileiros que então passavam por programas de doutorado em Economia nos Estados Unidos. Concluiu o dele na famosa Universidade Stanford. Depois, no mesmo país, esteve na Brookings Institution, na Fundação Ford e seguiu carreira no Banco Mundial (BM). Neste alcançou várias posições, entre elas, por alguns anos, a de economista-chefe do departamento que cuida do Brasil. Foi pioneiro na contratação de economistas brasileiros como consultores do mesmo banco. É casado com Zaida, uma brasileira que lecionava Português na Universidade Johns Hopkins, em Washington. Tendo a esposa como “professora particular”, Knight também aprendeu a nossa língua.
Muito focado no seu trabalho, no início dos anos 1990, ainda no BM e então dirigindo uma unidade de treinamento externo voltada para a gestão macroeconômica, levou esse treinamento à Rússia após o fim da União Soviética. Para melhor desempenhar sua tarefa aprendeu a língua local. Nessa mesma época seu interesse passou a concentrar-se nas tecnologias de informação e comunicação (TICs).
Após se aposentar no BM, tornou-se consultor nessa área, inclusive no Brasil. No momento atua na avaliação de projetos estaduais de desenvolvimento de redes de fibra ótica nos Estados do Rio Grande do Sul, Pará, Rio de Janeiro, Tocantins e Sergipe. Também já trabalhou no Acre e no Ceará.
Em 2007 foi o principal organizador de um livrão com 1.004 páginas intitulado e-Desenvolvimento no Brasil e no mundo – Subsídios e programa e-Brasil (São Paulo: Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico e Yendis Editora, 2007), com 40 capítulos escritos por 61 autores, a maioria nomes conhecidos entre os que trabalham com as TICs no País, e cujo lançamento também abordei neste espaço. O termo e-Desenvolvimento diz respeito ao uso intensivo dessas tecnologias para acelerar o progresso socioeconômico de um país e melhorar sua competitividade.
Este ano, em voo solo, lançou A Internet no Brasil – Origens, Estratégia, Desenvolvimento e Governança. Este último termo está muito em voga no noticiário nacional e internacional, pois aqui, como em outros países, muito se discute sobre as regras legais da rede. Vez por outra, como neste período eleitoral, há denúncias de mau uso dela. O livro tem um capítulo dedicado ao assunto, e recorde-se que só em abril deste ano entrou em vigor a Lei n.º 12.965, que define princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. Como é dito que aqui as leis são como vacinas, será preciso ver se essa vai pegar.
“A banda anda”
O livro tem mais sete capítulos que abordam a importância estratégica da internet para o desenvolvimento brasileiro, as origens da internet no País e as instituições que aqui lidam com o assunto, o desenvolvimento da rede nacional, as questões de velocidade, custo e qualidade, o que está sendo feito para melhorar a conectividade, o futuro da internet no Brasil e o lado sombrio da rede (spams, cibercrimes, ciberguerras, quebras de privacidade, dificuldades de vigilância e o caso Snowden).
Knight diz-se um apaixonado pela internet e por onde passa atua como um pregador da e-Transformação, termo que passou a usar em substituição a e-Desenvolvimento. Na prática, essa transformação requer como infraestrutura de apoio um conjunto de extensas redes de fibra ótica, que continuam a se disseminar pelo Brasil. Na apresentação do livro, o autor diz-se decepcionado com os resultados até aqui alcançados, mas não desiste de sua pregação. No capítulo final apresenta suas propostas para novos avanços.
Um aspecto que também me chamou a atenção foi o modo como o livro foi editado, modo esse que por si mesmo revela o enorme avanço das TICs e também da globalização. Foi produzido em inglês e português por uma mesma editora, de nome AuthorHouse, uma subsidiária da mais conhecida Random House, localizada em Bloomington, Indiana (EUA). Soube que todos os entendimentos ocorreram por telefone e via internet. A impressão é feita na Inglaterra, de onde vêm os suprimentos às livrarias. Vi que na Amazon e na Cultura estão disponíveis, em inglês e português, as versões eletrônicas para leitura no Kindle. A versão em português impressa é encontrada nessas mesmas fontes e também nas Livrarias Cultura, em São Paulo, e da Travessa, no Rio.
Seja por seu conjunto como pelos detalhes abordados, trata-se de obra que merece ser mais conhecida pelos interessados no assunto. Sou apenas um usuário muito ligado na rede, mas um de seus maiores especialistas assina o prefácio do livro dedicando-lhe adjetivos como importante e interessante. Trata-se de Vint Cerf, cujo minicurrículo diz ser conhecido como “Pai da Internet”, pois “(…) foi cocriador dos protocolos (…) que governam os fluxos de informação e de pacotes, e da arquitetura básica da internet”. Achei particularmente interessante a menção a que desde outubro de 2005 é vice-presidente e principal evangelista de internet da Google. Ignorava a existência deste último título, que se aplica também a Peter Knight, o principal evangelista de internet que conheço.
E há evangelistas que pregam de outra forma, como Gilberto Gil, nestes trechos de seu cordel “Banda Larga”: “(…) Mundo todo na ampla discussão/ O neurocientista, o economista (…)/ Quem não vem no cordel da banda larga/ Vai viver sem saber que mundo é o seu (…)/ Ou se alarga essa banda e a banda anda/ Mais ligeiro pras bandas do sertão/ Ou então não, não adianta nada/ Banda vai, banda fica abandonada/ Deixada para outra encarnação. (…)/ Rodovia, hidrovia, ferrovia/ E agora chegando a infovia/ Pra alegria de todo o interior (…)”.
******
Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard) e consultor econômico e de ensino superior