Para Warren Buffett, existe uma área onde seu histórico de investimentos é “horrível”, “muito ruim” ou “realmente péssimo”.
O minúsculo grupo de empresas do setor de varejo da Berkshire Hathaway Inc. – que inclui a rede de lojas de doces See’s Candies, a de lojas de móveis Nebraska Furniture Mart e as joalherias Ben Bridge Jeweler – atrai pouca atenção de investidores e analistas, e as empresas são lucrativas.
Mas o setor de varejo continua a confundir o investidor bilionário e seu sócio, Charlie Munger. Há anos eles lamentam seu azar em investimentos no varejo, comentando seus “fracassos” no setor em assembleias anuais e entrevistas. Mais recentemente, a dupla – que tem aversão a apostas em empresas de tecnologia – vem lastimando que a internet esteja mudando rapidamente os hábitos de compra do consumidor e afetando as empresas de varejo nas quais a Berkshire investe, de maneiras que os dois não haviam previsto.
Na assembleia anual da Berkshire em maio, Munger ressaltou que os negócios de varejo estão ameaçados. “Acredito que a nova tecnologia vai ser bastante ‘disruptiva’ […] e o varejo, em particular, enfrentará grandes ameaças”, disse ele.
Todo esse debate sobre as nove empresas, que representam só 2% dos US$ 182 bilhões que o conglomerado fatura por ano, revela como Buffett está ciente dessa rara mancha em seu impecável currículo de investidor.
“Profanamente inteligente”
Buffett não quis comentar.
As dificuldades de Buffett no varejo remontam aos primeiros anos da Berkshire, uma empresa sediada em Omaha, Nebraska, que ele transformou num gigante com US$ 316 bilhões de valor de mercado. Em uma carta aos investidores escrita em 1989, ele disse que um acordo para comprar a loja de departamentos Hochschild Kohn, de Baltimore, tinha sido o maior erro do conglomerado até aquele ponto.
Buffett, que tem 83 anos, disse que o varejo é desafiador porque os hábitos de compra e os canais de venda estão constantemente mudando, dificultando a construção de empresas e a manutenção das vantagens competitivas, o que ele chama de “fossos econômicos”, em alusão aos cercados de água que protegiam os castelos. Ao longo dos anos, Buffett comprou uma série de pequenas empresas de varejo que pareciam ter pelo menos alguma proteção, mas, graças à internet, aqueles fossos correm o risco de secar.
Como muitos outros investidores, Buffett aparentemente não antecipou “essa mudança sísmica na tecnologia”, que acabou transformando a indústria do varejo, diz David Kass, um acionista da Berkshire e professor de finanças na Faculdade de Administração da Universidade de Maryland.
Enquanto critica seu próprio histórico, Buffett é efusivo sobre alguém que ele acredita ter descoberto a chave do varejo anos atrás: Jeff Bezos, da Amazon.com.
No ano passado, quando Bezos negociava a compra do jornal Washington Post da Graham Holdings Co., Buffett, um velho conselheiro do Post, disse ao diretor-presidente, Don Graham, que Bezos era o melhor “líder empresarial da América”, disse Graham na época. Mais recentemente, Buffett chamou Bezos de “profanamente inteligente”.
Um salto significativo em receita e lucro
Não há indicação que Buffett esteja pressionando seus gestores para parecer mais com a Amazon, o que condiz com seu estilo de interferir pouco na administração deles. Mesmo assim, vários disseram que estão tomando medidas para se proteger da concorrência de empresas de internet e escolher empresas fora dos canais tradicionais.
Brad Kinstler, que preside a See’s Candies, diz que a empresa vai lançar um novo site no início de 2015 e que aumentou sua presença nas redes sociais. “Nós estamos nos adaptando ao jeito do cliente comprar”, seja pedindo online e buscando o produto na loja ou mandando entregar, diz Kinstler. O comércio eletrônico representa só cerca de 5% do total de US$ 400 milhões em vendas da empresa, mas está crescendo rapidamente, diz ele.
Ed Bridge, um dos líderes da Ben Bridge Jeweler, diz que está ampliando de forma significativa os esforços de marketing digital para compensar parte da queda no tráfego em shoppings dirigidos às classes média e baixa.
Em 2007, oito empresas de varejo da Berkshire representavam US$ 3,4 bilhões em vendas e US$ 274 milhões em lucros antes de impostos. Em 2012, o faturamento cresceu 8%, para US$ 3,7 bilhões, e o lucro cresceu 11%, para US$ 306 milhões. O grupo de varejo viu um salto significativo em receita e lucro no ano passado, principalmente devido à aquisição da Oriental Trading, que vende adereços para festas, informou a Berkshire.
Marcas de móveis serão pressionadas em 10 ou 15 anos
Buffett não deu detalhes sobre como a web está afetando suas empresas de varejo, mas, na carta anual de 2013, disse que algumas empresas no grupo de produção, serviços e varejo da Berkshire haviam registrado “retornos muito fracos, resultado de vários erros que cometi em minha função de investir capital. Não fui enganado; eu simplesmente errei em minha avaliação das dinâmicas econômicas da empresa ou do setor em que ela opera”.
Mesmo o histórico de investimento da Berkshire em ações de varejistas é ambíguo: grandes apostas no Wal-Mart Stores Inc. e na Costco Wholesale Corp. deram retorno, mas a Berkshire reduziu sua exposição à rede de supermercados britânica Tesco PLC, que vem perdendo mercado.
As quatro marcas de lojas de móveis da Berkshire – Nebraska Furniture Mart, R.C. Willey, Star Furniture e Jordan’s – são pontos positivos no grupo de varejo. Com duas lojas e prestes a abrir uma terceira em 2015, em Dallas, a Nesbraska Furniture Mart teve um salto de 12,5% nas vendas do ano passado ante 2012, para US$ 900 milhões.
Mas apesar do sucesso em mercados locais, “é fácil ver que as marcas [de móveis] da Berkshire serão pressionadas em 10 ou 15 anos” por rivais online, diz Matt McGinley, analista do ISI Group.
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Anupreeta Das, do Wall Street Journal