Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Comunicar a tragédia ou as soluções?

Embora a ciência considere o tema da mudança climática fato consumado, a opinião pública não vê o assunto da mesma maneira.

Uma vez por outra, os painéis intergovernamentais de especialistas que estudam as modificações no clima demonstram que os padrões de produção e de consumo da humanidade são os responsáveis pelos aumentos de temperatura, pelo degelo dos glaciares, pela elevação do nível do mar e pelas alterações meteorológicas extremas.

A maioria dos cidadãos acredita nessas conclusões, mas não percebe imediatamente suas consequências, de maneira que isto se traduza em um modo de agir diferente e, portanto, em uma mudança de conduta radical.

As grandes causas da humanidade levaram à gestação de amplos movimentos que construíram uma massa crítica para mudar o status quo. Do direito ao sufrágio universal, até o casamento entre homossexuais, passando pela luta contra a discriminação racial, todas essas importantes batalhas contaram com fortes movimentos nacionais e internacionais.

O mesmo não está ocorrendo com a mudança climática. Este deveria ser o principal tema do século 21, mas não é isso que acontece. A minha explicação para esse fenômeno é que a comunicação se concentrou no drama ou na tragédia de um futuro sem esperança. Criou-se a tendência de convencer as pessoas, aterrorizando-as, com a mensagem de que se aproxima um futuro de aniquilação, o apocalipse.

Atitude essencial

Ninguém gosta de sentir que o futuro nos escapa, que as forças da destruição são muito poderosas e que aqueles que tentam combatê-las são apenas alguns idealistas sem capacidade de mudar as condições preestabelecidas.

Desde o lançamento do filme do ex-presidente americano Al Gore [“Uma verdade inconveniente”], até vários outros empreendimentos tão emblemáticos como este, não há dúvida de que essas iniciativas contribuíram para chamar a atenção do público. Mas não se converteram em uma plataforma de ação.

De fato, as campanhas que mostram como enfrentar a mudança climática continuam restritas à periferia do ativismo não governamental mais determinado, aos organismos internacionais que têm mandato sobre o tema e, ultimamente, a um promissor desenvolvimento de alternativas sustentáveis no setor privado.

Outro aspecto no qual a comunicação não foi eficaz está associado às chamadas “compensações”, ou seja, a busca constante de um equilíbrio entre desenvolvimento e crescimento econômico, com menos intensidade de carbono para minimizar o impacto climático.

A comunicação não gosta dos tons de cinza: é fanática pelos contrastes e, por isso, não apareceu ainda uma fórmula que permita avançar em uma agenda progressista de desenvolvimento que proteja o clima.

Melhor do que continuar informando sobre o drama climático seria, creio eu, concentrar-se no que funciona tanto em termos econômicos quanto sociais e ambientais.

Dos projetos rentáveis de energia renovável até as campanhas em prol de uma mudança dos padrões insustentáveis de consumo, a comunicação deveria se concentrar nas soluções que podem funcionar com a participação de todos.

As mudanças climáticas devem ser colocadas ao lado das pessoas e das suas necessidades, além de envolver toda a população, porque todos serão beneficiados.

Ao analisar esse tema lembro que, há mais de uma década, o chamado Protocolo de Montreal propôs um desafio semelhante. Esse acordo intergovernamental foi criado para proteger a camada de ozônio contra a sua deterioração causada pelo uso de hidrofluorocarbonetos (HFCs) nos sistemas de refrigeração industrial e residencial.

A questão que se levantava na época incidia sobre como justificar os custos associados à transformação tecnológica sem prestar contas efetivas dos benefícios.

Inicialmente, o esforço de comunicação recaiu sobre os cientistas que explicavam de vez em quando os danos causados pelos HFCs na camada de ozônio e a necessidade de intervir para evitar uma degeneração ainda maior. Era o drama da destruição da camada de ozônio e do Sol aproximando-se progressivamente de nós.

Mas tudo mudou quando um grupo de comunicadores descobriu que se tratava – de fato – de evitar o câncer de pele e o aumento da catarata, produzidos pelos raios ultravioleta que atuavam cada vez com menos filtro, devido à destruição da camada de ozônio.

Desta forma, o Protocolo de Montreal assumiu um rosto humano e a transformação tecnológica nos países em desenvolvimento se converteu também em um ato de cooperação sem precedente entre o Sul e o Norte, a partir da criação de incentivos que tornaram viável a mudança tecnológica necessária para que todos pudessem dar um passo adiante.

Aqui a comunicação foi essencial para concretizar a transformação. Chegou a hora de fazer o que for necessário para promover um desenvolvimento que leve em conta a Terra, a sua população e o clima.

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Sergio Jellinek é gerente de Relações Externas do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe; www.twitter.com/sergiojellinek