No início dos anos 20, um dia, o jovem Ernest Hemingway, debaixo de uma chuva torrencial, corria pelas ruas de Paris à procura de um lugar para se abrigar. Entrou num café na Place St.-Michel.
Depois de pendurar o casaco de chuva, pediu um café au lait, puxou papel e um lápis do bolso e começou a escrever. Aos poucos, foi entrando num estado semelhante a um transe, totalmente alheio ao ambiente que o cercava, enquanto escrevia uma história que mais tarde se tornaria o primeiro capítulo de suas memórias, A Moveable Feast(Paris é uma festa).
Se Hemingway estivesse vivo em 2014, talvez nem acabasse o que começou a pôr no papel naquele dia. Provavelmente sequer teria procurado caneta e papel.
Ao contrário, teria entrado no café, puxado seu smartphone e passado uma tarde inteira na mídia social. Talvez atualizasse seu Facebook para falar do tempo horroroso, tirar uma foto do seu café au lait que postaria no Instagram, e depois perderia a tarde para tuitar.
Eu já fiz isto – sejamos honestos, todos fazem.
Embora minhas primeiras aventuras nos sites sociais fossem divertidas e insólitas, o tempo gasto com estes serviços está me parecendo cada vez mais completamente perdido. Como um vírus que lentamente toma conta de sua vítima, a mídia social começou metodicamente a consumir cada hora do meu dia. O café da manhã, a pausa para o almoço, as horas antes de dormir, anteriormente eram dedicados à leitura, ou mesmo a uma tranquila reflexão.
Agora, é toda hora mídia social. No fim do dia, o que eu posso mostrar? Acaso aquelas duas horas gastas no Facebook me enriqueceram como ser humano? Me tornaram mais realizado graças ao Pinterest? Um ser humano mais profundo graças ao Instagram?
Talvez, mas provavelmente não.
“Se você procurar na história e retirar tudo o que as pessoas estavam fazendo enquanto deveriam fazer alguma outra coisa, não sobrará muito”, disse John Perry, um professor de filosofia de Stanford, autor do livro The Art of Procrastination: A Guide to Effecitve Dawdling (A arte da protelação: Guia eficiente para o ócio). “Entretanto, o tempo gasto vasculhando uma biblioteca, antigamente, levou a grandes ideias. Não está claro se o mesmo se aplica ao tempo passado online”.
Dias de liberdade
Não estou acusando a internet de protelação. Desperdiçar o tempo é algo tão velho quanto a própria história. (Uma primeira referência à protelação foi registrada num livro rabínico do ano 200, em que os estudantes eram instados a não deixarem seu estudo para mais tarde.) Mas critico a internet por sugar as pessoas numa cacofonia de links, vídeos e imagens, agitando-os continuamente diante dos seus olhos como uma espécie de cenoura e bastão digital. Os links que em certo momento parecem engraçados, pouco mais tarde nos fazem sentir algo vazios internamente.
Segundo o Facebook, o 1,23 bilhão dos seus usuários se logam diariamente no site a uma média de 17 minutos. No total, isto corresponde a mais de 39.757 anos do nosso tempo coletivo gasto no Facebook num único dia. E este é apenas um site. Numerosos estudos estimam que costumamos protelar entre os 18 e os 34 anos passam nada menos que 3,8 horas diárias na mídia social. E pessoas entre 35 e 49 anos não estão muito longe disso, acumulando 3 horas por dia nos sites sociais.
Neil Fiore, psicólogo e autor de quatro livros sobre produtividade, disse que, embora a protelação possa ser uma coisa boa, por ajudar a controlar a ansiedade a respeito de um projeto, hoje costumamos protelar nos labirintos online dos quais é difícil sair. Isto, ele afirma, ocorre em parte porque os sites tentam atrair a nossa atenção para permanecermos logados por mais tempo.
O mais alarmante é que algumas dessas empresas também aprenderam que podem puxar as alavancas para afetar nosso estado de espírito.
No mês passado, o Facebook foi duramente criticado com a divulgação da notícia de que seus especialistas em dados manipularam feeds de 689.003 usuários, retirando todas as postagens positivas ou todas as postagens negativas para ver se as emoções das pessoas seriam afetadas.
“Reduzindo-se as expressões positivas, as pessoas produziram menos postagens positivas, e mais negativas; quando as expressões negativas foram reduzidas, aconteceu o oposto”, escreveu no relatório sobre a experiência, Adam Kramer, um especialista do Facebook que pesquisava a expressão da emoção, e acrescentou que o Facebook concluiu que poderia provocar “um contágio em escala maciça por meio das redes sociais”.
Embora se tratasse apenas de uma experiência, e mesmo que o Facebook não manipule continuamente os feeds de notícias, não é preciso ser um pesquisador do Facebook para compreender que eles modificam as nossas emoções.
Por algum tempo, as pessoas andaram tentando evitar as distrações online. Algumas instalam software como SelfControl ou Cold Turkey em seu computador que bloqueia o acesso a determinados sites, inclusive Facebook, Twitter e Instagram. Este mês, uma empresa holandesa sem fins lucrativos lançou uma iniciativa chamada “99 dias de liberdade”, que estimula as pessoas a se absterem do Facebook por três meses para ver se, consequentemente, seu estado de espírito melhora.
Mas, para muitas pessoas, não é tão fácil evitar o site por três meses. A mídia social está entrelaçada com a vida diária, e abandonar Facebook e Twitter equivaleria a deixar de dirigir em protesto contra as empresas petrolíferas, ou abrir mão da eletricidade como objeção contra a política ambiental da Con Edison.
Leitura bem-vinda
De minha parte, optei por uma mudança – embora pequena. No mês passado, decidi tentar minha própria experiência com o Facebook. Em vez de despertar de manhã e mergulhar na mídia social por uma hora ou mais, comecei dedicando as primeiras horas do dia à leitura de um livro.
A experiência aparentemente funciona. Até agora, estou me sentindo muito mais realizado e tenho a sensação de que voltei a ser dono dos meus dias depois que desisti de perseguir cenouras penduradas na minha frente.
Estou lendo dois ou três livros por semana. Esta semana comecei Paris é uma festa. E mesmo que gaste o resto do meu dia com mídia social, tenho a impressão de ter feito algo enriquecedor.
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Nick Bilton, do New York Times