Qual é o impacto do avanço tecnológico sobre a desigualdade? Esse espectro ronda a obra do agora ultrapop economista francês Thomas Piketty. No passado a tecnologia nos tirou de sinucas históricas. Por conta dela superamos a armadilha malthusiana. Mas e para o futuro? Piketty dá pistas sobre o tema, mas esse não é o foco da sua obra.
Para enfrentá-lo vale espiar o artigo de dois professores de Oxford que dizem que na próxima década 47% de todos os empregos dos Estados Unidos serão automatizados (bit.ly/1wNq7Yy). Para entender o porquê, o professor do MIT Erik Brynjolfsson entra em cena.
Ele diz que estamos prestes a entrar em um momento de aceleração exponencial de um tipo muito peculiar de inovação: a capacidade das máquinas de desempenhar tarefas que acreditávamos ser possíveis apenas para nós, humanos, como dirigir veículos, entregar mercadorias, tarefas de linguagem, atendimento médico inicial, e é claro, centrais telefônicas. Ele chama essa nova onda de “a segunda era das máquinas”. Há duas diferenças importantes sobre ela. A primeira é a disponibilidade de um grande volume de dados. Com eles, as máquinas podem aprender em detalhes como fazemos as coisas. Se a desigualdade vai aumentar com o avanço tecnológico, qual a solução?
Investimento crucial
Uma resposta vem da economista Mariana Mazzucato, que foi apelidada de “herege” pela revista “Forbes”. Sua heresia é acreditar que o Estado tem um papel a desempenhar nessa charada. Autora do livro “O Estado Empreendedor”, ela lembra que todas as principais tecnologias embarcadas nos smartphones foram financiadas por recursos públicos: o GPS, a tela sensível ao toque, o sistema de reconhecimento de voz e a própria internet.
Mariana faz questão de reforçar o papel do estado como investidor de risco, e não só como garantidor do investimento dos outros. O setor público costuma ficar com os prejuízos, mas não com o lucro gerado pelo risco. Na visão dela, o Estado deveria perceber o capital gerado pelos investimentos em inovação e assegurar que seja reinvestido.
Em outras palavras, em um mundo regido por robôs, é preciso assegurar que todos sejam um pouco donos deles. Outro ponto é assegurar que o conhecimento seja distribuído da forma mais ampla possível. E, é claro, para isso é necessário investimento (e “empreendedorismo”) maciço do setor público.
Mariana e Piketty concordam nesse ponto. Em momento pivotal do livro (sublinhado por 2.455 pessoas que o leram em formato digital, incluindo o autor deste artigo), o economista francês diz: “A longo prazo, a principal força promotora da igualdade tem sido a difusão do conhecimento e das habilidades”.
Ou seja, a vacina hoje conhecida para a desigualdade futura é investir em educação, inclusive para integrá-la melhor à tecnologia.
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Ronaldo Lemos é colunista da Folha de S.Paulo