Quem não se lembra das grandes enciclopédias ou não tem em casa um acervo desses pesados livros? Recordamos também dos exercícios na escola, que demandavam pesquisas nessas coletâneas e nos faziam viajar pelos verbetes espalhados por inúmeros volumes? Ah!, tempo bom, pelo menos aos com mais de duas décadas de vida. O modelo de estudo não nos tirava das bibliotecas. Hoje, simplesmente com uma única busca no Google e o acesso aos hipertextos – forma de escrita não linear na informática –, tudo se resolve. Tornou-se fácil fazer a “tarefa de casa”.
Não sou avesso à tecnologia, ao contrário, um fascinado com a evolução e abertura de novas possibilidades ao mundo real, nos mais diferentes campos. Todavia, preciso reconhecer que o desenvolvimento do processo tem “desmaterializado” produtos e, consequentemente, sensações e sentimentos. O que reconhecemos no tato, em uma boa parcela, são telas (touchscreen) de nossos dispositivos móveis, dos e-books, bem como o teclado e o mouse do computador.
Desde que o pioneiro da tecnologia da informação Theodore Nelson, em 1960, “abonou” o termo hipertexto, uma série de contradições foi disseminada, entre autores, com relação ao formato em que ele se emprega. Para alguns, o hipertexto só ocorre no ambiente digital. Para outros, pode estar nos impressos e outras mídias sem a utilização do ambiente virtual – jornais, revistas, livros, manuscritos, documentos do Word.
Vou aderir a esse último grupo. Além do contato na educação, considerando esta tipificação, acredito que um dos primeiros hipertextos a que tive contato é um antigo livro de receitas da mamãe, elaborado à mão, que traz os melhores pratos já apreciados e muitos segredos, trocados entre família e amigos. Cheio de anotações e referências, mesmo que sem uma adequada organização, nos fazia migrar de uma página à outra, já que seu índice se limitava a “doces” e “salgados”. Hoje, mesmo digitalizado – do qual tenho uma cópia –, muitas vezes, o exemplar acaba substituído, com todo respeito, por uma “googlada” para as experiências na cozinha.
Fase madura
A multimidialidade gerada no ambiente digital é incrivelmente fascinante. Vídeos e sons casam-se com as letras neste cenário não linear de leitura e nos tornam mais próximos da realidade. Porém, limitam a ousadia e a criação. Entregam tudo pronto. Ao mesmo tempo, são tantos hiperlinks nas páginas, que somos instigados a navegar. Com este efeito hipertextual no ciberespaço, nos sentimos motivados a seguir, sem rota predefinida, com vistas a tornar flexível o espaço e o tempo – hoje tão fragmentado –, em relação à construção da leitura.
Os impressos, por exemplo, em suas notas de rodapé, sumário e nas chamadas de capa de um jornal, ordenam manuseio para localização de página ou exemplar no qual se encontra a informação complementar que facilitará o entendimento do texto. Recordo-me dos estudos nos ensinos fundamental e médio, em Álvares Machado (SP). Se quiséssemos nos aprofundar nas informações, precisávamos percorrer catálogos ordenados alfabética ou numericamente ou, então, através de classes e subclasses, separar os exemplares, para encontrar o conteúdo. A condução era morosa, mas certeira.
O hipertexto digital favorece a navegação em um só clique. O formato on-line permite o acesso a amplo conteúdo, sem ao menos exigir o deslocamento da frente da tela do computador. A multimidialidade nos impulsiona a acessar outras fontes que nos servem de referência. Na educação, por exemplo, amplia a ferramenta de ensino, mas pode nos levar a um caminho sem retorno. O ponto de partida fica tão distante que desnorteia o aprendiz.
Embora estejamos na era “web 2.0”, uma fase mais madura e encorpada da internet, é necessário atenção ao consumo. Qualquer cidadão publica o que quer no ambiente digital (mídias sociais, sites, blogs) e nem tudo é informação de pesquisa. Não vamos considerar o plágio e o “internetês” propagado. Melhor deixá-los para uma próxima abordagem. Ofertar a ferramenta de ensino, mas não ensinar seu uso fará da proposta pedagógica um verdadeiro fracasso.
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Leandro Nigre é jornalista formado, pós-graduando em Mídias Digitais Interativas e editor de O Imparcial, de Presidente Prudente (SP), afiliado à Associação Paulista de Jornais