Venho acompanhando com interesse o Observatório da Imprensa. Desde o começo. Até apoiei no comecinho, com hospedagem em servidor. Me surpreenderam, desagradavelmente, dois artigos da última edição. Ou melhor, o segundo. A impressão que se tem é que o Observatório, como muitos jornais, resolveu colocar lado a lado duas “narrativas”. Caindo na solução fácil de “cada lado tem sua razão”. Como se história não fosse um assunto sério, científico. Fosse uma questão de opinião. Vamos respeitar todas. E assim não informamos ninguém.
O artigo do Mauro Wainstock (“Não sorria, você está sendo manipulado“) é elegante e oportuno. Não ataca ninguém, não toma posição a favor de um ou outro, não escolhe “narrativas”. Mas alerta o leitor: cuidado, você está sendo manipulado. Oportuníssimo: o que vemos na mídia em relação a este conflito são enormes manipulações.
Porém, o artigo de Leneide Duarte-Plon (“Intelectuais judeus franceses e o muro da incompreensão“) toma partido, com força. Mais do que isso. Manipula, pela forma de definir os embates de intelectuais franceses como debate entre “neoconservadores” (o que vem a ser isso?) “judeus” (importa ser judeu ou importa ser intelectual para contribuir com ideias?) “que vieram da esquerda” (além de maniqueísta, caindo no velho esquerda = bom x direita = mau, ou vice-versa) versus… quem? Nem cita o outro lado, subentendido como o lado dos bons, os mocinhos, contra estes intelectuais que “defendem de forma acrítica” (certamente nunca leu Finkielkraut ou Henri-Levy) ideias “indefensáveis” do governo de Israel. Que ideias?
Parece um panfleto
E pronto. Já no terceiro parágrafo é assumido que as ideias são indefensáveis. Claro, vêm de intelectuais que usam forma acrítica. Daí segue o artigo todo. O leito é habilmente posicionado, se acha, sem querer – e sem pensar – no campo dos que são contra neoconservadores, contra aqueles que vieram da esquerda e que, portanto, não são mais de esquerda (só faltou chamá-los de traidores).
Continua com referências ao direito internacional, a “novas agressões de Israel ao gueto palestino” e até cita – impropriamente – o caso Dreyfus, que deveria ser, ao contrário, uma referência. Não há, neste artigo que fala de defender de forma acrítica, a menor referência a outras opiniões, a visões diferentes, ou simplesmente aos fatos do conflito no Oriente Médio. É só tomada de posição e ataques àqueles que têm posição contrária à da autora. Ataques não às ideias deles, que ela não menciona, mas à pessoa deles.
Um dos citados, do lado dos mocinhos no artigo, qualifica Finkielkraut de fazer “reflexão tão grotesca quanto iníqua” e de “caricatura de filósofo”. E o artigo continua nesta linha. Referência às ideias que estão sendo criticadas? Nenhuma. Só o horror diante da iniquidade do outro, que por ser outro é o bandido. Discussão? Nada. Debate? Nada. Só ataque. Informação ao leitor? Zero.
Mais parece um panfleto. Agora pergunto: como o Observatório da Imprensa, cuja função é justamente denunciar mau jornalismo, publica um texto destes?
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Geraldo Coen é consultor em TI