Poucos curtiram mais postagens no Facebook do que a Folha na quinta-feira (14) e na sexta-feita (15). Mil novas páginas foram adicionadas ao feed de notícias e todas as atualizações de amigos e empresas que apareceram na linha do tempo ganharam o nosso “curtir”. Tudo para descobrir como as escolhas oferecidas pela rede social são capazes de alterar um perfil em 48 horas.
O experimento foi idealizado pela revista americana “Wired” e a Folha decidiu replicá-lo no país. O resultado é a transformação da linha do tempo em um ambiente inóspito, dominado pelas empresas que pagam para ter destaque na sua tela ou que mais se relacionam ao seu perfil.
Para chegar a esse ponto, a reportagem seguiu estritamente as orientações do algoritmo do Facebook, sistema que sugere postagens, páginas e propagandas. As indicações são feitas com base em perfil montado a partir do comportamento do usuário.
“À medida que se curte, comenta ou compartilha uma postagem, o algoritmo entende que certo tipo de conteúdo é importante para você. E a frequência com que ele aparece se altera”, afirma Camila Fusco, diretora de comunicação do Facebook Brasil.
Mas, testado em condições extremas, o resultado do algoritmo é pouco animador. De mil páginas adicionadas nos dois dias de experimento, poucas conseguiram partilhar algum tipo de conteúdo na disputa pela linha do tempo da reportagem. Dessas, cerca de dez se tornaram prioridade para o código e retornavam sempre para ganhar novos “curtir”.
Social?
Com o passar dos cliques, as amizades foram desaparecendo. O Facebook passou a ignorar quase todas as postagens dos 1.107 amigos do perfil usado na experiência. Ao fim do processo, a reportagem teve de passar por 138 anúncios e postagens de páginas para achar a primeira publicação original de um amigo.
O resultado surpreendeu a diretora de conteúdo Larissa Magrisso, da W3haus, agência de comunicação responsável por ações promocionais de marcas como O Boticário e Volkswagen.
Segundo ela, o Facebook argumenta que é preciso haver igualdade entre as publicações de amigos e o espaço das empresas. Esse procedimento limita o espaço publicitário e determina os preços dos anúncios.
“Ele [Facebook] diz que precisa ter um mínimo de postagens de amigos”, diz, “mas talvez o feed tenha interpretado que há maior interesse por marcas que por pessoas.”
O Facebook diz não fazer distinção entre as publicações criadas por pessoas e o conteúdo veiculado por empresas. “Páginas e amigos são exatamente iguais para o sistema”, afirma Fusco.
Para ela, as pessoas desapareceram da linha do tempo porque o número de curtidas em postagens de páginas pode ter sido superior à interação com os amigos.
A diretora de comunicação também diz que algumas empresas tiveram visibilidade constante porque, no decorrer da experiência, acabaram recebendo mais curtidas daFolha e, portanto, foram classificadas como sendo de maior importância.
“É impossível você interagir com todas as novas páginas ao mesmo tempo e com a mesma intensidade.”
Por outro lado, o perfil se tornou mais visível para os amigos, que passaram a acompanhar em seus feeds os milhares de curtidas. Alguns dos quais foram constrangedores e pareciam “curtir” o luto de um país.
“Nesse caso, o botão é um sinal de apoio, de que você leu e quer interagir de alguma forma”, diz Magrisso.
Sistema
O grande diferencial do Facebook em relação aos concorrentes é a capacidade de analisar uma base de 1,32 bilhão de usuários e atrair companhias que desejam acessar nichos de consumidores.
Só no Brasil, são 87 milhões de pessoas analisadas pela rede social por mês, 64% das quais a acessam todos os dias. Capaz de localizar e enquadrar pessoas em alvos comerciais, o código gerou US$ 2,68 bilhões em receita com publicidade para a companhia no segundo trimestre.
Nem o segredo de Mark Zuckerberg (presidente-executivo do Facebook), porém, é perfeito. No teste, a rede apresentou erros ao tentar categorizar um perfil mutante, que curtia tudo. E passou a oferecer publicidades direcionadas a um americano para um morador de São Paulo. Por três vezes, as sugestões de páginas a curtir acabaram.
O algoritmo ainda sugeriu que a reportagem curtisse o ator Jackie Chan como referência de pessoa que causa inspiração, ainda que a opção já tivesse sido selecionada. “Trabalhamos para que o sistema seja o mais perfeito e alinhado, mas é possível que erros apareçam”, diz Fusco.
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Renato Oselame, da Folha de S.Paulo