Foi com muita surpresa que recebi a notícia sobre a morte de Eduardo Campos. Moro fora do país e meu acesso à informação foi via TV espanhola, em pleno telejornal. Tentei entender o que se passava. Era somente uma nota, não conseguia saber exatamente o que aconteceu. Como muitos, perguntava: será que é verdade? Pela internet, constatei. Sim. Veio, então, o susto, talvez o mais característico traço humano de um jornalista.
Como jornalista, sociólogo, professor e, acima de tudo, brasileiro, sabia a comoção em que a população e os meios de comunicação cairiam nos dias seguintes. Dito e feito. Pauta, muita pauta. Não que não devessem explorar a notícia, mostrar o lado humano e, notavelmente, em tempos de corrida eleitoral para a Presidência, o lado político da coisa. Especulações. Dúvidas e incertezas. Como ficarão as pesquisas? Quem ganha? Quem perde?
Mas, acima de tudo, o elemento humano, a vida de uma pessoa, de uma figura pública, político – independente de minha filiação – estava em jogo. A morte de um político às vésperas das eleições une nas pautas jornalísticas, de um lado, a questão humana; de outro, a política. Acho que é a oportunidade certa para tratar da política com humanidade, levando em conta as vidas humanas daqueles que disputam uma corrida eleitoral. Justo. Ao lado da incerteza na caminhada até o Palácio da Alvorada, o sofrimento de uma família um tanto tradicional de Pernambuco. Como separar os dois lados? Sinceramente, não sei.
Debate raso
Todavia, embora jornalisticamente talvez não consiga fazer com tamanha precisão a separação do elemento humano com o elemento político, como na morte de Eduardo Campos, percebo quando os dois se juntam de forma que considero um tanto capciosa. O exemplo claro está no artigo de Valdo Cruz, da Folha de S.Paulo, publicada na segunda-feira (18/8, ver aqui). Trata de Marina como “sonhática” que, definitivamente, adquire adornos de apelos à personagem mais que propriamente às suas qualidades políticas. Inconsistentes ou não, a até então vice do PSB teve inúmeras divergências políticas que a fizeram sair de Ministérios e de outros partidos. Concordando ou não com suas convicções, creio ser minimamente justo tratá-la como uma pessoa que as possui.
Ademais, Valdo Cruz apresenta Marina como oportunista ao dizer que viu o sonho de ser presidente escapar de suas mãos. Ora, assumir o maior cargo do Brasil – quiçá da América Latina – não é o mesmo que ser presidente do grêmio estudantil. Além disso, não convém falar em destino colocando a luta pela Presidência novamente em suas mãos. Todos sabemos que Marina é evangélica e que um tom como este pode soar um tanto apelativo, a ponto de comover parcelas do eleitorado evangélico. Daí, a grande mídia, possuidora das ferramentas para promover um debate político fundamentado, foge às suas próprias responsabilidades quanto a isso – mas, por hora, isso é conversa para outros textos.
No mais, a sensação que fica após a leitura do texto de Valdo Cruz – e imagino que muitos outros jornalistas devem estar fazendo o mesmo – é a de que a “divina providência” atua em favor de Marina Silva. Parece roteiro de Hollywood com Whoopi Goldberg fazendo o papel principal: o de uma candidata aclamada pelo povo que milagrosamente se toca que deve votar nela. Valdo Cruz, sinceramente, não dá!
Notem que sequer menciono alguma coisa quanto ao fato de o repórter da Folha se referir à família Campos como aquela capaz de dar vida especial ao Palácio da Alvorada – algo que, notavelmente, endossa a minha perspectiva apresentada acima, de deixar o debate político, das eleições presidenciais, em um patamar extremamente raso. Isso é prejudicial para o próprio jornal, prejudicial para a imprensa como um todo, prejudicial para a política e, principalmente, prejudicial para o leitor. Novamente, voltamos em ponto já mencionado por mim antes neste Observatório da Imprensa (ver aqui), o de o leitor estar sendo subestimado.
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Wallace Faustino da Rocha Rodrigues é professor e jornalista