O mais recente número da Revista Brasileira de Inovação, publicado em julho, traz a íntegra do documento Science The Endless Frontier, elaborado nos Estados Unidos na década de 1940 e que forneceu as bases para a organização do sistema de pesquisa norte-americano.
Com grande impacto na comunidade científica global, o documento foi utilizado por pesquisadores brasileiros nas propostas à Assembleia Constituinte de 1947 que resultaram na criação da FAPESP.
O texto de apresentação da edição da revista, assinado por Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, destaca a relevância atemporal do documento, preparado por Vannevar Bush, então diretor do Escritório de Pesquisa Científica e Desenvolvimento (Office of Scientific Research and Development) dos Estados Unidos, para o presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt.
Em carta entregue a Bush um ano antes, Roosevelt revelava preocupações que apontavam para a necessidade de se organizar um sistema de ciência e tecnologia mais moderno e estruturado do que aquele que havia no país antes da guerra.
Foi formulada, então, uma proposta legitimada por debates entre reconhecidas lideranças da pesquisa acadêmica e industrial nos Estados Unidos em torno de ideais de liberdade acadêmica, valorização da pesquisa básica e autonomia da agência de financiamento.
“O fato é que o sistema de pesquisa nos EUA e na maior parte dos países do mundo era pouco estruturado antes da Segunda Guerra Mundial. Raros países tinham agências nacionais de fomento à pesquisa e poucas universidades se envolviam em pesquisa”, explica Brito.
Contexto histórico
O documento formulado por Bush também reconhece certa urgência por autonomia na pesquisa norte-americana em relação à europeia no pós-guerra. “Não podemos mais contar com a Europa, destruída, como fonte de ideias fundamentais”, alertava.
Diante disso, foi sugerida a organização do sistema de pesquisa envolvendo indústrias, universidades, laboratórios e o governo – este como planejador e financiador, mas destacando que “a liberdade de pesquisa deve ser preservada”.
O documento apresenta definições e orientações que fundamentaram a política científica dos Estados Unidos, valorizando a pesquisa básica, definindo as universidades e os laboratórios governamentais como suas principais sedes, reconhecendo o papel da indústria, defendendo incentivos fiscais e patentes e propondo um sistema de bolsas para estudantes de graduação e pós-graduação, com foco na seleção por mérito e em melhoramentos no ensino de ciências.
Science The Endless Frontier propôs ainda a criação de uma “National Research Foundation” para apoiar a pesquisa básica em Medicina e Ciências Naturais e o treinamento de pessoal em pesquisa, defesa nacional e cooperação científica internacional – ideias que encontraram terreno fértil nas transformações pelas quais o mundo passava.
“O relatório Bush formulou muito do que estava acontecendo, mas as condições objetivas estavam dadas para o desenvolvimento do apoio governamental à ciência em quase todo o mundo. Nos Estados Unidos, o advento da guerra fria acelerou fortemente o protagonismo governamental e, com isso, a pesquisa básica, a pesquisa aplicada, o desenvolvimento tecnológico e a inovação se desenvolveram a uma velocidade nunca antes vista em outros países”, considera Brito.
A apresentação do contexto histórico e social do relatório Science The Endless Frontier e a íntegra do documento (em inglês) podem ser acessadas na página da Revista Brasileira de Inovação, assim como os artigos e demais conteúdos da edição.