Dez anos depois de começar a vender produtos para empresas, o Google anunciou ontem um reforço na estratégia para a área. A princípio, a novidade parece meramente cosmética: o nome da divisão responsável por essas ofertas passou de “Google Enterprise” para “Google for work”.
Mas o novo posicionamento também é um sinal de que a companhia não enxerga o mercado corporativo apenas como uma atividade acessória ao seu negócio principal, e que quer conquistar mais espaço no orçamento das empresas, tirando receita principalmente da Microsoft. Esta domina as duas áreas que o Google tem dedicado mais atenção: e-mails e edição de textos, planilhas e apresentações. “É um novo capítulo da história”, disse ao Valor, Rajen Sheth, gerente de produtos da unidade, em entrevista por telefone.
Nesse novo momento, disse, a ideia é aproveitar a maior familiaridade das empresas em geral com o conceito de computação em nuvem, pelo qual as companhias acessam seus sistemas por meio de uma conexão à internet, sem ter que fazer grandes investimentos em infraestrutura.
O modelo, que há uma década parecia algo complicado e inseguro, fica cada vez mais popular, com companhias iniciantes e também gigantes como Microsoft, Oracle, IBM e SAP investindo na “nuvem”.
A estimativa é que o mercado movimentará quase US$ 250 bilhões no mundo em 2017. Foram US$ 150 bilhões no ano passado, segundo a empresa de pesquisa IHS. No Brasil a estimativa é que os valores passem de US$ 330 milhões para US$ 1,1 bilhão no mesmo período, segundo a empresa de pesquisa Frost & Sullivan. O que o Google quer é aproveitar seu histórico para garantir para si uma fatia desse bolo. “Somos uma empresa nascida na nuvem e isso faz muita diferença”, disse Sheth.
Hoje, a companhia cobra entre US$ 50 e US$ 120 mais impostos por usuário de seus serviços. Com isso, estima-se que pouco mais de 1% da receita global do Google venha do mercado corporativo. Para a empresa de pesquisa Gartner, o percentual pode chegar a 5% em 2017. Sem abrir números, Sheth diz que a fatia ainda é pequena na receita total do Google, mas isso não é, necessariamente, um problema. “Se o Google continuar crescendo como vem acontecendo, ficarei feliz de ser uma pequena parte do resultado”. Em 2013, a receita da companhia foi de US$ 59,73 bilhões, um crescimento de 19,56% em relação a 2012. Mais de 90% da receita do Google vem da venda de publicidade na internet.
Um sinal
Trabalhando com produtos corporativos no Google desde os primeiros momentos da divisão, Sheth é considerado o pai do mais conhecido deles, o Google Apps. O pacote, que inclui o e-mail do Gmail e programas de edição de texto, planilhas e apresentações, disputa espaço com o Office e o Outlook, da Microsoft. Apesar de continuar como o carro-chefe, o Apps não está sozinho. Além dele, o Google também oferece às empresas serviços para armazenamento de dados (Google Drive) e sistemas de geolocalização. Com a mudança de nome da divisão, a companhia quer reforçar que a suas ofertas são mais do que mero substitutos dos produtos da Microsoft. “É uma oportunidade para mandar uma mensagem de que a empresa está em sintonia com o mercado, com as novas tecnologia”, disse ao Valor Antônio Schuch, diretor da área corporativa do Google para América Latina
Hoje, o número de empresas clientes do Google passa de cinco milhões. É mais que o dobro que o registrado há quatro anos. Entre os nomes estão o banco BBVA, a seguradora SulAmérica, a fabricante de eletrodomésticos Whirlpool e sua subsidiária Embraco. “Tenho recebido diversos contatos de outros executivos para entender como está o uso na Whirlpool”, disse ao Valor, Renata Marques, diretora de tecnologia da companhia para a América Latina.
A fabricante concluiu em julho a adoção dos produtos do Google. Em todo o mundo a mudança afetou 27 mil funcionários. Na América Latina foram 5,6 mil. De acordo com a executiva, o processo envolveu um trabalho intenso de comunicação sobre as mudanças que iriam ocorrer para que não houvesse sustos ou perda de produtividade quando a mudança ocorresse. Segundo ele, algumas dúvidas surgiram no começo, mas hoje, o serviço de suporte já é bem menos demandado. “Por fim, o uso que a maior parte das pessoas faz dos programas é básico. E muita gente já usa serviços do Google fora do trabalho”, disse.
Mas nem tudo são flores para a companhia de internet. Um dos principais casos de sucesso da empresa no Brasil, a Anhanguera Educacional, deixou de ser cliente neste ano. Com a fusão com a Kroton, o pacote Office, da Microsoft substituirá o Google. A mudança é só um sinal de que a dona do Windows, que também tem investido pesado na computação em nuvem, continua no páreo e não deixará o Google ganhar espaço em mais essa área de negócios.
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Gustavo Brigatto, do Valor Econômico