Em palestra proferida em interessante Seminário sobre Eleições e Pesquisas Eleitorais promovido pelo Tribunal Eleitoral do Rio Grande do Sul (TER-RS), o jornalista e escritor Flávio Tavares fez considerações que julgo importantes neste momento. Flávio Tavares, para quem ainda não sabe, participou, como jornalista e militante politico, dos episódios mais importantes da história recente do estado gaúcho e do Brasil. Estava no palácio do governo gaúcho com o governador Leonel Brizola quando do episódio da Legalidade, movimento que teve papel decisivo na posse de Jango Goulart em 1961, e foi preso, torturado e um dos prisioneiros políticos trocados pelo embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick em 1969.
Ele começou sua fala questionando a denominação de Instituto dada a estas empresas privadas de pesquisas eleitorais. Para ele, estas empresas, como todas as empresas, visam primordialmente ao lucro. Se disso advier como efeito colateral algo que possa ser qualificado como bem público, tudo bem. No seu entender, fundamentalmente, isto significa que para estas empresas privadas o bem público, a obrigação com a isenção, imparcialidade e objetividade dependem e estão a reboque de algo maior, que é a busca de vantagens monetárias.
Depois discorreu sobre outros pontos como o que significa a política e os políticos contemporâneos em comparação com outras épocas, apontando o grau de mediocrização reinante como decorrente do protagonismo do marketing, em especial o papel crucial do marqueteiro em uma campanha política e, por igual, das chamadas pesquisas eleitorais.
“Cavalo do comissário”
Disse ele que hoje, mais do que nunca, prepondera a candidatura que passar não o melhor projeto, a melhor ideia, mas a melhor imagem ao leitor. Igualzinho à estratégia de venda de sabonete ou outro produto de consumo qualquer que consegue ser o preferido dos consumidores graças a uma boa campanha de marketing. A coisa, segundo ele, tomou tal vulto que o atual candidato a governador pelo PMDB em São Paulo, Paulo A. Skaf, um empresário várias vezes presidente da austera Fiesp – portanto, alguém com uma imagem pública de responsabilidade e seriedade –, de repente, por sugestão de seu marqueteiro, aparece no horário politico exortando ser um candidato com tesão. Provavelmente, o “bruxo” marqueteiro viu aí a possibilidade de angariar votos na periferia. Não contava ele com o fato de que isso abriria “uma avenida” para a galhofa. Tesão, diz Flávio Tavares, como todos sabem, no imaginário popular tem conotações sexuais fortes. Digo eu: um “tiozinho” que sempre posou de líder executivo sério e responsável querer posar de “mano” – para usar uma imagem paulista – é um tiro pela culatra. Não funciona, justamente por ser algo tão paradoxal quanto o Tiririca. Aqui a questão é imagem. Tiririca foi um parlamentar atuante e, segundo informações de jornalistas que acompanham o dia-a-dia da Câmara Federal, apresentou bons projetos, inclusive na área da educação – posar de executivo.
Disse mais, sobre a forma de indagação: qual a contribuição qualitativa do marketing à política? E ele mesmo respondeu: nenhuma, ao contrário, degradou a politica ao eleger deputados, prefeitos, vereadores, governadores, que de bom, de qualidade, só têm a campanha de marketing. Ideias, projetos, que é o que importa na política, são elementos estranhos e desconhecidos a muitos destes que não são nada mais do que “produtos” de campanhas de marketing bem-sucedidas. Penso que disso decorre um efeito perverso dado que pessoas como as acimas descritas, cuja única qualidade é o charme fotogênico, além da habilidade em velhacaria e apetite para a notoriedade instantânea, só podem resultar em lideranças totalmente desqualificadas e desideologizadas para o desafio cada vez mais complexo que o mundo contemporâneo exige. Aliás, um dos recursos de marketing mais usados pelos políticos “produtos” hoje é dizer que detestam a política e os políticos, para agradar o eleitor/ consumidor adestrado pela grande mídia a culpar esta nova Geni pelo “atual estado de coisas” e assim desviar das reais causas degradantes da política e dos políticos, mas isso é outra conversa.
Flávio Tavares faz a mesma indagação quanto à importância da pesquisa eleitoral para a qualificação da política e não encontra, por igual, resposta positiva, ao contrário. Conhece-se bem o mal irreversível que as pesquisas eleitorais fazem ao afugentar o eleitor do candidato que tem boas ideias, mas que não consegue avançar nas pesquisas por vários motivos, entre os quais não possuir recursos financeiros e um bom esquema de marketing. A tendência do eleitor em votar num candidato vencedor torna o seu voto menos um voto consciente do que algo interessado apenas em ganhar a eleição. Substitui a importância e a nobreza do voto consciente pela mesquinhez do apostador no “cavalo do comissário”, aquele que sempre vence, como ele bem ilustrou. Ressalte-se que aqui não se trata do voto útil em eleições de segundo turno, que tem sua importância por representar “dos males o menor” e ser um voto onde ainda, no meu entender, remanesce um juízo de valor, mensurador das qualidades politicas, ideológicas e, por consequência, dos interesses que representam os candidatos em disputa.
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Jorge Alberto Benitz é engenheiro e consultor