Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quando o meio vira mensagem

Colunistas de alguns dos principais jornais do país celebram sem disfarces o soluço registrado na mais recente pesquisa do Ibope, que dá ao candidato do PSDB, Aécio Neves, uma esperança de recuperar em 18 dias um lugar no eventual segundo turno das eleições presidenciais. Um deles faz contas de padeiro para concluir que, se acelerar seguidamente, com um novo salto na semana que vem, o ex-governador de Minas Gerais pode chegar ao dia 5 de outubro em condição de empate com a ex-ministra Marina Silva, do PSB. A partir daí, calcula o jornalista, fazendo coro com representantes oficiais do PSDB, a militância trataria de trabalhar o argumento do chamado “voto útil” contra a reeleição da presidente Dilma Rousseff, para ocupar o vazio deixado pela queda da candidata do PSB.

A matemática é linear e simplista, mas é o que basta para animar o tucanato, entre os quais se aninham nove entre dez colunistas e articulistas dos diários de circulação nacional.

Nas fileiras do PSB, a convicção, pelo menos nas declarações diante de jornalistas, é de que Marina Silva já está no segundo turno. Por esse motivo, segundo a imprensa, representantes do partido já buscam potenciais desertores do PMDB para acertar detalhes de uma futura aliança.

A frase do dia afirma que “ninguém governa sem o PMDB”. Por extensão, pode-se dizer, também, que ninguém governa sem o PDT, o PTB, o PSD e toda a floresta das siglas que balançam de lá para cá a cada eleição.

Essa prática desmoraliza o discurso da “nova política”. Por outro lado, a movimentação da imprensa em favor da candidatura de Aécio Neves é desautorizada pela iniciativa de economistas ligados ao PSDB que, segundo o Globo, tratam de modelar uma série de propostas que poderiam aproximar os tucanos da candidatura de Marina Silva, no caso de haver um segundo turno.

Mais pragmáticos, os economistas tucanos tratam de enxertar no ideário do PSB os princípios do liberalismo econômico que norteiam o PSDB. Consideram que o PSDB não teria alternativa num segundo turno a não ser apoiar a ex-ministra do Meio Ambiente, e a iniciativa busca estabelecer o preço desse apoio.

Manobrando no vácuo

Enquanto, de um lado, os porta-vozes da campanha ajustam as mensagens que podem definir o curso final dos votos ainda voláteis, a imprensa faz o que tem feito nas eleições dos últimos 12 anos: tenta manter no páreo seu candidato predileto, sem queimar as pontes que podem uni-lo à alternativa menos indigesta. Assim, uma página critica os ataques da campanha do PT a Marina Silva, enquanto outra página observa que, ao chorar diante das câmeras, a ex-ministra mostra uma fragilidade inaceitável em quem pretende se tornar chefe de Estado.

A análise do noticiário que se segue à divulgação da pesquisa mais recente mostra um padrão recorrente da mídia tradicional: trata-se de interpretar os números sempre num sentido favorável à candidatura que a imprensa apoia sem disfarces. Os jornais não querem, em nenhuma hipótese, a reeleição da presidente da República, e tentam manobrar a candidatura do PSB na medida certa para que funcione como um instrumento contra a adversária comum. Quando, circunstancialmente, se percebe que o candidato predileto tem um fio de esperança, cresce o viés negativo da imprensa contra Marina Silva.

A situação lembra as cenas finais do filme “Gravidade”, quando a astronauta interpretada por Sandra Bullock usa um extintor de incêndio como foguete para navegar até uma estação orbital, de onde pode voltar à Terra. Como a doutora Ryan Stone do filme, a imprensa tenta se direcionar no vácuo de credibilidade em que se meteu desde que passou a se comportar como uma agremiação partidária.

Acontece, que, sem a densidade necessária, um impulso a mais para lá ou para cá pode produzir um desastre, do ponto de vista do interesse específico das empresas de comunicação.

A expressão “o meio é a mensagem”, criada em 1964 pelo teórico da comunicação Marshall McLuhan, sintetiza a ideia de que os controladores da mídia procuram dar ao público o que o público deseja, usando o poder do meio para condicionar a mensagem.

A mídia tradicional do Brasil subverte esse princípio, sessenta anos depois, e tenta dar ao público o que seus controladores desejam.

Será que funciona?