Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Geração ‘youtuber’ ganha dinheiro

Eles são como o Cristiano Ronaldo ou o Messi do planeta YouTube. São jovens que mal chegaram aos 20 anos de idade e que adotam codinomes como Vegetta 777, El Rubius, WillyRex, Wismichu, Celopan, TiparracoSA, TheDiamondMinecart e PewDiePie. São um fenômeno de massa nesse submundo em que às vezes a Internet se transforma. Alguns – poucos – ganham milhões; outros, cada vez mais, conseguem uma renda mensal entre 2.700 e 15.000 reais postando vídeos caseiros no YouTube, acompanhados de seus comentários, piadas e análises. É o fenômeno youtuber, um movimento mundial que já atraiu o olhar de grandes produtoras de televisão, que veem nessa plataforma o mesmo êxito que os videoclipes musicais tiveram nos anos oitenta.

Para centenas de milhares de jovens a vida acontece no YouTube. Atualmente, o portal atrai mais de 1 bilhão de visitantes por mês, que dedicam 6 bilhões de horas aos vídeos ali colocados. Segundo a consultora OpenSlate e o site especializado na indústria audiovisual Tubefilter, só em julho os 100 canais mais vistos do YouTube cresceram 80% em visitas, em comparação ao mesmo mês no ano passado. A própria empresa, muito relutante a divulgar números, afirma que “o faturamento dos partners [como chama quem gera negócio através dela] subiu 60% entre 2012 e 2013”.

Talvez para esses jovens youtubers as cifras soem distantes, mas eles sabem que o negócio é real. “Na Espanha, é possível ganhar de 0,20 a 1,20 dólares (de 0,48 a 2,83 reais) a cada 1.000 visitas”, afirma Pedro Ricote, diretor-geral da Boomerang Live, produtora especializada no assunto. Parece pouco? Não quando alguém acumula 3 milhões de visitas. Segundo a OpenSlate, o PewDiePie, alterego de Felix Kjellberg – gamer sueco especializado em comentar partidas de videogames – acumulava em julho passado mais de 5,5 bilhões de acessos, enquanto o espanhol Vegetta 777 (pseudônimo de Samuel de Luque) supera 1,1 bilhão.

“É verdade que dá para viver, mas não se ganha a fortuna que as pessoas pensam”, diz Jesús Casabón, que se esconde atrás do apelido TiparracoSA. Ele é dono do maior canal de piadas e câmeras escondidas da Espanha, acumulando 5 milhões de visitas, e admite que só pensa no YouTube. Porque se há algo que define essa profissão de youtuber é a obsessão. David Calvo (codinome Celopan) afirma que “não se preocupa muito com o amanhã”. Com seus 18 anos recém-completados, suspendeu seus estudos de publicidade. Vive de seu canal de gameplays, que acaba de ultrapassar a marca de 500.000 assinantes e de 8 milhões de acessos. Ou seja, está começando a ser rentável.

Apesar disso, é difícil precisar esse faturamento. Basicamente porque os próprios youtubers não divulgam números. Todos se protegem em um acordo de confidencialidade com o site. Mas alguns veículos, como o siteThe Richest, fazem seus próprio rankings. Segundo a página, PewDieDie, da Suécia, detém o maior faturamento acumulado (7 milhões de dólares). É seguido por Yogscast, do Reino Unido (6,7 milhões de dólares), Smosh, dos EUA (5,7 milhões), DisneyCollectorBR, dos EUA (5 milhões) e BluCollection dos EUA (4,8 milhões).

Ismael Prego, de 20 anos, criador do canal Wismichu, na Espanha, faz seus cálculos. “Se você quer viver bem nesse meio precisa de 500.000 assinantes; ou seja, cerca de 100.000 acessos por mês”. Por enquanto, ele já tem 1,48 milhão de seguidores e soma 12 milhões de visitas. Forma parte da elite youtuber espanhola. Dentre os que ganham fama e dinheiro no país estão El Rubius (8,35 milhões de assinantes até a última quinta-feira), Vegetta 777 (6,9 milhões), WillyRex (4,2 milhões), JPelirrojo (502.772), YellowMelloMG (472.814) e Loulogio (444.685).

Mas seria injusto contar a história dos youtubers apenas com números, porque ela também fala, e muito, de criatividade, trabalho (alguns jovens dedicam 12 horas por dia aos seus canais) e talento para se conectar com uma audiência que tem entre 15 e 21 anos. São vozes de uma nova geração. Um tempo diferente que “salta as barreiras convencionais”, diz Leandro Pérez, organizador do iRedes, um encontro internacional de redes sociais. “Antes os meninos queriam ser jogadores de futebol, agora querem ser youtubers”, afirma, talvez com exagero, Pedro Ricote. Mas há um certo fundo de verdade. Héctor Zamarriego é criador do canal Hectoreshector (400.000 assinantes e 25 milhões de acessos). Construiu sua plataforma entrevistando outros youtubers. Começou em 2011 analisando videogames e mais tarde encontrou sua linguagem própria. “Não sabemos quanto tempo isso vai durar. Talvez seja algo temporário, como foi o Terra diante do Google”, diz esse estudante no início do curso de Comunicação Audiovisual. “Mesmo assim, tenho cada vez mais vontade de postar vídeos”.

Por causa dessa paixão, uma infinidade de empresas perceberam a oportunidade de utilizar esses jovens como avalistas de marcas. De fato, muitos fabricantes de videogames que antes não queriam associar seus produtos aos youtubers – pelo risco de perder o controle sobre as mensagens – agora os perseguem. “Nossos consumidores adoram o mundo digital, por isso as campanhas e as experiências da marca têm uma forte presença nesse meio”, explica um assessor da Nike. A ligação é forte. Luis Regalado, de 16 anos e estudante do ensino médio, conta que nas férias passa de quatro a cinco horas por dia seguindo El Rubius, WillyRex, Vegetta 777 e Puncho Deistar, alguns de seus youtubers favoritos. E diz que no Natal vai pedir de presente uma placa de captura do Playstation para criar seu próprio canal. “É um fenômeno extremamente forte que, com algumas mudanças, vai se sustentar a longo prazo”, afirma Cristina Bonaga, gerente na Espanha da produtora Divimove, que representa algunsyoutubers famosos.

Agora a indústria tradicional está avançando. A Disney pagou 950 milhões de dólares pela empresa norte-americana Maker Studios, uma das principais redes que agrupa canais de youtubers. E a californiana Fullscreen, que tem mais de 40.000 canais no YouTube, é um objeto mais do que tentador para as grandes corporações. Nos Estados Unidos, vive-se uma febre na busca de talentos para a plataforma. Por isso os espanhóis WillyRex e Vegetta 777 se mudaram para Los Angeles, tentando fazer mais fortuna.

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Humor, atrevimento e videogames

“Uma pessoa que entre no YouTube em busca apenas de dinheiro vai fracassar”. A advertência de Cristina Bonaga, gerente na Espanha da Divimove, empresa que representa alguns dos principais youtubers do país, revela que faturar nesse mundo é algo difícil. Os conteúdos têm que ser novos e diferentes se querem se destacar entre os milhares de concorrentes. E, já que o público tem majoritariamente entre 15 e 21 anos, é melhor postar no horário em que esses jovens já tenham voltado da escola ou da faculdade. Também é preferível aproveitar os dias úteis em vez dos fins de semana. Além disso, junto à frequência constante de uploads do material, é preciso se comunicar bem. O público tem que saber quando os vídeos estarão no ar. Porque ganhar dinheiro com eles é algo que tem suas regras.

Os ganhos desses criadores dependem do número de reproduções (não se fatura por volume de assinantes), da duração do vídeo, do país de procedência dos acessos, do dia de postagem e do tipo de audiência. Mais uma dica: humor, atrevimento e ironia fazem sucesso. Mas quem manda, principalmente, são os videogames e os youtubers que comentam os vídeos.

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Miguel Ángel García Veja, do El País