Outubro começou com más notícias sobre o crescimento, tanto na frente interna quanto na externa, mas a imprensa, mais uma vez, deixou desarrumado o quebra-cabeça. Em agosto, a produção de bens de capital, isto é, de máquinas e equipamentos, foi 13,4% inferior à de um ano antes. De janeiro a agosto ficou 8,8% abaixo da contabilizada em 2013 no mesmo período. De janeiro a setembro a importação de bens de capital foi 5,7% menor que a dos meses correspondentes no ano anterior. Queda geral, portanto, nas compras de bens de produção – nacionais e estrangeiros.
Investimento em máquinas, equipamentos, instalações e obras de infraestrutura é a chave para o crescimento, no longo prazo. Essa é uma noção essencial ao trabalho de qualquer jornalista econômico. Uma semana antes de saírem os números da produção industrial de agosto e do comércio internacional de setembro, o Banco Central (BC) havia divulgado suas novas projeções para a economia. As estimativas para a formação bruta de capital – investimentos privados e públicos – apontaram uma queda de 6,5% neste ano e uma redução de 2,4% nos 12 meses até junho de 2015.
Todas essas informações foram publicadas no costumeiro estilo picadinho, em duas semanas consecutivas. Especulações sobre a economia nos próximos anos têm sido constantes nas páginas dedicadas à eleição presidencial, mas o noticiário tem explorado mal os dados concretos e as projeções produzidas por fontes qualificadas.
Resultados negativos
Há um contraste entre a cobertura das finanças públicas, em geral atenta e esperta, e o tratamento de assuntos importantes da economia real. A nova manobra do Tesouro para reforçar suas contas, por meio de uma operação triangular com a Caixa e com a Celg, a companhia elétrica de Goiás, foi detectada com rapidez. Mas o material sobre os novos números da balança comercial foi burocrático e muito dependente das explicações oficiais.
Essa dependência é tão habitual quanto nociva à qualidade do trabalho. Toda semana o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior publica informações atualizadas, mas sem muitos detalhes, sobre exportações e importações. Mas uma vez por mês sai um relatório amplo, de 13 páginas, com muitos dados sobre o ano e sobre os valores acumulados em 12 meses.
A leitura é fácil, a informação é razoavelmente detalhada e o relatório contém detalhes importantes e muitas vezes desprezados na avaliação apresentada pelo pessoal do governo. Com esse material, nenhum jornalista minimamente atento e interessado terá de engolir as interpretações e explicações oferecidas em entrevista por um representante do ministério.
Mas o procedimento padrão, no tratamento desse material, tem sido burocrático e pouco informativo para o leitor. A maior parte do noticiário publicado na quinta-feira (2/10), um dia depois da divulgação do relatório, concentrou-se no resumo dos números de setembro. Os resultados negativos foram atribuídos basicamente aos gastos maiores com a importação de combustíveis e à crise na Argentina, importante mercado para as exportações brasileiras de manufaturados.
Bom caminho
Mas a história é mais complexa e o quadro, muito menos bonito. As exportações de manufaturados têm ido mal há muito tempo e a crise argentina é só um pedaço da explicação. Curiosamente, as vendas de manufaturados brasileiros para os Estados Unidos têm aumentado, mas esse detalhe é raramente mencionado. Ninguém parece muito interessado em formular perguntas sobre esse e outros pontos. Perguntar será um sinal de má educação? A passividade diante do entrevistado será um sinal da extrema polidez dos jornalistas de hoje? A mesma atitude prevalece quando se trata de esmiuçar o relatório e de examinar, por exemplo, a queda da importação de bens de capital e de bens intermediários, indicadores importantes do nível de atividade.
Neste ano, tanto as exportações quanto as importações foram menores, até setembro, do que no ano anterior. O valor vendido, US$ 173,63 bilhões, foi 10,2% inferior ao de um ano antes. O das compras, US$ 174,32 bilhões, ficou 4% abaixo do nível de janeiro a setembro de 2013.
A redução simultânea dos dois lados da balança comercial é um forte sinal de baixo nível de atividade econômica uma boa cobertura relacionaria esse dado com outros indicadores divulgados nos últimos dias. Afinal, se os editores de jornais ainda pretendem oferecer algo mais que o noticiário sintético de rádios e TVs, a publicação de material mais elaborado e mais explicativo parece um bom caminho. Não chega a ser excepcionalmente complicado, quando o trabalho de juntar coisa com coisa se torna parte da rotina.