O preconceito na política, principalmente em relação aos mais pobres, não é uma questão nova e antes vinha mitigado em frases como “o brasileiro não sabe votar” ou “pobre não sabe votar”. A partir da ascensão de Lula, essa generalização acabou incluindo a questão regional, e se deslocando para frases como “nordestino não sabe votar”.
Da esquerda à direita no espectro político, há uma forte tendência de reforçar posicionamentos que legitimam uma estética da violência e da discriminação. E, com o advento das redes sociais, tais práticas discriminatórias contra as opções de voto sejam elas dos pobres ou das elites, passaram a ganhar ainda mais espaço e virulência.
São vários os exemplos. De um lado, a reação dos petistas gerou uma forma de discriminação típica da esquerda ao atribuir todos os males com os mais pobres à “elite branca paulista”, numa adaptação ao termo “elite branca”.
Já em sentido inverso, em 2010, logo após o resultado das eleições presidenciais mostrar que Dilma Rousseff saia consagrada no Nordeste, uma estudante de direito postou no Twitter: “Nordestisto (sic) não é gente. Faça um favor a Sp: mate um nordestino afogado!”. Condenada pela Justiça em 2012 à prestação de serviços comunitários e pagamento de multa por racismo, o caso acabou não produzindo o efeito civilizatório que deveria.
O processo eleitoral em curso vem produzindo uma diversidade assustadora de estratégias discriminatórias e de incentivo ao ódio social. A disputa entre PT e PSDB, que assumiu caráter plebiscitário, aumentou o potencial dessa irracionalidade.
Basta vermos as postagens feitas logo que saíram os resultados do primeiro turno em São Paulo dando vitória ao PSDB e mostrando o perfil dos deputados eleitos pelos paulistas. Pela esquerda, várias frases como “esses paulistas têm que morrer de sede”, “esses paulistas são desprovidos de inteligência” e “vontade de afogar esses paulistas”.
Condenação ética
Mais à direita, foram divulgadas frases de um grupo supostamente de médicos que defendem a castração de eleitores petistas. Outras chegam a afirmar que Dilma só ganha voto do “povo burro do Nordeste” ou que São Paulo evitou que a “corja” petista se apossasse do Estado.
Um jornalista mineiro chegou a propor que o Brasil fosse dividido em dois, Norte/Nordeste e Sul/Sudeste, e arrematou: “Dilminha ficaria com seus preguiçosos eleitores bolsistas fazendo uma cesta [sic] em redes nordestinas e nós com Aécio e demais trabalhadores esclarecidos, na banda debaixo [sic], de mangas arregaçadas botando lenha na fogueira da produção desse país.”
Faria muito bem para o Brasil e para as campanhas de Dilma Rousseff e Aécio Neves se ambos viessem a público condenar esse tipo de manifestação e reafirmar seus compromissos com a diversidade.
Não basta soltar notas e depois um acusar o adversário de preconceito ou, então, de promover a divisão do país como vem ocorrendo. Faria bem para a democracia se ambos afirmassem que preferem não contar com o voto de quem pensa que eles vão implementar medidas xenófobas durante seus governos. Seria civilizatório e isolaria grupos minoritários que agem dessa forma.
Para além da responsabilização judicial que deve recair sobre quem estimula o preconceito contra a opção de voto de quem quer seja –pobre, nordestino ou elite de qualquer natureza–, é preciso explicitar uma forte condenação ética e moral a esse movimento.
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Marco Antonio Carvalho Teixeira, 49, doutor em ciência política pela PUC-SP, é professor da FGV EAESP – Escola de Administração de Empresas de SP; Renato Sérgio de Lima, 44, doutor em sociologia pela USP, é professor da FGV EAESP e pesquisador do Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada Direito SP