Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Apresentadoras de TV se queixam de preconceito

Ex-funcionárias da BBC afirmam que existe um problema concreto na rede pública britânica com relação ao preconceito de idade e gênero. Ouvida por uma comissão uma da Câmara dos Lordes sobre mulheres e radiodifusão, a experiente jornalista Olenka Frenkiel, que deixou a BBC após 30 anos de carreira, falou sobre a amplitude, na indústria televisiva, do sexismo e do preconceito contra a idade, assim como a maneira pela qual a rede tenta silenciar ex-funcionários nos acordos de demissão.

Olenka, que foi a primeira repórter da BBC em Berlim depois da queda do Muro, diz que se recusou a assinar um acordo de confidencialidade que a impedia de falar sobre a organização porque queria debater abertamente a experiência por que passam as mulheres mais velhas na radiodifusão. “Tive uma grande carreira na BBC, conheci o mundo, fiz uma porção de coisas interessantes e não quero que pensem em mim como uma ‘pobre coitada’. Mas não gosto que a maior organização de radiodifusão do mundo deixe de falar a verdade.”

Outras ex-funcionárias da BBC, como a ex-apresentadora do programa Newsnight Liz Mackean, que, assim como Olenka, recusou-se a assinar uma cláusula que a proibia de falar depois de sua saída da empresa, também acreditam que o preconceito com mulheres mais velhas diante das câmeras existe na rede. Entre os apresentadores de programas com mais de 50 anos de idade, 82% são homens.

Na justiça

Em 2011, a apresentadora Miriam O’Reilly ganhou uma ação em que acusava a BBC de preconceito por conta de idade. Miriam havia sido demitida do programa Countryfile, sobre assuntos rurais, junto com outras quatro apresentadoras, todas entre 40 e 50 anos. O tribunal, no entanto, não aceitou a alegação de preconceito de gênero.

Na ocasião, o então diretor-geral da BBC, Mark Thompson, declarou ao jornal Daily Mail que o caso de Miriam O’Reilly representava um momento decisivo para a empresa. No mesmo dia, Olenka Frenkiel enviou-lhe um e-mail destacando que a discriminação não tinha acabado. “É desonesto, por parte da BBC, dizer que as coisas mudaram quando continuam as políticas discriminatórias e, em seguida, exigindo que as vítimas assinem cláusulas que as proíbem de falar”, dizia ela. “Se suas declarações públicas pretendem ter credibilidade, então a atual política de obrigar mulheres de meia idade a deixar o emprego deveria terminar.”

Redações criadas por homens

Falando à comissão da Câmara dos Lordes, a jornalista da ITV News Penny Marshall, de 51 anos, afirmou que as mulheres com mais de 50 anos de idade são tratadas de uma maneira miserável na indústria de radiodifusão e que as redações foram “criadas por homens, em grande parte para homens”.

Várias apresentadoras importantes queixam-se do tratamento que receberam das emissoras depois que chegaram a determinada idade. Selina Scott recebeu 250 mil libras [cerca de R$ 1 milhão] depois que processou o Canal 5, em 2008, por preconceito contra idade, quando estava com 57 anos; Anna Ford saiu da BBC em 2006, aos 62 anos, alegando que havia sido posta de lado devido à idade.

Num depoimento perante a mesma comissão, Fran Unsworth, subdiretora de jornalismo e atualidades da BBC, disse que os espectadores já não se opõem a apresentadoras mais velhas, mas apontou outro problema: para ela, existem poucas mulheres mais velhas no mercado, pois muitas profissionais “optam por deixar” seus papéis de liderança quando têm filhos, por volta dos 30 anos de idade.

Já Olenka Frenkiel disse que isso era escamotear a responsabilidade da própria empresa. Atualmente com 59 anos de idade, a ex-repórter dos programas Today, Newsnight e Assignment deixou a BBC há dois anos, depois que se sentiu “congelada” após chegar aos 50. A apresentadora e repórter Liz MacKean – que deixou a BBC depois do escândalo provocado pelo cancelamento de sua reportagem expondo o caso Jimmy Savile – destacou que os homens também se sentem inseguros, particularmente com a recente reestruturação da rede, mas o fato de existirem muito menos mulheres mais velhas na telinha “indica, com certeza, um preconceito de gênero”.

Problema de percepção

O diretor de jornalismo da BBC, James Harding, discorda que exista na empresa algum tipo de discriminação contra mulheres mais velhas e sugere que as acusações se tratam, em grande parte, de um “problema de percepção”. “Não acho que, de uma maneira geral, a BBC faça [discriminação contra mulheres mais velhas]”, disse Harding durante a conferência anual da Sociedade de Editores, em Southampton. “Algumas mulheres mais velhas são importantes e vêm fazendo um trabalho incrivelmente bom na BBC. No caso dos noticiários, também é verdade para nós.”

“O que eu quero focalizar é a qualidade do trabalho da BBC”, disse Harding. “Nosso compromisso é o de ter certeza que a BBC reflita a opinião da audiência de todas as maneiras possíveis. Acho que existe um problema real e um problema de percepção, ou de opinião, e é por isso que destaco o trabalho de pessoas que fazem um trabalho realmente muito bom. E há um problema concreto, que são os números”, disse, acrescentando: “Na BBC, nós trabalhamos com um amplo espectro de questões envolvendo diversidade, igualdade e deficiências físicas. O que eu não gosto é que se tente definir um quadro a partir de uma pessoa específica. Deveríamos olhar as coisas como um todo.”